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Proposta do consignado Auxílio Brasil na Caixa teve estimativa seis vezes menor que o executado

Documento mostra queáreas técnicas do banco fizeram alertas sobre os riscos mas não se posicionaram contra a proposta

Economia|Do R7

Programa foi feito às vésperas das eleições de 2022
Programa foi feito às vésperas das eleições de 2022

Alvo de polêmica pela vulnerabilidade do público-alvo e também pelo apelo eleitoral, o crédito consignado do Auxílio Brasil da Caixa Econômica Federal dava sinais de controvérsia já na proposta entregue à cúpula do banco público.

Nesse documento, a estimativa era conceder R$ 1,2 bilhão na linha em um semestre, mas, durante os três meses em que o produto esteve de fato disponível, a Caixa emprestou seis vezes mais através da modalidade.

O arquivo, obtido pelo Estadão Broadcast, ainda mostrava que áreas técnicas do banco fizeram alertas sobre os riscos mas não se posicionaram contra a proposta, que reconhecia como financeiramente vulneráveis os beneficiários do programa social, futuros clientes do novo produto.

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As áreas responsáveis esperavam que as concessões do consignado do Auxílio Brasil não detalhassem as bases para o cálculo. A estimativa ficou muito abaixo do volume efetivamente emprestado.


A Caixa superou em apenas sete dias a projeção a ser cumprida em 180 dias. Na primeira semana, foram concedidos mais de R$ 1,8 bilhão. Devido à alta demanda, em dez dias já havia atraso na liberação dos recursos. Até a Caixa suspender a oferta, em janeiro, foram concedidos R$ 7,6 bilhões.

O crédito foi lançado pela estatal em outubro de 2022, entre o primeiro e o segundo turnos da eleição presidencial, e foi uma das bandeiras da campanha eleitoral do então presidente Jair Bolsonaro (PL) à reeleição.


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A linha permitia que os beneficiários do Auxílio tomassem dinheiro emprestado com o desconto das parcelas diretamente no benefício. O limite de desconto era de 40% do valor pago às famílias todos os meses.

O produto acabou cancelado pela gestão da atual presidente, Rita Serrano, já no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mas continua a gerar polêmica. Recentemente, um diretor da Caixa foi destituído do cargo após divulgar documentos relativos ao consignado com o texto escondido por tarjas, e Rita teve de responder às críticas sobre a modalidade, alvo de investigações de órgãos de controle.

Outros bancos viram riscos

Embora todos os bancos pudessem se habilitar para oferecer o consignado do Auxílio, a Caixa foi o único entre as instituições de maior porte que entrou na linha. Entre os demais, prevaleceu a percepção de que os riscos eram altos demais.

Também controlado pela União, o Banco do Brasil não ofereceu o produto. Nesta semana, porém, o STF (Supremo Tribunal Federal) validou, por unanimidade, o consignado para beneficiários de programas sociais.

Ao calcular concessões de R$ 1,2 bilhão, as áreas responsáveis estimavam que a linha não teria impacto relevante nos índices de capital da Caixa.

Entretanto, após o período eleitoral, o banco público teve de frear praticamente todas as outras linhas após superar em outubro o orçamento de crédito que possuía para todo o ano de 2022.

Pessoas próximas à gestão anterior afirmam, reservadamente, que apesar de o volume de concessões ter superado as estimativas, o banco não tem limite por produto e não houve impacto sobre os limites de capital globais supervisionados pelo Banco Central.

Segundo os interlocutores, tampouco o consignado do Auxílio foi responsável pela fragilização dos índices de liquidez do banco, explicado pelo descasamento das captações, especialmente na poupança, e pelo volume total de concessões, de cerca de R$ 40 bilhões mensais.

Cross-selling no consignado do Auxílio Brasil

A Caixa enxergou na linha uma ferramenta para reforçar o aplicativo Caixa Tem e também para vender mais produtos e serviços aos beneficiários do Auxílio.

"[O crédito ajuda a] incrementar cross-selling [venda cruzada] dos clientes de varejo PF e PJ Caixa, uma vez que, na jornada de concessão está prevista a oferta de Seguro Prestamista, concomitante à operação de crédito", dizia um trecho da proposta.

Modelo do INSS, taxa de privado

A proposta de 10 de agosto do ano passado foi formulada pela vice-presidência de Negócios de Varejo e pela diretoria de Produtos de Varejo e era destinada a um comitê de vice-presidentes das áreas de clientes, crédito e negócios.

O documento tinha como objetivo defender a extensão do modelo de concessão do consignado dos beneficiários do INSS ao público do Auxílio Brasil, criado em 2021 para substituir o Bolsa Família.

Segundo a análise, mais de 35% do público potencial era formado por pessoas com vulnerabilidade de média-alta a crítica.

Para "adaptar" os parâmetros do consignado do INSS aos beneficiários do Auxílio, o documento propõe soluções como simplificar a linguagem das cláusulas contratuais e estabelecer a obrigatoriedade de realização de um questionário voltado à educação financeira antes da contratação.

Um dos riscos apontados pela área técnica do banco era o de superendividamento dos clientes, mas a proposta o relativizou.

"O crédito consignado é limitado pelo valor correspondente à capacidade de pagamento mensal do cliente, delimitada por normatização legal e informada pela convenente [a Dataprev] no momento da concessão", responderam as áreas de negócios e de produtos de varejo. Apesar das adaptações, a proposta considerava que o valor médio das operações seria de R$ 1.350, o mesmo de aposentados e pensionistas.

A taxa, porém, foi de 3,45% ao mês, mais alta que a praticada no consignado do INSS e próxima à do produto destinado a trabalhadores do setor privado, antevendo risco maior.

Em junho deste ano, o consignado do Auxílio tinha inadimplência de 3,37%, se considerados os atrasos acima de 90 dias, contra 2,79% da média da carteira do banco.

A inadimplência vem, principalmente, do cancelamento de benefícios por parte do Ministério do Desenvolvimento Social. Neste caso, a Caixa tem que cobrar o cliente de outras formas.

O que diz a Caixa

Procurada, a Caixa afirmou que a atual gestão suspendeu em janeiro a oferta do produto e o retirou em definitivo do portfólio em março, após a conclusão de estudos técnicos.

"O banco determinou ainda a abertura de uma apuração interna junto à auditoria e corregedoria para apurar os fatos relacionados ao consignado Auxílio Brasil. Os procedimentos estão em andamento e, caso fiquem comprovadas irregularidades, os envolvidos serão devidamente responsabilizados", disse a instituição.

A Caixa afirmou ainda que colabora com as investigações da Polícia Federal, do Ministério Público Federal e do Tribunal de Contas da União sobre a operação e que mudou vice-presidente, diretores e superintendentes nacionais da vice-presidência de Negócios de Varejo.

O banco público disse que a atual presidente, Rita Serrano, criticava a operação quando era representante dos empregados no conselho de administração e que tem reforçado a concessão de crédito "responsável".

"Os resultados do primeiro semestre de 2023 atestam a solidez do banco e consolidam o papel da Caixa no desenvolvimento do País", diz a nota. A Caixa ainda disse que a oferta do consignado está prevista em lei e foi regulamentada pelo então Ministério da Cidadania.

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