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Esquerda vence eleições e freia ascensão da direita com ajuda do centro na França

Bloco surpreende e elege maior bancada, mas precisará de alianças; coalizão de Macron fica em 2º lugar, e partido de Le Pen, em 3º

Internacional|Do Estadão Conteúdo


Franceses comemoram resultado das eleições na Praça da República Reprodução/Instagram

A Nova Frente Popular (NFP), coalizão de socialistas, comunistas, verdes e da esquerda radical, surpreendeu e ficou em primeiro lugar no segundo turno das eleições legislativas antecipadas na França. A vitória deixou o Reagrupamento Nacional (RN), o partido de direita radical liderado por Marine Le Pen e Jordan Bardella, em terceiro lugar, atrás da coalizão de centro liderada pelo presidente, Emmanuel Macron, que ficou em segundo.

Nenhum dos principais blocos políticos obteve maioria absoluta na Assembleia Nacional. A questão do futuro governo permanece sem solução após o segundo turno neste domingo (7).

Os acordos tácitos entre o governo de Emmanuel Macron, de centro, e a coalizão de esquerda, concentrando o voto no candidato com mais chances de derrotar o RN em cada circunscrição, frustraram a vitória da direita radical, mas não deram aos esquerdistas uma maioria absoluta, o que aumenta a incerteza sobre o futuro da França.

O pleito foi marcado pelo forte comparecimento às urnas, com 67% de participação, o maior desde 1981. Contra todas as expectativas, a NFP ficou com 182 assentos na Assembleia Nacional, seguida pela coalizão Juntos, do presidente Emmanuel Macron, com 168 cadeiras, e pela antes favorita Reunião Nacional (RN), de ultradireita, com 143 deputados. Antes, esses blocos tinham, respectivamente, 150, 250 e 89 assentos.


Segundo o levantamento do Le Monde, com base nos dados do ministério, os Republicanos terão 45 assentos, outros partidos de direita, 15, outras legendas de esquerda, 13, outros de centro, seis, regionalistas, quatro, e “diversos”, um. São 577 assentos no total. Nenhum partido ou aliança conseguiu maioria absoluta.

Para o cientista político e pesquisador John Crowley, o resultado foi “uma surpresa para todo mundo” e se deve, sem dúvida, às desistências de candidatos entre o primeiro e o segundo turnos para barrar o crescimento do RN nas urnas. “Não era óbvio que os votos do centro poderiam ir para a esquerda ou vice-versa, mas eles conseguiram. A estratégia da barragem deu certo e fez o RN perder assentos em relação às primeiras estimativas, que davam até a maioria absoluta para o partido de Bardella (289 cadeiras)”, diz o pesquisador.


Mas, de acordo com ele, a formação de um novo governo “vai ser extremamente complicada”. “A esquerda chegou na frente, mas longe de conseguir uma maioria. O presidente da República tem o poder de nomear o primeiro-ministro, ele pode nomear quem ele quiser. Provavelmente, haverá muita negociação nos próximos dias”, explica.

No campo da esquerda, Jean-Luc Mélenchon (A França Insubmissa), Olivier Faure (Partido Socialista), Marine Tondelier (Ecologistas) e o ex-presidente François Hollande (PS), eleito deputado no departamento de Corèze, falaram publicamente saudando o alto placar da esquerda e reivindicando seu lugar no governo.


No campo centrista, o ex-primeiro-ministro Édouard Philippe se colocou à disposição para reunir um conjunto de forças políticas e formar um novo governo. Desde a dissolução da AN, tanto Philippe quanto outras lideranças de centro e da direita moderada se dissociaram da imagem de Macron para tentar assumir a liderança do campo governista.

O presidente Emmanuel Macron, que decidiu dissolver a AN na noite do dia 9 de junho, após a vitória do RN na França nas eleições europeias, para obter uma “clarificação” sobre o voto dos franceses, preferiu não falar publicamente na noite deste domingo (7).

O atual primeiro-ministro, Gabriel Attal, eleito deputado pelo departamento Hauts-de-Seine, disse que vai entregar a sua demissão na manhã desta segunda-feira (8), mas que estaria disposto a ficar no cargo o tempo que fosse preciso.

Diante da dificuldade em se formar um governo sem maioria absoluta, Crowley acredita que – um fato inédito na tradição francesa – é possível que Macron espere passar o verão e os Jogos Olímpicos para nomear um novo primeiro-ministro.

“Na tradição francesa, o primeiro-ministro é nomeado por volta do meio-dia de segunda-feira. Desta vez, eu acredito que nada vai se passar tão rapidamente. Ele vai ganhar tempo e deve formar um novo governo para a volta das férias, em setembro. A França faria algo que acontece com frequência em países como a Alemanha, a Espanha e os países nórdicos, que podem levar meses em negociações até a formação de um novo governo”, explica.

“Endireitar o país”

Qualificado em 441 zonas eleitorais no segundo turno, depois de já ter eleito 39 deputados desde o primeiro turno, o RN e os seus aliados pareciam capazes de obter a maioria na Assembleia Nacional pela primeira vez na V República. Mas depois das inúmeras desistências ocorridas entre as duas rodadas, o partido de Marine Le Pen e Jordan Bardella perdeu a aposta. No entanto, melhorou sua pontuação em relação a 2022, quando enviou 89 deputados à AN.

Jordan Bardella falou em nome de seu partido na noite de domingo. Ele saudou o resultado inédito de seu partido nas legislativas, mas lamentou que, com a barragem, seu partido não tenha conseguido a maioria para “endireitar o país”.

A reportagem conversou com eleitores que votaram no domingo. Em Paris, o único distrito em que o RN tinha um candidato no segundo turno foi o 16º, graças a uma aliança local entre o partido de direita Os Republicanos (LR) e o RN, o que é algo inédito numa cidade que tem tradição de votar à esquerda – e o 16º distrito tem uma tradição de votar LR.

François Sétin, que vota no 16º há mais de 20 anos e é um leitor contumaz do LR, se disse surpreso com esta aliança e decidiu ir votar, junto com a sua família, no candidato governista do Juntos!, que concorria com o candidato LR-RN. “Nos sempre dizíamos que, se a direita não passasse no 16º, seria o fim, e desta vez nos deparamos com isso”, disse, decepcionado.

“Eu sou contra esta aliança, o RN não reflete nem um pouco os valores republicanos do LR. Aliás, eu até contesto o termo ‘extrema direita’ para o RN, porque acho que eles não têm nada a ver com a direita, são apenas extremistas”, afirma. Para ele, a dissolução da AN por Macron, que causou esta crise política, foi “um erro, uma heresia”.

A franco-argelina Barisa D., que também vota no 16º, conta que foi votar de manhã cedo e ficou inquieta ao ver a confusão das pessoas mais velhas ao verem o candidato do LR e do RN na mesma cédula. “Eu acho que eles ficaram confusos, porque têm o hábito de votar no LR, mas não no RN e não sabiam para quem votar, alguns pediam instruções aos mesários, tentando entender”, relata.

A franco-beninense K.L. votou contra o RN em Divonne-Les-Bains, uma cidade na fronteira da França com a Suíça, onde ela trabalha. Ela disse que ficou assustada e inquieta ao ver que, no primeiro turno, o candidato RN chegou empatado com o candidato governista na sua cidade. “Eu fiquei com medo principalmente por meus filhos, que são mestiços e binacionais. Fiquei pensando quem são as pessoas aqui nesta cidade, que tem tantos estrangeiros, que votam no RN. São provavelmente pessoas com quem eu cruzo diariamente”, explica.

Para esta eleição histórica, 30.000 policiais e gendarmes foram mobilizados em toda a França, incluindo 5.000 em Paris e seus subúrbios, segundo dados do Ministério do Interior.

Por precaução, a maioria das lojas da famosa avenida Champs Elysées preferiu fechar as suas portas e cobrir as vitrines de vidro com grandes pedaços de madeira, para impedir que manifestantes quebrassem as vitrines e invadissem as lojas. Os manifestantes de esquerda se reuniram na Praça da República, no 10º distrito de Paris, para celebrar o resultado inesperado da NFP.

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