Enem 2021 foi marcado por polêmicas e pela crise no Inep
Exame teve o menor número de inscritos da história, acusações de interferência na produção de questões da prova e assédio moral
Educação|Karla Dunder, do R7
A edição do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) 2021 foi marcada por polêmicas. A começar pela data de aplicação das provas.
Em maio, período em que normalmente é divulgado o calendário com as datas do exame, o presidente do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), Danilo Dupas, informou ao CNE (Conselho Nacional da Educação) que as provas poderiam ser adiadas. Membros do conselho entenderam que o exame seria realizado em janeiro de 2022.
A informação foi negada pelo próprio Dupas, e após a repercussão negativa o calendário do exame foi anunciado. O edital foi divulgado em junho, mas os interessados tiveram apenas 15 dias para fazer a inscrição.
Nesta edição, o Inep, responsável pela realização do Enem, restringiu os pedidos de isenção de taxa. O edital aceitava apenas motivos como emergência médica, acidente de trânsito no dia da prova, assaltos e morte na família entre as justificativas aceitas para a ausência, desde que comprovadas com documentos, tais como boletins de ocorrência e atestados de saúde. O temor pela pandemia não estava listado entre os motivos aceitos pelo Inep para justificar a falta.
A edição de 2020 teve o maior número de faltas da história do Enem, uma vez que mais de 50% dos incritos não fizeram a prova em janeiro deste ano.
A DPU (Defensoria Pública da União), entidades estudantis e partidos de oposição entram na Justiça pedindo que os candidatos isentos em 2020, mas que não fizeram a prova, tivessem o direito garantido nesta edição.
Em setembro, o STF decidiu, em sessão extraordinária, pela reabertura das inscrições para isenção da taxa do Enem 2021. Os ministros formaram maioria e acataram o pedido de suspensão de restrição à isenção de pagamento do exame durante sessão virtual.
Neste ano, o Enem registrou o menor número de inscritos desde 2009, com 3,1 milhões de inscrições confirmadas. Ainda, segundo pesquisa do Semesp, houve elitização no Enem: uma queda de 77,4% no número de cadastrados para fazer o exame com renda familiar de até três salários mínimos (R$ 3.300). Já o número de inscritos pagantes aumentou 39,2%.
As provas para esse público serão aplicadas em 9 e 16 de janeiro de 2022, juntamente com a realização do Enem para adultos privados de liberdade e jovens sob medida socioeducativa que inclua privação de liberdade (Enem PPL).
Crise no Inep
Duas semanas antes da aplicação do Enem, 38 funcionários do Inep pediram demissão da autarquia, na pior crise institucional envolvendo o instituto.
Por meio de carta, os funcionários justificaram o afastamento por falta de gestão da direção do instituto e assédio moral. A Assinep (Associação de Servidores do Inep) reuniu em um documento de 36 páginas denúncias de assédio moral e interferência ideológica no Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira). O texto foi encaminhado a órgãos de controle.
Os funcionários também alertaram para uma possível interferência ideológica na condução do exame e para a presença de um agente da Polícia Federal na área segura do exame, o que não é permitido pelos protocolos de segurança.
Danilo Dupas, presidente do Inep, foi convocado a dar explicações tanto na Câmara como no Senado. Em ambos, ele afirmou que as demissões envolviam questões financeiras e negou qualquer interferência na realização do exame.
Já o ministro da Educação, Milton Ribeiro, compareceu de surpresa em uma audiência da Comissão de Educação da Câmara para falar sobre a crise no Inep. Ele também justificou os pedidos de demissão por questões econômicas e afirmou que a presença do agente da Polícia Federal na área segura fazia parte dos protocolos de segurança.
Em visita a Dubai, o presidente Jair Bolsonaro disse que o Enem passa a ter "a cara do governo". Tanto o vice-presidente, Hamilton Mourão, como o ministro da Educação, Milton Ribeiro, negaram qualquer tipo de interferência do governo na montagem das provas. Bolsonaro também negou que já tenha visto a prova, mas afirmou que o Enem era "ativismo político e comportamental".
O TCU (Tribunal de Contas da União) abriu investigação para apurar possíveis irregularidades no Enem após a demissão em massa de servidores do Inep. Os servidores alegaram falta gestão e assédio moral.
A decisão do TCU foi tomada após um grupo de deputados federais ter se reunido com a ministra Ana Arraes para pedir a saída do presidente do Inep, Danilo Dupas. O tribunal deve analisar a solicitação dos deputados, e a relatoria é do ministro Walton Alencar Rodrigues.
O ministro Walton Alencar Rodrigues negou o afastamento de Dupas na véspera da realização do Enem; no entanto, pediu que as denúncias fossem apuradas.
Tanto o Senado como a Câmara criaram grupos de trabalho para acompanhar a crise no Inep.
Enem
As provas do Enem foram realizadas, como o previsto, nos dias 21 e 28 de novembro. Os participantes responderam a 180 questões e produziram uma redação, que neste ano abordou a invisibilidade e o registro civil como tema.
Na primeira prova, com foco nas matérias de ciências humanas e linguagens, teve uma questão que usou um trecho da canção Admirável Gado Novo, do compositor Zé Ramalho, além de perguntas sobre o meio ambiente e a cultura indígena e uma charge do Henfil.
O primeiro dia de prova teve uma taxa de 26% de abstenção, e o segundo dia, de 30%. Durante coletiva de imprensa, o ministro Milton Ribeiro disse que a prova deixou claro que não houve interferência no Enem. "Hoje nós podemos ver que toda essa narrativa de partidos de oposição e até meios de comunicação de uma possível interferência na prova não tinha cabimento", afirmou. "Talvez se tivesse interferência, pode ser até, hipoteticamente, que algumas perguntas nem estivessem ali. Não houve nenhuma interferência na escolha de perguntas", acrescentou.
Já na entrevista após o segundo dia de prova, Ribeiro admitiu que teve a oportunidade de acessar previamente as questões do Enem deste ano e alterá-las, mas disse que optou por não mudar a prova para não prejudicar os participantes.
“Não houve nenhuma tentativa [de mudar as questões], eu não iria tentar simplesmente [trocar as perguntas]. Quando eu percebi que a possibilidade de ter acesso às questões da prova iria trazer muito mais prejuízos do que benefícios aos estudantes, eu simplesmente dei um passo atrás. Eu abri mão desse direito”, afirmou.