Ter cama e banho “dá um ânimo”, diz ex-morador da Cracolândia levado a hotel
Prefeitura deu início à ação que vai dar emprego e moradia para usuários de drogas
São Paulo|Fernando Mellis, do R7
Em um quarto no segundo andar de um hotel na esquina da alameda Dino Bueno com a rua Helvetia, no centro de São Paulo, Alexsandro do Nascimento, de 31 anos, lembra da última ação policial na Cracolândia, em janeiro de 2012. Segundo ele, a repressão “não ajudou em nada”.
— Da última vez, só teve Força Tática, colocaram a polícia aqui para resolver tudo. E eu te pergunto: resolveu? É só olhar lá fora.
Ele e a namorada estão entre os 300 moradores de barracos instalados na Cracolândia que começaram a ser retirados nesta terça-feira (14). Em troca da saída deles do local, a prefeitura os incluiu em um programa que vai oferecer alojamento, alimentação e emprego remunerado, além de tratamento médico e acompanhamento psiquiátrico para quem precisar.
Sem saber bem qual atividade vai fazer, Nascimento, que admite ser usuário de crack, afirma que estar em condições mais dignas é um estímulo para pensar em mudar de vida.
— Para ser sincero, não tenho nem ciência de como vai funcionar, mas só de estar aqui, com cama, banho, já dá um ânimo na gente. Acho que vai melhorar muito.
As vagas que a prefeitura oferece são de quatro horas diárias em trabalhos de zeladoria de praças. Além da hospedagem, alimentação e eventuais despesas com transporte, os inscritos vão receber R$ 15 por dia trabalhado.
Usuários não precisarão largar crack para entrar em programa de emprego e moradia
O fato de não ter onde dormir dificultava que Erivaldo Pereira da Silva, de 44 anos, que ainda não teve o barraco demolido, conseguisse um emprego. Ele diz ser usuário de crack há 30 anos. Silva veio de Campinas há alguns meses, divide o barraco com um amigo e também está empolgado com a oportunidade.
— Eu não tinha um local exato para ficar, então eu me preocupava muito com isso. Não é que eu não desempenhava o trabalho, eu não tinha tranquilidade porque eu tinha que me preocupar onde ficar.
Membros da ONG Brasil Gigante, agentes de saúde e assistentes sociais vão acompanhar de perto cada um dos adeptos ao programa. Aqueles que não tiverem condições de trabalhar poderão ir para uma unidade do Caps (Centro de Atenção Psicossocial). Mesmo em tratamento, o usuário não terá o pagamento suspenso.
Casos de desligamento do programa serão avaliados individualmente, segundo a secretaria de Desenvolvimento e Assistência Social, Luciana Temer.
— Nesse acompanhamento individual, pode ser que a equipe diga que a pessoa tem que ser desligada do programa. E não é porque ela faltou um ou dois dias, mas é porque ela, de fato, não está conectada, não está interessada na proposta, não está disposta a se tratar e não está disposta a trabalhar. Isso pode acontecer.
A ação é coordenada pela Secretaria Municipal de Saúde e envolve outras cinco pastas: Governo; Desenvolvimento e Assistência Social; Segurança Urbana; Desenvolvimento, Trabalho e Empreendedorismo; e Serviços. A iniciativa, segundo a prefeitura, é baseada em um modelo adotado na Holanda com usuários de álcool. A adaptação paulistana será ajustada durante a execução, de acordo com o prefeito Fernando Haddad.
— Não sei quais problemas vão advir dessa iniciativa, mas eles ocorrerão e nós estaremos um acompanhamento fino, um monitoramento diário para ir cobrindo as eventuais deficiências dessa iniciativa inédita. Nós vamos apreender com ela. Ela não vai nascer perfeita.
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