Reconhecimento facial erra de novo e acusa inocente
Laudo de papiloscopistas da Polícia Civil teria apontado pessoa errada de assaltar ônibus. É a possível segunda falha recente
Brasília|Fabiano Bomfim, da Record TV, e Alan Rios, do R7, em Brasília
Um laudo produzido por papiloscopistas da Polícia Civil do Distrito Federal apontou um morador do DF como autor de um crime que, ao que tudo indica, ele não teria cometido. Eduardo Wendel Pereira do Santos, de 23 anos, foi considerado suspeito de assaltar um ônibus em Brasília. Mas uma outra avaliação, feita por peritos criminais da PCDF, com análise de tatuagens, contrapõe a conclusão "com o máximo grau de plausibilidade". Esse foi o segundo possível erro recente do Instituto de Identificação que culminou com um suspeito inocente da acusação.
Os investigadores compararam as imagens de câmeras de segurança do veículo com fotografias do banco de dados da Polícia Civil. O método foi parecido com o que levou à prisão do pedreiro José Domingos Leitão, no Piauí, noticiada com exclusividade pelo R7 em dezembro.
O laudo do Instituto de Identificação afirma que "há possibilidade" do autor do roubo ao ônibus flagrado nas câmeras de segurança ser Eduardo Wendel. Veja abaixo:
Diante das dúvidas, um novo laudo foi solicitado a outro segmento da Polícia Civil, o Instituto de Criminalística. Os peritos chegaram a uma conclusão diversa dos papiloscopistas, de que não é possível apontar Eduardo Wendel como autor do assalto, apesar da ficha criminal que ele possui. Wendel já foi condenado a 24 anos de prisão por outros crimes.
Para os especialistas, as tatuagens, os traços e o tom de pele do assaltante do ônibus não condizem com o de Eduardo Wendel. Confira:
Diante do analisado e exposto%2C concluem os Peritos Criminais que a análise realizada contrapõe%2C com o máximo grau de plausibilidade%2C a hipótese de o indivíduo de interesse%2C descrito no Laudo de Perícia Criminal nº 57.732%2F2021 – SPBA%2FIC%2C e EDUARDO WENDEL PEREIRA DOS SANTOS serem um único indivíduo
Em nota, a Polícia Civil do Distrito Federal diz que realiza suas atividades periciais no âmbito da Comparação Facial seguindo estritamente os protocolos internacionais preconizados. E afirma, ainda que "é rigorosa na emissão e revisão de seus resultados no exercício de suas atribuições periciais, cumprindo todos os protocolos necessários para garantia da segurança jurídica da persecução penal."
O que dizem os papiloscopistas
A Presidente da Associação Brasiliense de Peritos Papiloscopistas, Maíra Lacerda, negou a existência erros. Esclareceu que o software de identificação não foi usado para elaborar o laudo de Eduardo Wendel Pereira dos Santos, de 23 anos, mas uma perícia de comparação facial. "A imagem do suspeito indicado foi confrontada com a imagem do obtida do local de crime", disse.
Lacerda explica que não houve reanálise do laudo do Instituto de Identificação pelo Instituto de Criminalística. "Caso houvesse necessidade de revisão do trabalho técnico, ele seria feito dentro do próprio órgão", complementou.
Segundo ela, um laudo de perícia se propõe a esclarecer os fatos investigados e não funciona como uma prova isolada e desconexa da investigação policial. "Um lado por si só não condena e não indicia ninguém. Ele vai se juntar a um conjunto probatório em prol do esclarecimento dos fatos", explicou.
Caso semelhante
O R7 havia mostrado, no fim de 2021, que esse não foi o primeiro erro da Polícia Civil do Distrito Federal. José Domingos Leitão, pedreiro de 52 anos, foi preso pela corporação após o reconhecimento facial apontá-lo como autor de um crime na capital. Porém, ele é morador de Ilha Grande, no Piauí, e estava na cidade no dia do delito em questão.
A ordem de prisão também teve como base um laudo do Instituto de Identificação, feito a partir da comparação de imagens de câmeras de segurança de uma loja de departamentos do DF — em que o real criminoso aparece — com a identidade de Leitão, rastreada pelo programa de computador num banco de dados nacional.
O pedreiro acabou sendo liberado três dias depois da prisão, mas afirmou que ainda sofre as consequências da falsa acusação. "Eu sofri, porque fui julgado pelos vizinhos. Perdi muitos serviços, porque disseram que eu era traficante. Falei que era inocente e a delegada falou para mim para eu pensar no que tinha feito. Pensei muito na minha família, que eu não ia voltar mais." Ele decidiu processar o Distrito Federal por danos morais e pede indenização de R$ 50 mil.