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Japão se afasta ainda mais do pacifismo

Investimento militar é motivado pelas reivindicações chinesas sobre ilhas disputadas, além da crescente ameaça nuclear da Coreia do Norte

Internacional|

Recentemente, o Exército japonês posicionou baterias antiaéreas em Tóquio, capital do país, para se proteger de um possível ataque norte-coreano
Recentemente, o Exército japonês posicionou baterias antiaéreas em Tóquio, capital do país, para se proteger de um possível ataque norte-coreano Recentemente, o Exército japonês posicionou baterias antiaéreas em Tóquio, capital do país, para se proteger de um possível ataque norte-coreano

Os soldados japoneses com rostos camuflados e equipamentos completos de combate foram deixados por helicópteros americanos nesta ilha montanhosa e sem árvores, e moveram-se rapidamente para recapturá-la de um invasor imaginário. Para garantir sua vitória, eles pediram apoio a um navio de guerra dos EUA para atingir o "inimigo" com disparos que explodiram em trovoadas ensurdecedoras.

Talvez o traço mais notável dos jogos de guerra realizados em fevereiro, chamados de Iron Fist ("punho de ferro"), seja a sua advertência silenciosa. Há apenas um país que o Japão considera apto a atacar uma de suas ilhas: a China.

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Desapaixonando-se da China

O Iron Fist é um dos últimos sinais de que a ansiedade do Japão com as insistentes reivindicações chinesas sobre ilhas disputadas, além da crescente ameaça nuclear da Coreia do Norte, está forçando os líderes japoneses a se afastar ainda mais de seu pacifismo pós-guerra.

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A nova assertividade se mostrou especialmente aparente com o novo primeiro ministro, Shinzo Abe, um conservador que aumentou os gastos militares pela primeira vez em 11 anos. Com as forças marítimas da China conduzindo demonstrações regulares de sua determinação em controlar ilhas disputadas no Mar da China Oriental, e o novo líder da Coreia do Norte realizando proclamações diárias contra os Estados Unidos e seus aliados, as medidas de Abe por um exército mais forte e ousado vêm recebendo no Japão uma acolhida mais calorosa do que esforços no passado.

"Esta é uma reflexão muito séria sobre a segurança do Japão", declarou Satoshi Morimoto, ministro da defesa da última administração e arquiteto de mudanças na política de defesa do Japão.

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Até recentemente, uma batalha simulada com forças chinesas teria sido algo inconcebivelmente provocativo para o Japão, que renunciou ao direto de travar guerras – e inclusive de possuir um exército – depois que sua marcha pela Ásia, na Segunda Guerra Mundial, resultou numa devastadora derrota. As forças puramente defensivas criadas em 1954 ainda são proibidas de agir de forma muito ofensiva: no ano passado, uma operação de treinamento menor com forças japonesas e americanas numa ilha perto de Okinawa foi cancelada devido à oposição local.

Esse recálculo – um grande passo no que analistas veem como um retorno progressivo a um exército japonês mais robusto – pode trazer amplas implicações para o equilíbrio de poder na região, enfurecendo a China e provavelmente dando aos EUA um parceiro mais envolvido na região para compensar o alcance prolongado da China.

Ao mesmo tempo, o povo japonês vem apoiando mais completamente as Forças de Autodefesa, antes desacreditadas. Isso ocorreu, em parte, pela preocupação com a China e a Coreia do Norte – mas também pela destacada presença humanitária dos militares após o tsunami de 2011.

Embora liberais japoneses e críticos de toda a Ásia temam que Abe esteja usando tensões regionais como desculpa para impor uma agenda beligerante, pesquisas de opinião mostram que ele possui amplo apoio público para suas políticas gerais.

Com passos pequenos mas significativos, o Japão vem se movendo há vários anos no sentido de remodelar a si mesmo – e suas Forças de Autodefesa com 240 mil soldados – em algo mais próximo de um verdadeiro parceiro militar dos EUA.

Nos últimos anos, os dois países desenvolveram em conjunto um sistema de mísseis capaz de derrubar mísseis balísticos. Abe está pedindo uma interpretação mais ampla da constituição do pós-guerra, que restringe o Japão a agir apenas em "autodefesa", para incluir ações em defesa de aliados. Segundo Abe, isso permitiria que forças japonesas derrubassem mísseis norte-coreanos a caminho dos EUA, algo que hoje eles não poderiam fazer legalmente.

Embora o aumento de gastos militares aprovado por Abe e seu partido governante seja pequeno (0,8%, frente a aumentos de dois dígitos da China nos últimos anos), ele é voltado a reforçar a defesa das ilhas no sudoeste do Japão, incluindo as disputadas – conhecidas como Senkaku no Japão e Diaoyu na China.

O novo orçamento militar também agrega armas que, há uma ou duas décadas, teriam parecido ofensivas demais para as forças defensivas do Japão, incluindo o financiamento de dois caças-bombardeiros F-35. O orçamento ampliado também acrescentará outro submarino de ataque para fortalecer a capacidade da marinha japonesa de caçar o novo porta-aviões chinês Liaoning, além de dinheiro para desenvolver um míssil antinavios.

"Isso é um sinal de que ainda temos fôlego", disse Narushige Michishita, especialista em estudos de segurança do Instituto Nacional de Pós-Graduação em Estudos de Política, em Tóquio.

Abe também solicitou alterações na constituição do pós-guerra para remover restrições sobre seu exército, mas pesquisas mostram que a ideia continua impopular junto à maioria dos japoneses. Mesmo assim, num país que durante anos não podia reconhecer suas forças armadas, as mudanças em orçamentos e táticas são significativas.

O movimento por um exército mais normalizado também se beneficiou do infortúnio, o triplo desastre em 2011, quando um terremoto, um tsunami e uma crise nuclear se abateram sobre o nordeste do Japão. Nos primeiros dias da crise, as Forças de Autodefesa foram o rosto do governo em meio a cenas de devastação, e um cordão de salvamento para sobreviventes em choque. Agora, após anos mal sendo vistas em público, as tropas são mencionadas com um novo entusiasmo e chegaram a aparecer em programas de televisão louvando os heróis dos esforços de resgate.

A transformação do próprio exército em uma força mais assertiva ficou em evidência no mês passado em Camp Pendleton, uma base da marinha perto de San Diego e da ilha de San Clemente. Neste ano, 280 soldados japoneses participaram dos jogos de guerra, 100 mais do que no Iron Fist do ano passado – evento que começou há oito anos com apenas uma dúzia de soldados japoneses.

Os soldados faziam parte do Regimento de Infantaria do Exército Ocidental, peça central nos esforços do Japão para construir suas próprias capacidades militares. Com ajuda dos EUA, a unidade de mil homens está sendo moldada numa força como os "Marines" (fuzileiros navais norte-americanos), capaz de realizar pousos de helicópteros e anfíbios para defender as ilhas no sudoeste do Japão. O orçamento militar deste ano inclui R$ 50 milhões (US$ 25 milhões) para quatro transportadores de tropas anfíbios usados pelos Marines.

Quando questionado sobre a maior lição aprendida nos jogos de guerra, o comandante do regimento, Coronel Matsushi Kunii, disse ter ficado inicialmente desconcertado pela liberdade de horário dos Marines: os exercícios militares japoneses, segundo ele, costumam seguir um cronograma com a mesma precisão extrema do metrô de Tóquio.

"Então percebi que os americanos sabem, a partir de experiências reais de combate, que as coisas nem sempre saem conforme o planejado", explicou Kunii, que observava soldados japoneses preparando-se para disparar um morteiro durante o ataque simulado na ilha. "Essa flexibilidade, enquanto organização, é o tipo de conhecimento real que precisamos aprender."

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