Trabalho e estudo ocupam cotidiano de detentos em único presídio privado do País
Complexo PPP, em Ribeirão das Neves, abriga 608 condenados em regime fechado
Minas Gerais|Enzo Menezes, do R7 MG
— Enfermeira! Abre, abre, ele tá passando mal!
O detento nervoso esmurra a porta de ferro que separa o pavilhão do corredor quando um companheiro de cela desmaia. Em cinco minutos, uma maca aparece para carregá-lo. Pouco tempo depois, o preso retorna, em pé, amparado pela enfermeira. "Foi um ataque epilético", avisa um assessor. "Alguns até fingem que passam mal para dar uma volta", diz outro funcionário, tentando amenizar.
O atendimento foi testemunhado pela reportagem, na tarde da última terça-feira (11). O R7 passou duas horas no Complexo Penitenciário PPP, em Ribeirão das Neves, na Grande BH, para conhecer o funcionamento do único presídio privado do Brasil. As cenas de superlotação e brigas entre presos passam longe do local, que não conta com guarda armada ou funcionários do Estado. A principal aposta é no trabalho e estudo dos detentos em tempo integral e em um imenso aparato tecnológico para não permitir a entrada de materiais proibidos.
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Também há trabalho no setor de metalurgia, com produção de 400 cadeiras de ferro por dia, assim como a produção de macacões. O detento recebe os mesmos benefícios de prisões públicas: um dia a menos na pena a cada três trabalhados e um salário mínimo - 25% é destinado ao governo e o restante é dividido entre a família e o próprio detento, que pode sacar o valor ao ganhar a liberdade.
O Complexo PPP abriga 608 condenados em regime fechado, divididos em oito pavilhões (chamados de “vivências”). Em geral, quatro homens por cela. A previsão é inaugurar outras quatro unidades, sendo três para condenados em regime semi-aberto. Foram gastos R$ 280 milhões na penitenciária.
Largou o vício
Bruno (o sobrenome será preservado), 33 anos, diz que não tem uma profissão porque “sempre trabalhou no crime”. Sentenciado por roubo, ficou um ano e dois meses no Presídio São Joaquim de Bicas 2 e agora conta os últimos 15 dias antes de voltar para casa. Ele pretende estudar para não ficar desempregado.
— Lá são 33 num barraco (cela) só. Aqui são quatro. Eu fumava quatro maços de cigarro por dia, com o atendimento aqui não sinto falta. Em cinco meses larguei o vício.
Depois de duas horas e meia de estudos e seis horas de trabalho, os presos podem passar duas horas no banho de sol. Quem não quiser jogar bola pode assistir TV – monitores de tela plana ficam espalhados nas paredes do pátio. Segundo um funcionário, o programa preferido é o futebol.
— Já passou até um Cruzeiro e Atlético. Eles ficaram doidos.
Bom comportamento
A Suapi (Subsecretaria de Administração Prisional) afirma que o critério para um preso ser transferido para o Complexo PPP é ser condenado em regime fechado. Mas admite que todos precisam ser habilitados a trabalhar e a estudar. Na prática, isso afasta detentos "barra-pesada", que perdem benefícios por mau comportamento. Desde 18 de janeiro, data da inauguração, seis obtiveram o alvará de soltura. Nenhum deles foi detido novamente.
Para Maria Cláudia Machado, diretora da unidade setorial da Seds (Secretaria de Estado de Defesa Social), ainda é cedo para pensar na adoção do modelo em outras penitenciárias. Ela é responsável por atestar se os indicadores de qualidade previstos no contrato são cumpridos pela empresa.
— Ainda é cedo para apresentar indicadores, mas acreditamos que a reincidência do preso será menor. É um espaço com oportunidade de trabalho e estudo para quem precisa de ressocialização.
O Gerente Operacional do GPA, o consórcio que administra a PPP, Alfredo Sales, resume a parceria.
— O Estado cedeu o terreno. Temos que devolver à administração pública em 27 anos com a tecnologia adequada. Tenho certeza que os presídios privados são a saída para o sistema penitenciário.