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Entenda por que o Iêmen vive a pior crise humanitária do mundo

Afirmação é do secretário-geral da ONU, diante de guerra que tem impedido acesso de ajuda humanitária, deixando quase toda a população vulnerável

Nosso Mundo|Eugenio Goussinsky, do R7

Muitas crianças tiveram de deixar a escola
Muitas crianças tiveram de deixar a escola

Dos 27 milhões de habitantes no Iêmen, na África, 22 milhões necessitam com urgência de ajuda humanitária ou de proteção, entre eles crianças. Cerca de 500 mil delas já abandonaram a escola por causa dos bombardeios, tanto de houthis quanto da coalizão sulista apoiada pela Arábia Saudita. Além disso, há dois milhões de deslocados internos.

Desde que o atual conflito se iniciou, em março de 2015, pelo menos 10 mil pessoas morreram. Drones, mísseis e bombas fornecidos também pela Arábia Saudita (muitas delas compradas de potências ocidentais) deixaram a maioria das cidades isoladas. O colapso da saúde é geral, com os funcionários locais sem receber salários e falta de remédios e equipamentos.

Isso desencadeou surtos de cólera e difteria, em meio a tiroteios e bombardeios que destroem escolas, casas, hospitais. A ajuda humanitária também praticamente inexiste, com estradas bloqueadas e populações inteiras acuadas.

O ICRC (Comitê Internacional da Cruz Vermelha) descreveu item por item as condições precárias do país. Segundo a entidade, 80% da populaçao necessita de ajuda para sobreviver; 60% não tem o que comer; 58% não tem acesso a água potável; 52% tem acesso limitado a cuidados de saúde e 12% passa por grave desnutrição. Tal panorama fez o próprio secretário-geral da ONU (Organização das Nações Unidas), António Guterres, afirmar recentemente que o país passa pela "pior crise humanitária no mundo".


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O governo, estabelecido em Áden, já que a capital Sanaa foi tomada pelos rebeldes houthis, impôs um bloqueio comercial que impede que 70% da população iemenita, em condições altamente vulneráveis, tenha acesso a itens básicos, como alimentos e remédios. Assim que os houthis tomaram Sanna, o atual presidente Abd Rabbuh Mansur Al-Hadi deixou o país. Seis meses depois, porém, ele retornou a Áden.


Segundo Djoen Besselink, que até há pouco era coordenador-geral do MSF (Médicos Sem Fronteiras) no Iêmen, não há neste momento uma possibilidade de alguém levar uma vida normal no país. Ele deu depoimento ao site da entidade.

— Mesmo antes da guerra, o Iêmen era um dos países mais pobres do Oriente Médio. O país já era muito vulnerável. Agora a guerra está em toda parte, afetando todos os aspectos da vida das pessoas. Cidades e vilarejos foram destruídos. Muitas pessoas não receberam seus salários nos últimos 18 meses. Atendemos muitos pacientes com desnutrição e em situação de insegurança alimentar porque não se trata apenas de disponibilidade de alimentos, mas, sim, de poder de compra. Nas prateleiras dos mercados há itens a serem comprados, mas as pessoas simplesmente não podem pagar por eles. É uma situação desastrosa.


Iêmen dividido

O Iêmen é um país dividido desde sua origem, em 1990, quando o Iêmen do Norte, independente desde 1918, se juntou ao Iêmen do Sul, cuja independência foi obtida em 1967. Mas essa união sempre foi apenas formal porque, na prática, o novo país permaneceu um caldeirão de ódio e contrariedades, principalmente dos sulistas, moradores de regiões mais pobres.

A atual guerra civil do Iêmen, portanto, nada mais é do que uma continuidade dessa rivalidade, muitas vezes oprimida pelo governo centralizador e corrupto do ex-presidente Ali Abdullah Saleh. Ele havia sido presidente do Iêmen do Norte, de maioria houthi, e, na fusão, tomou o poder, com o vice sendo indicado pelos sulistas. Os houthis levam esse nome em homenagem ao líder da região, Hussein Badreddin al-Houthi, morto em setembro de 2004, por membros do exército iemenita.

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Veio então a Primavera Árabe, em 2011, com a exigência de mais democracia. Saleh foi deposto em um acordo, mas os houthis, que dominavam o Norte, ficaram insatisfeitos ao ver o poder se transferir para o sulista Abd Rabbuh Mansur Al-Hadi. E iniciaram uma ofensiva, tomando a capital Sanaa, o que forçou a transferência da sede do governo para Aden.

A Arábia Saudita, que sempre teve influência neste conflito, para evitar que o poder do Norte se intensificasse, entrou no conflito em apoio aos sulistas. O Irã, por sua vez, preocupado em não perder espaço na região, deu suporte aos rebeldes.

Em busca da paz

A ferocidade dos ataques aéreos foram tão grandes que, por exemplo, destruíram um hospital apoiado pela organização humanitária internacional MSF (Médicos Sem Fronteiras) em 2015. A prática se tornou recorrente durante esses anos, também por parte dos rebeldes houthis.

Uma das milhares de vítimas dessa guerra foi o próprio ex-presidente Saleh. Ele foi morto a tiros, em 4 de dezembro último, por rebeldes houthis, seus antigos aliados, acusado de ter feito um acordo com os Emirados Árabes e com os sauditas para se livrar das perseguições.

Nesta terça-feira (4), Guterres exortou os grupos em guerra a firmarem um acordo de paz. O enviado especial da ONU, Martin Griffiths, visitará os Emirados Árabes Unidos, Omã e a cidade de Áden, em busca de uma conciliação.

A comunidade internacional em geral reconhece Hadi como presidente do país, mas ele não pode retornar à sede do governo em Sanaa, dominada pelos rebeldes. Griffiths já conversou com ambos os lados da guerra.

A ONU organizou um Fundo Humanitário para o Iêmen que, há seis dias, recebeu uma doação de 930 milhões de dólares (R$ 3,1 bilhões) da Arábia Saudita e dos Emirados Árabes Unidos.

Em Genebra, Suíça, está sendo realizada conferência de doadores para tentar minimizar o drama dos iemenitas. Mas a secretária médica internacional de MSF, Mercedes Tatay, afirmou ao portal da entidade que tal iniciativa não é suficiente, já que ainda prevalece o bloqueio à chegada de ajuda em várias partes do país.

— Dinheiro por si só não é suficiente para atender às urgentes necessidades humanitárias no Iêmen. Os compromissos feitos hoje pelos países doadores são obviamente essenciais, mas devem ser complementados por ações muito mais robustas localmente. Pelo que nossos pacientes e nossas equipes locais nos dizem, a assistência humanitária ainda não está sendo acessada por muitas comunidades afetadas no Iêmen. 

Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Grupo Record.

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