Juristas divergem em relação a regras para visita íntima em presídios federais
Supremo Tribunal Federal deve julgar nesta quinta-feira (9) uma ação que questiona trechos da resolução do Ministério da Justiça
Brasília|Gabriela Coelho, do R7, em Brasília
Uma norma do Ministério da Justiça e Segurança Pública que limita o acesso de pessoas para visita íntima em presídios federais divide a opinião de juristas. Nessas penitenciárias há presos considerados mais perigosos e a vigilância é diferenciada. Uma ação sobre o tema está prevista para ser julgada no Supremo Tribunal Federal nesta quinta-feira (9).
Em um dos trechos, está estabelecido que a visita íntima é dada aos presos declarados como delator premiado e aos que não tenham tido função de liderança ou participado de forma relevante em organização criminosa.
A restrição também vale para os envolvidos na prática reiterada de crimes com violência ou grave ameaça e em incidentes de fuga, de violência ou de grave indisciplina.
Um outro trecho estabelece a autorização do registro de apenas um cônjuge e não pode haver substituição. Se ocorrer separação ou divórcio, o dispositivo prevê que o preso pode indicar novo cônjuge após 12 meses do cancelamento formal da nomeação anterior.
No ano passado, o relator da ação, ministro Edson Fachin, votou por invalidar previsão que proíbe alguns presos de receberem visitas íntimas em presídios federais. De acordo com o ministro, esta disposição é inconstitucional porque viola as convenções protetivas de direitos humanos e ofende as diretivas internacionais vinculantes ao Brasil.
A favor
Para o criminalista Adriano Alves, o ponto que talvez apresente maior prejuízo legal ao preso é o condicionamento ao bom comportamento para possibilitar a visita, mas ele concorda com a parte da comprovação conjugal.
A questão da comprovação documental da relação conjugal faz todo sentido%2C para dar certo controle ao sistema prisional. Caso não haja um controle mínimo documental para visita íntima%2C seria impossível realizar um controle%2C possibilitando%2C inclusive%2C a organização de atividades ilegais.
Para a criminalista Mariana Monteiro de Castro, a Resolução do ministério se mostra adequada às diretrizes das Regras de Mandela e Bangkok, dos precedentes da Corte Interamericana de Direitos Humanos e da Corte Europeia de Direitos Humanos.
"A norma afirma que retirando-se os vínculos familiares dos presos, esvaem-se também quaisquer perspectivas de ressocialização dos detentos. É importante destacar que é dever do Estado proporcionar a preservação dos vínculos familiares, sendo que o direito à família, os princípios constitucionais da reintegração do preso à sociedade e o direito à visita íntima consolidam tal dever", disse.
Aponta-se%2C no entanto%2C que o direito à visita íntima não é absoluto e há que ser analisado nos termos das circunstâncias de cada caso concreto.
As ações que chegaram ao STF alegam que os dispositivos questionados atentam contra as Regras de Mandela, as Regras de Bankok e a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura. Argumentam ainda que estabelecer restrições às visitas pessoais é impor à família do preso uma pena que ultrapassa a pessoa do condenado.
Contra
Para o especialista em direito penal Rodrigo Barbosa, a portaria é absolutamente inconstitucional e viola não apenas garantias constitucionais, como diversos tratados internacionais de direitos humanos. "O que o Ministério da Justiça tentou fazer é criar um novo tipo de pena não previsto no ordenamento jurídico", afirma.
Para Barbosa, a pasta não pode legislar sobre essas questões, mas apenas regulamentar, e as alegações de que visitas íntimas tornam possível passagem de objetos e de outras violações das normas de segurança são insustentáveis, pois representam punir o detento por uma falha do Estado.
Nossas prisões não reduzem a criminalidade%2C mas aumentam e%2C essa portaria%2C baseada em doutrinas penais do século 18 e 19%2C somente piora ainda mais a situação.
Especialista em direito penal econômico, André Damiani afirma que os trechos que regulamentam a visita íntima no interior das penitenciárias federais violam frontalmente princípios constitucionais, dentre os quais o da dignidade da pessoa humana.
A Constituição assegura ao cidadão preso a assistência da família e a Lei de Execução Penal prevê%2C dentre os direitos do preso%2C a visita do cônjuge ou companheiro.
Segundo Damiani, a visita íntima ou sexual ao preso, em estudos referentes ao tema, tem-se realçado que a abstinência sexual imposta causa graves danos, como desequilíbrio emocional, favorecendo a prática de ações inadequadas e aumentando a tensão entre os presos.
Outra ação
Outra ação sobre o tema tramita no STF. Ela está suspensa por um pedido de vista (mais tempo para analisar o caso) do ministro Dias Toffoli, desde 2021. A Corte discute se a revista íntima de visitantes de presídios é vexatória.
O relator, ministro Edson Fachin, entende que a revista íntima em presídios é vexatória e viola a dignidade. Como consequência, entende que as provas que forem obtidas por esse procedimento devem ser consideradas ilícitas.
De acordo com o ministro, é inaceitável que agentes estatais determinem como protocolo geral a retirada das roupas íntimas para inspeção das cavidades corporais.