Com salas vazias, escola ocupada na zona leste já caminhava para fechamento
Violência e tráfico dominam entorno do colégio Presidente Salvador Allende, diz professor
Educação|Caroline Apple, do R7
Alunos e militantes de movimentos sociais ocupam desde as 4h30 desta quinta-feira (12) a Escola Estadual Presidente Salvador Allende Gossens, no Jd. Bonifácio, na zona leste de São Paulo. A unidade é uma das instituições que serão fechadas, conforme o plano de reorganização das escolas que terá início no ano letivo de 2016. Porém, a ameaça de fechamento não é novidade para os alunos, de acordo com um grupo de professores que preferiu não se identificar.
Ao R7, os servidores públicos contaram que a escola já seria fechada pelo Governo do Estado de São Paulo, devido à grande evasão de alunos.
Os professores alegam que a escola tem capacidade para atender muito mais do que os cerca de 370 alunos que lá estudam no Ensino Fundamental e no Ensino Médio. De acordo com uma das professoras, são 18 salas — algumas sem ocupação — e as que têm alunos atendem entre 15 e 20 estudantes.
— Essa escola é um prejuízo para o Estado. Muitos pais não querem que seus filhos estudem aqui por causa da violência e do tráfico de drogas que dominam o entorno do colégio. Os moradores preferem que aqui seja um Batalhão da PM (Polícia Militar).
A militante do coletivo Baobá, Carolina Freitas, um dos movimentos que estão ajudando os alunos na ocupação, discorda da colocação da professora e afirma que os estudantes não podem ser responsabilizados pela evasão.
— Se uma escola é ruim, ela não deve ser fechada, mas sim melhorada. Escola não pode dar prejuízo, porque não é mercadoria. A violência que afasta os alunos também é uma consequência da falta de investimentos e prioridades na educação. Se todas as demais escolas tivessem investimento em infraestrutura e professores, esse colégio poderia até ser uma exceção, mas não é. Essa luta não é por melhorias, é contra o retrocesso.
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Cartilha que ensina como ocupar uma escola circula nas redes sociais
Os professores contam que muitos alunos do Ensino Médio só fazem a matrícula para conseguir benefícios, como o Bilhete Único do Estudante, e a declaração de escolaridade, para apresentar no trabalho e, depois, desaparecem.
— Tem quem se matricula e não vem para escola, tem traficante que se matricula para ficar perto dos alunos. Temos um problema social muito grande nessa região. O estudo não é prioridade.
Aproximação dos movimentos
Os docentes que falaram com a reportagem acusaram os movimentos sociais de liderarem as "crianças" e as colocarem em risco.
— Está cheio de crianças lá dentro e não podemos entrar. Disseram que não somos bem-vindos por sermos pagos pelo Estado. De dia está tudo bem, mas e quando cair a noite? Tenho medo que destruam a escola.
Carolina se defende e acusa o Estado e os professores de desvalorizarem a capacidade de mobilização dos estudantes.
— Achar que eles não são capazes de se organizar é subestimar a capacidade desses alunos e reforçar o que eles mesmo acham sobre eles. Muitos se acham incapazes.
De acordo com um estudante, que não quis se identificar, o contato com os movimentos sociais é feito por meio de aplicativos e que a ajuda vem de várias formas.
— Nós que decidimos na calada da noite ocuparmos a escola. Entramos em contato com os movimentos e eles nos deram dinheiro para produzir faixas e cartazes.
A militante do Babobá explica que essa aproximação se dá pelo fato de o coletivo promover um "cursinho popular" na região, que aborda questões e matérias exploradas no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) e também promove debates sociais, que incluem questões de gênero e classe, por exemplo.
— Não somos agentes manipuladores dos estudantes como dizem. Isso é reflexo dos nossos debates que visam a desenvolver cidadãos críticos.
Secretaria lamenta ocupação
Em nota, a Secretaria da Educação do Estado informou que a "Diretoria de Ensino lamenta a ação que interrompeu as aulas e provocou o fechamento da Escola Estadual Presidente Salvador Allende Gossens". A administração esclarece que a Polícia Militar está no local para garantir o controle da situação e a integridade de alunos e professores. Ainda segundo a pasta, um boletim de ocorrência foi registrado pela direção da escola e o Conselho Tutelar foi acionado.
De acordo com a secretaria, a escola atende os ensinos Fundamental II e Médio e tem apenas 26% de sua capacidade. A pasta diz que os estudantes do Ensino Médio e 8º e 9º anos do Ensino Fundamental serão transferidos para a Escola Estadual Professor Francisco de Assis Pires Corrêa, que fica 1,3 km distante da escola de origem e os alunos do 7º ano do Ensino Fundamental serão transferidos para a Escola Estadual Professora Maria de Lourdes Aranha de Assis Pacheco, que está a 1,1 km. A secretaria afirma ainda que "ambas têm capacidade para absorver toda a demanda".
O prédio, segundo a pasta, será disponibilizado, mas continuará servindo à educação, podendo ser utilizado como creche, escola municipal ou de ensino técnico e que "todas as providências estão sendo tomadas".