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Mais Médicos: língua e cultura devem dificultar trabalho dos profissionais, diz especialista

Professor da USP afirma que tempo político atropelou implantação correta do programa

Saúde|Vanessa Sulina, do R7

Médicos brasileiros já começaram a trabalhar pelo Mais Médicos
Médicos brasileiros já começaram a trabalhar pelo Mais Médicos

Falta de fluência no português, culturas diferentes e falta de estrutura poderão prejudicar o trabalho dos profissionais estrangeiros que atenderão em diversas cidades do interior do País e nas periferias. A avaliação é do professor livre-docente da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo) Paulo Hilário Saldívia. No começo do mês, o professor participou de debate promovido pelo Instituto de Estudos Avançados da USP com vários especialistas na área para debate sobre o Mais Médicos. Após estudar o programa, ele levantou ao R7 alguns pontos relevantes.

R7 – Qual a sua avaliação sobre o programa Mais Médicos?

Paulo Hilário Saldívia — O fato é que faltam médicos em algumas regiões remotas e não se consegue colocar profissionais nestes locais. Há uma má distribuição dos médicos no Brasil. Portanto, um programa que estimule as pessoas a irem para estas regiões [periferias e interior do País] não é desprovido de lógica. O problema está na velocidade da implantação. Na Inglaterra, por exemplo, se importam médicos — o que inclusive fica até mais barato, mas eles passam por uma validação, por exemplo.

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R7 – O que seria essa “velocidade de implantação”?

Saldívia — O que aconteceu é que o tempo político está atrapalhando o tempo de fazer o certo, ou seja, há uma agenda política a ser cumprida, há queixa da população, então, de repente, tem que dar uma resposta. Há um processo de expansão [programa] que está esbarrando na qualidade da formação dos médicos. Há um tempo para as coisas amadurecerem; por exemplo, é necessário que os profissionais sejam supervisionados, tenham estrutura de suporte a distância.


R7 – Então, como seria possível solucionar a falta de médicos?

Saldívia — Alguns mecanismos podem ser testados, mas mereceriam discussão. Um dos possíveis é o serviço civil com mecanismo de supervisão, ou seja, se mudaria o currículo da faculdade, que hoje é de quatro anos para três e, em vez de dois anos de internato, o estudante faria três numa espécie de internato rural com supervisão. Programas sociais realizados por universidades também poderiam colaborar.


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R7 – A “briga” do governo federal com os médicos pode ter emperrado o programa, já que o governo precisou adiar em uma semana o início do trabalho dos médicos por causa do atraso no registro nos conselhos regionais?

Saldívia — O programa foi feito de cima para baixo. O diálogo foi cortado. A sociedade corporativa [médicos] não é perfeita. Eles estavam esboçando um projeto de fazer um exame ao final da faculdade, como acontece com os formados em direito e também avaliar as faculdades de medicina e, com essa novidade de importar médicos sem a revalidação, você fragiliza uma estrutura que não está consolidada. O ideal seria construir uma solução definitiva. Além disso, brigar com a categoria médica não é bom começo.

R7 – Qual problema de não revalidar diplomas estrangeiros?

Paulo Hilário Saldívia — Não sabemos a formação médica das pessoas que vieram. Há faculdades na Bolívia, por exemplo, cujos profissionais formados não podem atuar. Formar médico ruim não é privilégio dos outros países. Nós temos muitas faculdades ruins também. Temos que ter um controle de qualidade. Os estrangeiros, por exemplo, não conhecem a cultura. Se espera demais de tudo isso.

R7 – Os médicos com diploma estrangeiro chegaram aos Estados onde atuarão neste fim de semana. Na sua avaliação, quais problemas eles irão enfrentar?

Saldívia — Temos um grupo na USP que trabalha em regiões carentes durante um ano em que equipes médicas vão para cidades de baixo IDH, exatamente como estas em que não tem médico. Eles já relatam algumas vezes dificuldade para entender algumas formas de expressão. Imagina para quem não tem o português como língua nativa? Alguns deles [estrangeiros] terão dificuldades. Os cubanos estão acostumados a trabalhar em locais carentes, mas os europeus, não. Acho que eles enfrentarão problemas, além de ter que se adaptar à cultura do País. Está se depositando uma expectativa muito grande nestes médicos e eles podem ter dificuldade de cumprir pela falta de estrutura em que eles trabalham.

R7 - O que pode acontecer a longo prazo com estes profissionais? O senhor acredita que o programa dará certo?

Saldívia — Pode dar certo ou dar errado. Se der certo, você vai revalidar isso [importar sem diploma]. Mas e as medidas estruturais que deveriam ser tomadas na saúde?

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