Tribunal rejeita recursos de Dirceu contra condenação na Lava Jato
Ex-ministro da Casa Civil é acusado de receber propina da empreiteira Engevix e desviar recursos da Petrobras; ainda cabem recursos da decisão
Brasil|Diego Junqueira, do R7, em São Paulo
O TRF4 (Tribunal Regional da 4ª Região) rejeitou nesta quinta-feira (19), em Porto Alegre, os recursos do ex-ministro José Dirceu contra a condenação de 30 anos e 9 meses de prisão imposta pela corte de apelação da Lava Jato em setembro passado. O tribunal entendeu que cabe mais uma possibilidade de recurso pela defesa, mas que, após essa análise, a pena deverá ser executada — o que significa que Dirceu provavelmente voltará à prisão nas próximas semanas.
A decisão desta quinta contra os embargos infringentes apresentados pelo ex-ministro foi tomada por unanimidade pelos seis magistrados da 4ª Seção do TRF4: Cláudia Cristina Cristofani, Márcio Antônio Rocha, Salise Monteiro Sanchotene, Victor Luiz dos Santos Laus, Nivaldo Brunoni (que substitui João Pedro Gebran Neto) e Leandro Paulsen.
"Conheço apenas parcialmente os embargos infringentes de nulidade interpostos por José Dirceu de Oliveira e Silva. Na parte conhecida, nego-lhes provimento. Também determino, quando houver o esgotamento da jurisdição ordinária desta corte, a imediata comunicação do juizo de origem para o início da execução provisória das penas com expedição dos mandados de prisão", declarou a desembargadora Cláudia Cristofani, relatora da ação na 4ª Seção.
Com isso, ela manteve a pena estabelecida anteriormente, mas considerou que o processo ainda não está encerrado em segunda instância, abrindo a possibilidade para mais um recurso, os chamados "embargos de declaração" — que não têm o poder de alterar o resultado do julgamento, mas de esclarecer alguns pontos. O voto da relatora foi acompanhado pelos outros cinco magistrados.
Ao final da sessão, a presidente da 4ª Seção e vice-presidente do TRF4, desembargadora Maria de Fátima Labarrère, pronunciou o resultado e manteve a possibilidade de mais um recurso.
Após o texto da sessão de hoje ser publicado eletronicamente, o que deve ocorrer até esta sexta-feira (20), abre-se um prazo de 12 dias para que a defesa apresente os embargos de declaração. O julgamento desse novo recurso não tem data para ocorrer.
Defesa
A defesa de José Dirceu pedia para que prevalecesse o entedimento do desembargador Leandro Paulsen (revisor da Lava Jato na segunda instância) e que fosse descartada a condenação de Dirceu na Ação Penal 470 ("Mensalão") na chamada "dosimetria da pena", quando os juízes decidem a quantidade de anos de prisão.
Durante o julgamento de setembro, Paulsen descartou os "antecedentes criminais" de Dirceu e estabeleceu pena de 27 anos e 4 meses, mas naquela ocasião ele foi voto vencido pelos outros dois desembargadores da 8ª Turma (Gebran Neto e Laus) e, no julgamento de hoje, os seis magistrados mantiveram a decisão de manter a pena em 30 anos e 9 meses de prisão.
Os advogados de Dirceu também pediam para que fosse retirada da sentenção a necessidade de devolução de recursos aos cofres públicos como condição para a progressão do regime (para passar do regime fechado para o semiaberto, por exemplo). Essa possibilidade foi concedida pelo desembargador Victor dos Santos Laus em setembro, para quem essa aplicação depende do juiz de execução da pena, e não dos juízes que determinam a sentença. Laus, contudo, foi voto vencido na ocasião. Hoje, esse pedido também foi rejeitado pela maioria dos magistrados.
O desembargador Márcio Antônio Rocha foi o único a fazer uma ressalva nesse ponto, inclinando-se à ressalva de Santos Laus.
"Eu tenho uma compreensão um pouquinho diversa do artigo 33, parágrafo 4º (do Código de Processo Penal), entendendo que, quando estabelece a necessidade de o réu devolver aos cofres publicos o que amealhou com o ilícito, se trata de um regime de punição adcional aos crimes contra a administração públcia. Integra a pena essa obrigação de devolução, que estabelece uma livre possibilidade ao réu, no sentido de, ou devolve o que amealhou, ou... — por estar presente um dano maior à sociedade, por não se ver ressarcida — ou a pena será nesse caso cumprida com progressão de regime diferenciado. Então, na minha compreensão, não haveria esse tempero na fase de execução, e como o voto faz essa ressalva, e o desembargador Victor também manifesta expressamente, eu apenas faço essa ressalva nesse particular. mas como salienta a desembargadora Cláudia, essa questão não apresenta uma divergência nesse particular, de modo que não há de ser reconhecida pela turma, como sugere e vota a desembagadora. No restante eu também acompanho o voto integralmente", declarou Rocha.
"O condenado por crime contra a administração pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou%2C ou à devolução do produto do ilícito praticado%2C com os acréscimos legais".
O advogado Roberto Podval afirmou à reportagem, antes do julgamento, que previa entrar com embargos de declaração, mas que isso dependeria da sessão de hoje. Ele ainda não respondeu a novo questionamento da reportagem após o jugamento, e durante a semana tem preferido não se pronunciar sobre o assunto.
Entenda o caso
Ministro da Casa Civil entre 2003 e 2005, durante o primeiro governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, José Dirceu foi condenado em maio de 2016, em primeira instância, a 20 anos e 10 meses de prisão por corrupção passiva, pertinência à organização criminosa e lavagem de dinheiro por supostamente receber propina e favorecer a empreiteira Engevix em contratos com a Petrobras.
Dirceu já estava preso desde agosto de 2015, portanto antes da condenação, por decisão do juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Criminal de Curitiba, que considerava haver riscos para o cometimeto de novos crimes.
Em maio de 2017, no entanto, o STF (Supremo Tribunal Federal) concedeu habeas corpus ao ex-ministro por entender que a prisão era ilegal naquele momento, já que não havia elementos para uma detenção preventiva e porque o caso não tinha passado ainda pela segunda instância, condição que abre caminho para a pena ser executada.
Dirceu desde então cumpre prisão domiciliar. Ele usa tornozeleira eletrônica, foi obrigado a entregar o passaporte e não pode deixar Brasília, onde mora.
O julgamento na segunda instância, pela 8ª Turma do TRF4, ocorreu em setembro de 2017, quando a condenação foi mantida e ampliada para 30 anos e 9 meses de reclusão em regime fechado.
Formada pelos desembargadores João Pedro Gebran Neto, Leandro Paulsen e Victor Santos Laus, a 8ª Turma não tomou a decisão de forma unânime. Gebran, que é relator na segunda instância das ações relacionadas à Lava Jato, queria pena maior, de 41 anos, mas foi vencido por Paulsen, que pedia 27 anos, e Laus, cujo entendimento de pena de 30 anos e 9 meses prevaleceu.
Com as divergências, abriu-se a possibilidade de os advogados de Dirceu entrarem com os recursos chamados "embargos infringentes", quando há possibilidade de pedir alteração do conteúdo da sentença. Nesse tipo de julgamento, também é necessário convocar mais desembargadores para analisar os recursos.
Quando isso ocorre nas apelações da Lava Jato, o julgamento ocorre na 4ª Seção do TRF4, que reúne os seis desembargadores especializados em casos penais: além de Gebran Neto, Laus e Paulsen, são convocados os magistrados da 7ª Turma, Márcio Antônio Rocha, Claudia Cristina Cristofani e Salise Monteiro Sanchotene. A sessão é presidida pela vice-presidente do TRF4, desembargadora Maria de Fátima Labarrère, mas ela vota somente se o resultado dos embargos infringentes ficar empatado em 3 a 3. Caso contrário, vale o resultado dos seis desembargadores.
No julgamento de hoje, o desembargador Gebran Neto, que está de férias, foi suibstituído pelo juiz federal Nivaldo Brunoni.