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Ofensiva prolongada em Gaza pode causar guerra em todo o Oriente Médio

Para especialista, Israel está perto de provocar fúria árabe

Internacional|Diego Junqueira, do R7

Tensão longe de Gaza: veículo militar de Israel pega fogo em Hebron, na Cisjordânia, durante confrontos entre palestinos e soldados israelenses
Tensão longe de Gaza: veículo militar de Israel pega fogo em Hebron, na Cisjordânia, durante confrontos entre palestinos e soldados israelenses Tensão longe de Gaza: veículo militar de Israel pega fogo em Hebron, na Cisjordânia, durante confrontos entre palestinos e soldados israelenses

Líderes israelenses e palestinos discutem no Egito, há pelo menos dois dias, um cessar-fogo para dar fim aos ataques entre o Exército de Israel e as milícias islâmicas na Faixa de Gaza — 95 palestinos e três israelenses já foram mortos. A demora para chegar a um acordo e o prolongamento da guerra podem colocar Israel dentro do pior cenário possível: uma guerra em várias frentes contra os países árabes.

Em entrevista ao R7, o especialista em Oriente Médio e colunista do jornal Jerusalém Post, Gabriel Bacalor, disse que, quanto mais tempo durarem os ataques israelenses, maiores são as chances de uma ofensiva conjunta dos países árabes.

— Você não pode ficar ali por mais de uma semana, porque pode despertar uma situação de desequilíbrio grande no resto dos países árabes.

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Falando por telefone de Tel Aviv, onde mora, Bacalor afirmou que Israel está “em uma situação complicada”, já que sua capacidade de negociar é cada vez menor. Nesse cenário, a influência iraniana seria decisiva para uma guerra em várias frentes.

O Irã já apoia militar e financeiramente dois grupos que atuam na fronteira com Israel: ao norte, o Hezbollah (no Líbano), e, ao sul, o Hamas, o grupo palestino que governa a Faixa de Gaza e atualmente em guerra com Israel.

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— Se o Hezbollah decide atacar neste momento o norte de Israel, o país se defenderia com uma nova invasão ao Líbano e provocaria fortemente uma resposta do mundo árabe.

A situação israelense é ainda pior por não ter relações oficiais com o principal negociador moderado da região, a Turquia — desde o caso da flotilha humanitária que tentou entrar em Gaza, em maio de 2010, e foi atacada por Israel.

Com os palestinos na Cisjordânia pedindo “ataque a Tel Aviv” e a falta de envolvimento direto de Mahmoud Abbas, o líder da Autoridade Nacional Palestina, todas as apostas para evitar uma guerra regional estão sobre a mediação egípcia, afirma o especialista.

De acordo com Bacalor, a Irmandade Muçulmana, que governa o Egito, defendeu nos últimos dias o diálogo e o fim do conflito. Mas se a guerra se prolongar, o grupo pode ficar sem alternativa a não ser apoiar o Hamas.

— Hoje, o acordo de paz entre Israel e Egito [de 1979] é uma quimera.

Bacalor destaca que esse é o primeiro grande conflito envolvendo israelenses e palestinos após a onda de revoltas islâmicas conhecida como “Primavera Árabe”, que, dentre outras consequências, conduziu a Irmandade Muçulmana ao poder no Egito. Foi justamente esse grupo que deu origem ao Hamas em Gaza.

Até mesmo a Síria, que vive uma guerra civil há 20 meses, tem interesse em confrontar Israel.

— [O presidente sírio] Bashar al Assad tem uma necessidade urgente de envolver Israel no conflito, porque é sua única chance de sobrevivência: atrair o apoio dos países árabes contra Israel.

Confira a seguir os principais trechos da entrevista.

R7 - Antes de mais nada, como estão sendo para você e sua família esses dias com sirenes, refúgios e risco de ataques?Gabriel Bacalor - Estamos acostumados com isso. Por sorte, minha mulher está na Alemanha nessa semana. Há uns mísseis chegando, mas não me assusta nem me preocupa. Tive várias vezes de ir para o refúgio hoje, mas tratamos de levar da melhor maneira possível.

R7 - Alguns brasileiros na região disseram que estão impressionados com a força das milícias em Gaza. Israel também não esperava essa reação, com risco iminente de atingir Tel Aviv e Jerusalém? Bacalor - Nas últimas 72 horas, caíram 384 foguetes [em Israel]. São principalmente mísseis Grad, de baixo calibre, que alcançam até 40 km, e alguns outros mísseis de maior alcance, de origem iraniana, que chegam a 75 km, e podem ir ao norte de Tel Aviv. Basicamente, mais de 50% da população israelense está dentro da área de alcance dos mísseis. De todo modo, é uma situação com a qual estamos acostumados e preparados para enfrentá-la.

R7 – Quais são os objetivos da operação militar?Bacalor - Até agora há duas versões. Uma versão, exposta pela direita israelense [que governa o país], afirma existir armamento iraniano e norte-coreano de longo alcance em Gaza. [...] Já na esquerda e na centro-esquerda israelense, muitos especialistas dizem que o objetivo desse ataque é político, já que, daqui a dois meses, ocorrerão eleições em Israel. [...] A guerra poderia fazer uma diferença importante em favor da direita política.

R7 – E sensibilizar a população para as eleições de janeiro.Bacalor - Certamente. A direita militarista de Israel usa em geral o argumento da segurança nacional, enquanto a centro-esquerda levanta a bandeira do desenvolvimento socioeconômico. Quando há uma guerra, a força do discurso da segurança nacional passa por cima das bandeiras do desenvolvimento socioeconômico. Não sei dizer qual o verdadeiro objetivo da operação, mas posso dizer que esses dois argumentos têm uma lógica.

R7 – Essa guerra não pode levar a uma terceira Intifada, ou fortalecer o discurso das brigadas islâmicas e do Hamas, não apenas em Gaza, mas na Cisjordânia?Bacalor - O risco existe, mas é baixo. A razão pela qual não pode ocorrer uma terceira Intifada é que, no governo palestino, existe uma pessoa que trouxe equilíbrio e racionalização ao conflito no Oriente Médio: Mahmoud Abbas, presidente da Autoridade Nacional Palestina. [...] Quem leva conflito a essa parte do Oriente Médio são, por um lado, os grupos terroristas na Palestina, Hamas, Jihad Islâmica, respaldados militar e financeiramente por Irã, e, por outro lado, a direita israelense, que, baseada em argumento religioso, considera que toda a terra de Israel pertence ao povo de Israel, e não está disposta a renunciar a uma parte dessa terra para chegar a um acordo de longo prazo com os palestinos.

R7 - Então está cada vez mais enterrada a possibilidade de um diálogo?Bacalor - O governo do presidente norte-americano Barack Obama renova as possibilidades de chegar a um acordo, mas isso só será possível depois das eleições israelenses, em 22 de janeiro. [...] Creio que [a falta de sintonia entre Obama e Netanyahu] seja o principal freio para chegar a um acordo de longo prazo no Oriente Médio.

R7 - Com a operação atual, fica mais distante qualquer ação contra o Irã?Bacalor - Agora não há nenhum risco de confronto com o Irã. A porta de uma ação militar israelense sobre o programa nuclear iraniano vai se abrir novamente daqui a uns quatro meses. Aí sim seria um conflito direto. Porque um conflito indireto já está acontecendo agora, entre Israel e o Hamas, ou em um potencial conflito para as próximas semanas, entre o Hezbollah e Israel. Entretanto, creio que há uma possibilidade aberta de conflito entre Síria e Israel. [...] [O presidente sírio] Bashar al Assad tem uma necessidade urgente de envolver Israel no conflito, porque é sua única chance de sobrevivência: atrair o apoio dos países árabes contra Israel.

Voltando ao conflito atual entre Hamas e Israel, essa operação era necessária para limpar o arsenal de armas avançadas do Hamas. Quando você tem um grupo terrorista próximo da fronteira, você tem que limpar o terreno a cada três ou quatro anos. [...] O mais importante é que o ataque seja por curto tempo. Você não pode ficar ali por mais de uma semana, porque pode despertar uma situação de desequilíbrio tão grande no resto dos países árabes.

R7 - Se a ação levar muito tempo, então, pode dar origem a uma guerra regional.Bacalor - Por isso é muito importante fazer ataque cirúrgico, muito intenso, e por um tempo limitado. Não esqueça que o conflito atualmente no mundo árabe é diferente de 20 anos atrás. [...] Hoje o Irã continua com força, mas o Egito não tem força como antes. Quem tomou esse lugar foi a Turquia, como país moderado no mundo árabe para enfrentar o fundamentalismo islâmico. Com a Primavera Árabe, os sunitas, que são 80% de todos os muçulmanos, têm que escolher alguém para se identificar — ou os turcos, que não têm uma clara identificação [com os sunitas], ou com o Irã xiita. Os sunitas estão órfãos [de uma liderança]. Isso é um perigo para Israel porque, quando um povo se sente órfão, a solução é unificar o ódio ao inimigo externo e a luta contra ele. E quem melhor que Israel para ocupar esse papel?

R7 - O premiê egípcio foi o primeiro a ir a Gaza. Nesse xadrez político, em que agora as forças políticas são Turquia e Irã, Egito está perdido, sem papel, ou ainda pode contribuir?Bacalor - Historicamente, a Irmandade Muçulmana [que governa o Egito] falou da destruição de Israel, e hoje fala do fim do conflito. O presidente do Egito, Mohammed Mursi, tenta se colocar como mediador do conflito entre israelenses e palestinos. Não é pouca coisa. Mursi precisa construir seu próprio poder político. E isso só pode ser feito de duas maneiras: ou atuando como mediador moderado, com anuência dos Estados Unidos, ou atuando como extremista islâmico, com anuência do Irã.

R7 - Lembrando que o Egito é um dos únicos países com quem Israel tem um acordo de paz firmado (o outro é a Jordânia). Esse acordo está sobre a mesa, em questão?Bacalor - Sim. Tenha em consideração que o Egito convocou seu embaixador em Tel Aviv para o Cairo [na quinta-feira, 15]. O acordo de paz entre Egito e Israel, hoje, é uma quimera. Você não sabe com segurança se esse acordo vai resistir, porque os representantes do governo, a Irmandade Muçulmana e os salafistas, ambos sempre se opuseram ao acordo e lutaram contra Israel. Creio que Israel está em uma situação muito complicada.

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