Ribeiro diz ter recebido ligação de Bolsonaro: 'Ele acha que vão fazer busca e apreensão'; ouça áudio
Em conversa telefônica com a filha no dia 9, o ex-ministro relatou diálogo com o presidente; a Polícia Federal realizou prisão no dia 22
Brasília|Renato Souza e Sarah Teófilo, do R7, de Brasília
O ex-ministro da Educação Milton Ribeiro afirmou à filha, no último dia 9, em conversa por telefone, que recebeu uma ligação do presidente Jair Bolsonaro (PL) na qual ele disse temer que Ribeiro fosse alvo de uma operação da Polícia Federal (PF). Ouça:
A conversa ocorreu apenas 13 dias antes de o ex-ministro ser atingido pela Operação Acesso Pago, que apura corrupção passiva, prevaricação, advocacia administrativa e tráfico de influência para a liberação de recursos públicos do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), vinculado ao MEC (Ministério da Educação). O R7 adiantou mais cedo a existência dos áudios.
"A única coisa meio... Hoje o presidente me ligou... Ele tá com um pressentimento, novamente, que eles podem querer atingi-lo através de mim, sabe? [...] Ele acha que vão fazer uma busca e apreensão... Em casa, sabe... É muito triste. Bom! Isso pode acontecer, né? Se houver indícios", disse o ex-ministro em conversa com a filha, conforme transcrição feita pela Polícia Federal. A filha então responde: "Eu não sei se ele tem alguma informação... Eu tô te ligando do meu... Eu tô te ligando do celular normal, viu, pai?". Em seguida, Ribeiro diz: "Então depois a gente se fala".
Ao encaminhar o processo de investigação de Milton Ribeiro ao Supremo Tribunal Federal (STF), o juiz federal Renato Borelli citou outras duas conversas em que o ex-ministro demonstra ter medo de operações da PF nas investigações sobre a influência dos pastores Arilton Moura e Gilmar Santos no MEC. Em uma delas, ele diz:
"Agora tem que aguardar, né? Alguns assuntos estão sendo resolvidos pela misericórdia divina, né? O negócio da arma, resolveu. Aquele, aquela mentira que eles falavam, que os ônibus estavam superfaturados no FNDE pra [ininteligível] também. Agora vai faltar o assunto dos pastores, né? Mas eu acho assim, que o assunto dos pastores é uma coisa que eu tenho receio um pouco é de o processo fazer aquele negócio de busca e apreensão, entendeu?"
Borelli encaminhou o material ao STF após pedido do Ministério Público Federal (MPF), que apontou possível interferência do presidente Jair Bolsonaro nas investigações. O procurador Anselmo Henrique Cordeiro Lopes pede que a investigação seja encaminhada à mais alta corte do país de forma sigilosa para que seja apurada eventual ocorrência dos crimes de violação de sigilo funcional com dano à administração judiciária e favorecimento pessoal.
"O MPF vem requerer que o auto circunstanciado, bem como o arquivo de áudio do investigado Milton Ribeiro que aponta indício de vazamento da operação policial e possível interferência ilícita por parte do presidente da República Jair Messias Bolsonaro nas investigações, sejam desentranhados dos autos e remetidos, de maneira apartada e sigilosa, ao Supremo Tribunal Federal", diz o pedido.
Após o envio do processo ao STF, o advogado do ex-ministro, Daniel Bialski, questionou o pedido para prisão do cliente, feito pela 15ª Vara da Justiça Federal do Distrito Federal. No entendimento dele, se havia, de fato, alguma pessoa com foro privilegiado citada na ação (como é o caso do presidente da República), o caso deveria ter sido remetido imediatamente ao STF.
"Causa espécie que se esteja fazendo menção a gravações/mensagens envolvendo autoridade com foro privilegiado, ocorridas antes da deflagração da operação. Se assim o era, não haveria competência do juiz de primeiro grau para analisar o pedido feito pela autoridade policial e, consequentemente, decretar a prisão preventiva", afirmou o advogado, que frisou que vai pedir a anulação de todos os "atos e decisões tomadas" no âmbito do processo.
Advogado do presidente Bolsonaro, Frederick Wassef disse que o chefe do Executivo "nada tem a ver com essa história" e que ele "está sendo vítima de mentiras e calúnias". "Se porventura alguém estiver usando o nome do presidente de forma indevida, sem seu conhecimento e autorização, isso não pode ser deturpado, distorcido, tirado de contexto para tentarem responsabilizar o presidente da República", ponderou.
Wassef também garantiu que não houve nenhuma tentativa de interferência na Polícia Federal. "É um afronto desrespeito à instituição da Polícia Federal e à superintendência da Polícia Federal de Brasília. Além de séria e íntegra, é a mais rigorosa do Brasil. Não existe a mínima possibilidade de nenhuma autoridade interferir junto à Polícia Federal. São mentiras infundadas. O presidente Bolsonaro não interfere na Polícia Federal e jamais interferiu na Polícia Federal ou em qualquer outra instituição de seu governo."