Renúncia fiscal no DF alcança R$ 25,3 bilhões em uma década, mostra Fenafisco
Valor se refere à quantia que o governo deixa de receber para beneficiar empresários e indústrias na capital do país
Brasília|Edis Henrique Peres, do R7, em Brasília
O Governo do Distrito Federal deixou de receber ao menos R$ 25,3 bilhões para beneficiar empresários e indústrias na capital do país desde 2015. Segundo levantamento feito pela Fenafisco (Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital), o valor aumentou quase 21% nos últimos anos. Em 2015, por exemplo, a renúncia fiscal do DF foi de R$ 3,7 bilhões. No ano passado, ela chegou a R$ 4,4 bilhões. No entanto, apesar do crescimento da renúncia fiscal, a Secretaria de Economia afirma que a arrecadação tributária cresceu no DF, o que, segundo ele, significa investimento direto em políticas públicas (veja resposta completa abaixo).
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Para 2024 e o ano que vem, a expectativa é que a renúncia se aproxime dos R$ 4,5 bilhões. “A gente fez o estudo para saber qual o tamanho do benefício que o Estado oferece para as grandes corporações, justamente porque muitas vezes há questionamentos sobre os benefícios sociais dados à população mais pobre, sem considerar também os benefícios aos empresários”, diz o presidente da Fenafisco, Francelino Valença.
A renúncia fiscal é o valor que o governo abre mão de receber e transfere em recursos públicos para a iniciativa privada. O principal questionamento feito pelo presidente da Fenafisco é qual o real benefício que a renúncia traz para a sociedade.
É dito que essas medidas trazem desenvolvimento econômico, protegem a indústria nacional e fortalecem o emprego e renda. Mas não parece que esse é o caminho, os dados não apontam para essa questão. Sem falar que essas renúncias não são tão transparentes e não demonstram um ganho prático.
Valença destaca que os dados dos ganhos dos servidores públicos estão disponíveis no Portal da Transparência para a população consultá-los, mas o mesmo não ocorre com os números sobre os benefícios fiscais. “Qualquer pessoa deveria ter acesso a essas informações, identificar quais e quantas corporações recebem e o que isso traz de volta em benefícios”, pontua.
No DF, em 2023, os setores mais beneficiados foram indústria, atacadistas e distribuidores, que receberam 28,47% das renúncias fiscais, somando R$ 1,11 bilhão.
Desafios
O estudo foi elaborado pelo doutor em economia Juliano Goularty e pela doutora em história Talita Alves. Ao R7, Goularty explicou que o levantamento considerou os dados da Lei Orçamentária Anual e as correlações com informações prestadas pelas Secretarias de Economia de cada unidade da Federação.
“A questão não é se a renúncia fiscal é alta ou baixa, mas ela representa uma receita potencial, um recurso público, e o estado não acompanha como será aplicado esse benefício. Não sabemos, por exemplo, se o empresário investiu em maquinário, aumentou exportação, melhorou os salários dos funcionários ou contratou mais colaboradores. Não temos um planejamento que acompanhe esse recurso público”, detalha.
O especialista diz que o objetivo ao oferecer renúncia fiscal às empresas é garantir geração de emprego e renda, além de desenvolvimento econômico, “no entanto, não sabemos se isso de fato se aplica”.
A empresa, ao ter renúncia fiscal, reduz o custo de produção e aumenta os ganhos sem necessariamente aumentar a contratação de funcionários ou fazer investimento em infraestrutura. O incentivo fiscal não é um dispositivo automático de geração de emprego, como um interruptor, que você liga e gera oportunidades. É um incentivo que você concede sem garantias de acompanhamento do destino final da distribuição tributária
O economista ainda pontua que como as concessões de renúncias fiscais são dadas sem prazo, o governo costuma oferecer o benefício sem conseguir aplicá-lo em outras funções depois.
“Depois de oferecido o benefício, é muito difícil o governo conseguir retirá-lo, porque há muita pressão política. Isso causa um desenvolvimento geográfico desigual, acaba estimulando o desenvolvimento em um território e desvalorizando outro. Geralmente, concentra as empresas nas regiões metropolitanas.”
O pesquisador do estudo ainda acrescenta que a renúncia fiscal não necessariamente garante um preço mais em conta do produto oferecido para os consumidores. “A concorrência dessas grandes empresas não é feita por preço, mas sim por tecnologia. Não existe essa correlação sintomática da renúncia fiscal e da formação de preço. Tivemos, por exemplo, o período de isenção para a chamada linha branca [eletrodomésticos básicos, como fogão e geladeira, por exemplo], mas o valor desses produtos baixou apenas no primeiro momento, depois eles voltaram a aumentar. Ou seja, a renúncia não foi repassada ao consumidor e apenas aumentou o lucro do empresário”, observa.
Investimento direto em políticas públicas
Questionado pelo R7, o secretário-executivo da Fazenda da Secretaria de Economia, José Itamar Feitosa, disse que para compreender o impacto da renúncia nas contas públicas é necessário olhar para a receita. “Uma vez que a concessão de benefícios reflete no desempenho da receita efetiva, cabe observar o comportamento da arrecadação”, diz ele.
Segundo o titular da pasta, nos últimos dez anos a arrecadação tributária do DF saiu do patamar de R$ 13,6 bilhões em 2015 e deverá atingir R$ 24,6 bilhões em 2025, em valores históricos, conforme estimativa no PLOA/2025 (Projeto de Lei Orçamentária Anual) “Tal evolução corresponde a um aumento acima da inflação, medida pelo INPC/IBGE (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), em torno de 11,3%”, ressalta. Para ele, apesar da concessão de benefícios, a arrecadação segue numa trajetória de crescimento real (acima da inflação), promovendo recursos para financiamento das políticas públicas via gasto direto.