TCDF vê prejuízo de R$ 11,2 mi na compra de testes rápidos de Covid
Corte deu 30 dias para que ex-secretário de Saúde, três ex-servidores e empresa expliquem suposto superfaturamento
Brasília|Lucas Nanini, do R7, em Brasília
O Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) quer explicações sobre um suposto prejuízo de R$ 11,2 milhões na compra de testes rápidos para detecção de Covid-19, por dispensa de licitação. A Corte deu 30 dias para que o ex-secretário de Saúde do DF Francisco Araújo Filho e mais três ex-servidores da pasta se manifestem.
A aquisição foi para 100 mil testes rápidos do tipo IgG e IgM. O TCDF também quer explicações sobre a contratação da empresa Biomega Medicina Diagnóstica Ltda, responsável pelo fornecimento e aplicação dos testes e pelas análises laboratoriais. A companhia forneceu mão de obra e estrutura para atendimento drive-thru, entre outros serviços. O tribunal também deu 30 dias para a empresa se manifestar.
O R7 procurou a Biomega para falar sobre o assunto e recebeu a seguinte nota:
"A Biomega tem absoluta convicção da lisura de seus procedimentos e vai demonstrar isso no decorrer de todas as investigações. Sua contratação se deu por ter apresentado o menor preço para os serviços prestados: análise e emissão de laudos de exames laboratoriais referentes à covid-19.
Importante esclarecer que não houve qualquer aumento de preços. O aditivo firmado aumentou o número de exames a serem realizados, com o mesmo preço unitário inicial, conforme prevê a lei.
A Biomega Medicina Diagnóstica é um laboratório de análises clínicas, e não uma distribuidora de testes. Também não vendeu kits para testagem, mas sim a prestação dos serviços de testagem e emissão de laudos.
A empresa declara já ter constatado grandes equívocos com relação às acusações formuladas no que diz respeito à Biomega; eis que foi contratada por ter apresentado o melhor preço, prestou integralmente os serviços valendo-se de pessoal adequado, e utilizando kits de testes homologados pela Anvisa."
Suposta irregularidade
O contrato teve valor de R$ 19,9 milhões, sendo R$ 19,3 milhões bancados pela Secretaria de Saúde. A pasta ainda firmou um aditivo contratual de 50% sobre o valor inicial, mas a nota de empenho foi cancelada após a Operação Falso Negativo, do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT).
Pela análise do TCDF, há indícios de superfaturamento no contrato para testes rápidos. O corpo técnico apontou preço médio de R$ 80,77 na época da assinatura do acordo. A empresa Biomega ofereceu o serviço por R$ 125 a unidade de teste.
O suposto prejuízo de R$ 11,2 milhões é a diferença entre o valor total do contrato e o preço de mercado dos testes rápidos, levando em conta outras possíveis irregularidades, como a ausência de justificativa para firmar acordo com a empresa e a escolha pelo modelo adotado (contratação de fornecedor em vez de realização de testes pela própria secretaria).
Para o TCDF, outra falha ocorreu na abertura da dispensa de licitação. O aviso foi publicado no Diário Oficial do DF em 2 de maio de 2020, um sábado após feriado, e previu prazo para recebimento das propostas até as 15h do primeiro dia útil posterior (4 de maio), o que restringiu a competitividade da dispensa de licitação.
O tribunal questiona a legalidade do contrato também porque a Biomega não estava registrada junto ao Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal (CRM/DF) – um dos requisitos exigidos. Outra irregularidade foi que a empresa não apresentou certificação de licença sanitária para a atividade, conforme norma da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Os conselheiros questionam ainda que a secretaria realizou pesquisa de preços apenas junto a potenciais fornecedores, sem buscar outras fontes, como prevê a lei usada como base para a dispensa de licitação. Após a operação Falso Negativo, surgiram indícios de que a própria Biomega elaborou o projeto básico simplificado da contratação e portanto participou da formatação do contrato, indicando até mesmo a quantidade de postos de drive-thru e de testes a serem adquiridos.
Falso Negativo
O ex-secretário de Saúde Francisco Araújo foi preso preventivamente após o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) e a Procuradoria-geral de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios identificarem que uma suposta organização criminosa instalada dentro da Secretaria de Saúde do DF para fraudar a escolha de fornecedores e superfaturar a compra dos testes. Também foram detidos o ex-subsecretário de Vigilância à Saúde Eduardo Hage Carmo o ex-diretor de Aquisições Especiais da secretaria Emmanuel de Oliveira Carneiro.
Após as prisões pela operação, o governador Ibaneis Rocha (MDB) afastou toda a cúpula da pasta. De forma provisória, Osnei Okumoto assumiu a secretaria. Ele estava na presidência da Fundação Hemocentro de Brasília e já foi titular da Saúde.
Em comunicado oficial, Ibaneis informou que a SES sempre foi transparente na divulgação de informações e que considera desnecessárias as prisões preventivas. O governador afirmou que "todos sempre estiveram à disposição do MP para esclarecimentos de quaisquer fatos relativos à compra de testes".
Segundo o MP, os investigadores afirmam que o prejuízo aos cofres públicos chegaria a R$ 18 milhões. Alguns servidores estariam se organizando para fraudar licitações e comprar testes IgG/IgM de baixa qualidade e com preços superfaturados.