Conspiração e 'DNA bolsonarista' no GSI; veja principais pontos do depoimento do general Heleno
O ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional negou que tenha tido participação em conspirações de golpe no Planalto
Brasília|Hellen Leite e Bruna Lima, do R7, em Brasília
A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investiga os atos extremistas do 8 de Janeiro, em Brasília, ouviu nesta terça-feira (26) o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) na gestão de Jair Bolsonaro (PL), o general Augusto Heleno. Ele depôs na comissão como testemunha, com direito ao silêncio e a garantia de não autoincriminação diante de perguntas com potencial para prejudicá-lo.
No depoimento, Heleno disse que não teve nenhum conhecimento sobre a minuta de golpe encontrada pela Polícia Federal (PF) na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres. Negou também que tivesse ido a acampamentos instalados em frente a quartéis-generais do Exército e que tivesse participado de reuniões com chefes das Forças Armadas nas quais estaria sendo combinado um golpe de Estado.
Confira os principais momentos do depoimento.
Ataques de 12 de dezembro à sede da Polícia Federal
O general negou qualquer participação nos atos de vandalismo ocorridos em 12 de dezembro, nos arredores da sede da PF, em Brasília, por pessoas que participavam do acampamento em frente ao comando-geral do Exército. “Tomei conhecimento disso pela TV. Nem eu e muito menos o GSI fomos mentores ou participamos desses atos”, disse o ex-ministro.
Na ocasião, um grupo de vândalos se reuniu em frente à sede da PF e tentou invadir o prédio. Como foram impedidos, eles começaram uma manifestação nas ruas, queimaram carros e ônibus e atacaram soldados da Polícia Militar, arremessando pedras e pedaços de madeira.
A relatora da comissão, a senadora Eliziane Gama (PSD-MA), apresentou um relatório da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) que indicava riscos de vandalismo que poderia ser praticado pelos acampados em Brasília.
Em seguida, Augusto Heleno negou conhecimento do fato e disse que documentos como o apresentado eram rotineiros, mas que “em geral falam apenas de possibilidades, que podem ou não se concretizar”.
DNA “bolsonarista” no GSI
Heleno também negou ter deixado um “DNA bolsonarista” no GSI e afastou qualquer possibilidade de politização do órgão. Segundo ele, não houve participação nem atuação institucional do órgão nos atos que antecederam o 8 de Janeiro.
"Não ficou DNA bolsonarista porque eu jamais tratei de política com meus servidores”, afirmou o general, que acrescentou nunca ter ido à Abin tratar de assuntos de interesse de políticos. “Jamais me vali de reuniões, palestras ou conversas para tratar de assuntos eleitorais ou político-partidários com meus subordinados no GSI. Não havia clima para isso, e o único ser político do GSI era eu mesmo. Os demais eram servidores do Estado brasileiro."
Sobre os acampamentos, o general garantiu nunca ter ido ao local, "não por falta de tempo, mas por falta de condições de participar do que realizavam no acampamento", mas, na sua opinião, tratava-se de atividades "pacíficas e ordeiras".
Transição de governo
Heleno rebateu ainda o ex-ministro do GSI da gestão Lula, o general Gonçalves Dias, sobre não ter havido uma transição da pasta — afirmação que foi feita por Dias em mais de uma ocasião.
Heleno disse que foram realizadas três palestras para a equipe de transição de Lula.
“Nessas oportunidades, as portas do GSI foram abertas com total transparência, e o então ministro do GSI [Gonçalves Dias] teve a liberdade de conversar com quem quisesse, estabelecer quem queria manter no GSI, trocar, teve absoluta liberdade de fazer todas as trocas que julgasse necessário”, disse.
Permaneceu no cargo na nova gestão o secretário-executivo, general Carlos José Penteado, bem como o adjunto e quatro secretários. Para governistas, a permanência dos nomes nos cargos e o fato de dois membros estarem atuando no órgão nos dias dos ataques — Penteado e Carlos Feitosa Rodrigues — vinculam o general Heleno ao 8 de Janeiro, o que foi negado pelo ex-GSI.
Perguntas sem resposta
O militar se negou a responder questionamentos feitos por parlamentares governistas na primeira parte da reunião. Algumas das perguntas tiveram relação com a participação dele nos governos militares iniciados após o golpe de 1964.
"Em agosto de 2021, o senhor sustentou haver previsão constitucional para intervenção militar. O senhor é partidário da tese que advoga o poder moderador das Forças Armadas?", questionou a senadora Ana Paula Lobato (PSB-MA). "Isso não está no escopo da minha convocação aqui. Vou ficar em silêncio", respondeu Heleno.
O ex-ministro também se recusou a responder a uma pergunta do deputado Rubens Pereira Junior (PT-MA). O parlamentar queria saber se o general Augusto Heleno havia participado de uma reunião, em novembro do ano passado, entre o então presidente Jair Bolsonaro e os comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica.
Segundo informações atribuídas ao acordo de delação premiada firmado entre a Polícia Federal e o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro — citadas pelos parlamentares alinhados com o governo —, o encontro teria abordado a possibilidade de um golpe de Estado para impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em resposta a uma pergunta da relatora da CPMI, Heleno negou ter participado do encontro.
A última pergunta sem resposta foi formulada pelo deputado Rogério Correia (PT-MG). Ele queria saber se o ex-ministro do GSI havia participado de uma reunião, em agosto de 2022, entre o então presidente Jair Bolsonaro e o hacker Walter Delgatti Neto. O encontro no Palácio da Alvorada teria abordado a segurança das urnas eletrônicas.
Bate-boca e expulsão de deputado
O general se irritou com a relatora, a senadora Eliziane Gama (PSD-MA), e soltou uma série de palavrões durante seu depoimento. “Ela fala as coisas que ela acha que está na minha cabeça. Por.. é para ficar p…, né?”, reclamou (veja o vídeo abaixo).
A irritação ocorreu em razão de provocações feitas durante as perguntas. Eliziane questionou se as eleições teriam sido fraudadas, e Heleno respondeu: “Já tem o resultado das eleições, já tem o novo presidente da República. Pô, não posso dizer que foram fraudadas”. A relatora ressaltou, então, que o general teria “mudado de ideia”.
A jornalistas, Eliziane disse que o militar “se irrita porque claramente não consegue encarar uma realidade que está à frente dele”.