‘Democracia é a voz do povo e deve ser respeitada’, diz Lula ao parabenizar Trump
Republicano ultrapassou os 270 delegados no colégio eleitoral e retornará à Casa Branca a partir de 20 de janeiro
Brasília|Clarissa Lemgruber, do R7, em Brasília
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva parabenizou nesta quarta-feira (6) Donald Trump pela vitória nas eleições presidenciais dos Estados Unidos. Por volta das 7h35, o resultado foi projetado pela agência de notícias Associated Press. Em seu perfil nas redes sociais, Lula falou em “diálogo” e “trabalho conjunto” e defendeu o respeito à democracia.
Na semana passada, Lula manifestou apoio à candidata democrata Kamala Harris, oponente de Trump pela Casa Branca, justificando que seria um caminho “muito mais seguro para a gente fortalecer a democracia”.
No entanto, durante a campanha, Lula evitou direcionar apoio à candidata, justificando que não poderia “dar palpite sobre as eleições em outros países porque seria uma ingerência indevida”.
A rápida declaração de Lula reconhecendo e parabenizando a vitória de Trump, mesmo com as diferenças ideológicas, difere da decisão tomada pelo então presidente Jair Bolsonaro, em 2020. Quando Joe Biden foi eleito nos EUA, Bolsonaro levou mais de um mês para parabenizar a vitória, sendo o último chefe de Estado do G20 a fazer o comunicado público. Isso porque Bolsonaro esperou o Colégio Eleitoral referendar o resultado.
Bolsonaro
Na manhã desta quarta-feira, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) se referiu a Donald Trump como “amigo” e o parabenizou pela “vitória épica” rumo à Casa Branca. “Que a vitória de Trump inspire o Brasil a seguir o mesmo caminho”, afirmou o Bolsonaro. A avaliação ocorreu após o estadunidense se declarar eleito.
No comunicado publicado pelas redes sociais, Bolsonaro ainda disse que o resultado simboliza o “ressurgimento de um verdadeiro guerreiro”. Ele lembrou do processo eleitoral enfrentado por Trump em 2020 e se referiu ao caso como uma “injustificável perseguição judicial”.
Parte da declaração foi usada por Bolsonaro para fazer um paralelo com a situação brasileira e incentivar os eleitores aliados a fortalecer a direita no país. “Esta vitória encontrará eco em todos os cantos do mundo, impulsionando não apenas os Estados Unidos, mas também o fortalecimento da direita e dos conservadores em muitos outros países”, escreveu, chamando os “compatriotas” a verem “neste exemplo a força para jamais se dobrarem”.
Diversos líderes mundiais repercutiram o resultado das eleições norte-americanas durante a madrugada e o início da manhã, mesmo antes de Trump ter a vitória oficial declarada.
Vitória de Trump
Às 7h35 (horário de Brasília), o republicano havia garantido 277 votos, com o resultado mais recente de Wisconsin, que garantiu mais 10 votos no colégio eleitoral.
Muitos estados tiveram uma apuração rápida durante a madrugada, fazendo com que o republicano declasse vitória antes mesmo de atingir o número mínimo de 270 delegados.
O ex-presidente venceu em estados considerados decisivos, como a Pensilvânia, Geórgia e Carolina do Norte.
Trump retorna à Casa Branca oito anos após a primeira eleição e será o segundo presidente na história do país a governar por dois mandatos não consecutivos.
Nas eleições de 2020, o republicano perdeu para Joe Biden e, na ocasião, muitos acreditavam que a carreira política de Trump tinha chegado ao fim.
Além disso, esta é a primeira vez na história dos Estados Unidos que um presidente eleito é réu em diversos processos criminais — o que inclui conspiração contra o Estado pelo incentivo ao ataque ao Capitólio.
Em 2016, saiu vitorioso com o slogan “Make America Great Again” (Faça os Estados Unidos Grandes de Novo, em tradução literal) e com a promessa de construir um muro na fronteira com o México para impedir a entrada de imigrantes ilegais e drogas.
Quatro anos depois, prometeu restaurar os EUA por meio “da lei e da ordem”, em um momento de pandemia e manifestações antirracistas por causa da morte de George Floyd. Ao perder, teria incitado seus apoiadores a invadir o Capitólio com a mentira de que os democratas haviam roubado a eleição, segundo as acusações que enfrentou.
Na campanha deste ano, apenas a intensidade do discurso mudou. Não falou mais em muro, mas em deportação em massa de milhões de imigrantes ilegais, com o uso de militares. “Eles [os imigrantes] estão envenenando o sangue de nosso país”, afirmou, em um comício, em dezembro de 2023.
Trump também defendeu o corte dos impostos, e o aumento de tarifas nos produtos importados nos comícios que fez.
Ao longo da corrida presidencial, no dia 13 de julho, quando ainda enfrentava o candidato Joe Biden, Trump sofreu um atentado a tiros durante um comício na Pensilvânia.
O ex-presidente foi atingido de raspão na orelha e retirado às pressas por agentes federais. O autor dos disparos era um jovem de 20 anos que foi morto durante o atentado.
O favoritismo de Trump cresceu em meio à comoção pelo atentado, ao mesmo tempo em que ficou maior a pressão para que Joe Biden desistisse da corrida presidencial pelo Partido Democrata. Uma semana depois do atentado, o presidente dos Estados Unidos desistiu de disputar a reeleição, e Kamala Harris o substituiu como a nova candidata democrata.
Primeiro mandato
Trump redefiniu o Partido Republicano, os temas mais debatidos nos EUA e o equilíbrio de poder no mundo. Antes, era apenas conhecido em programas de TV, tabloides e aparições em filmes. Por anos, construiu uma imagem de ostentação e sucesso, mesmo estando no centro de casos de fraude e já ter declarado falência em seis ocasiões.
Em 2016, após ter ensaiado outras duas vezes, Trump disse que seria candidato à presidência. Anunciou o plano num discurso contra imigrantes e muçulmanos, colocando-se como um outsider que combateria a elite política e alguém capaz de levar os EUA para os “melhores tempos do passado”. A ideia de um declínio na sociedade americana estava no ar e ele catapultou o slogan “Make America Great Again”, depois transformado em movimento.
A princípio, o candidato parecia uma piada, mas suas declarações atraíam uma cobertura cada vez maior da imprensa. Aos poucos, as ideias se tornaram temas de debate em grandes emissoras e se espalharam. Nas primárias republicanas, o magnata superou nomes como Ted Cruz, Lindsay Graham e Jeb Bush, mais tradicionais no partido.
Uma vez escolhido para a vaga de candidato republicano, ele enfrentou a democrata Hillary Clinton, uma veterana na política. Embora ela tenha conquistado 2,9 milhões de votos a mais, Trump ganhou no colégio eleitoral. Foram 306 votos a 277, contrariando o que diziam as pesquisas em Estados como Michigan, Pensilvânia e Wisconsin.
No início do mandato, Trump revogou medidas do governo Obama, muitas referentes ao meio ambiente, e retirou os EUA de acordos internacionais importantes, como os Acordos de Paris e o Acordo Nuclear do Irã.
O governo Trump encararia o primeiro ano da pandemia da Covid-19 no sentido contrário de todas as normas de segurança sanitárias: foi contra máscaras, testes, lockdown e a favor do uso da cloroquina, contrariando a opinião médica. O republicano chegou a sugerir injeção de desinfetante nos infectados.
Com as críticas pela atuação na crise e um cenário dramático nos EUA, que liderava no número de casos e mortes, muitos que votaram em Trump, em 2016, mudaram o voto para Joe Biden, em 2020, e o democrata vencedor.
O republicano, no entanto, não aceitou o resultado e começou uma campanha de difamação. A teoria de que a eleição foi roubada se espalhou e resultou na invasão do Capitólio, em 6 de janeiro de 2021.
Trump motivou apoiadores a impedirem que Biden assumisse o cargo. Pelo menos 2 mil correligionários do presidente invadiram o Capitólio. O resultado foram 140 policiais feridos e 5 pessoas mortas. Invasores foram acusados por crimes de depredação e violência contra policiais. Muitos foram presos após investigações federais. Até hoje, Trump afirma que a invasão foi um “ato patriótico” e diz que, caso eleito, libertará os apoiadores presos.
Fora da Casa Branca, o presidente não desapareceu. O “cidadão Trump” esteve na mira de investigações e processos criminais, sendo o primeiro presidente a ser acusado formalmente de crimes, por interferência eleitoral na Geórgia, manuseio inadequado de documentos secretos, fraude financeira e invasão ao Capitólio.
Ele foi julgado culpado no caso civil da jornalista E. Jean Carroll por abuso sexual e difamação e também no caso de fraude envolvendo a atriz pornô Stormy Daniels. Os outros casos devem ser julgados após as eleições, mas apenas se ele não se tornar presidente de novo.
Durante a campanha, Trump radicalizou ainda mais ao dizer que planeja deportar milhões de imigrantes e fechar emissoras que contrariem suas ideias. Em uma entrevista, declarou que gostaria de ser um ditador. “Por um dia, apenas.”