Em Belo Horizonte, pressão das ruas só alterou tarifa de ônibus
Mobilização de 65 mil pessoas nas ruas provocou poucos efeitos práticos na cidade
Retrospectiva 2013|Enzo Menezes, do R7
Os protestos de junho, que chegaram a reunir 70 mil pessoas nas ruas de Belo Horizonte, provocaram poucas mudanças na capital mineira, além da redução do preço das passagens de ônibus.
O bilhete, que chegou a custar R$ 2,80 durante o primeiro semestre de 2013, recuou apenas R$0,05, em um primeiro momento, e, finalmente, foi fixado em R$ 2,65 pelo prefeito Marcio Lacerda (PSB) - valor cobrado antes do reajuste. No fim de junho, o governador Antonio Anastasia (PSDB) reduziu a tarifa do transporte metropolitano. Por causa do péssimo serviço, a empresa que fornecia os ônibus em Ribeirão das Neves, na Grande BH, foi trocada com a mobilização dos moradores.
Obras antigas e lembradas nos protestos, como a conclusão do Hospital do Barreiro (prometido para 2012 pela prefeitura), duplicação da BR-381, ampliação do metrô e revitalização do Anel Rodoviário (com recursos estaduais e federais) continuam atrasadas.
Contratos publicados, "caixa preta" fechada
A ocupação da Câmara Municipal de BH durante uma semana foi um dos fatos mais marcantes do período. A Assembleia Popular Horizontal foi criada por militantes de partidos de esquerda e estudantes para organizar as ações e estabelecer diálogos com a prefeitura. André Veloso, um dos integrantes da APH, reconhece os avanços ocorridos após intensa pressão.
— A população teve acesso a dados que antes das manifestações eram desconhecidos.
As planilhas com os custos dos itens que compõem as passagens permanecem sem divulgação. Ela apontará o lucro real dos empresários nos últimos quatro anos. A prefeitura prometeu divulgar os dados em outubro passado, mas ainda não publicou o resultado.
Falta de propostas claras
A diversidade de temas exigidos pela população que invadiu as ruas, mas sem uma pauta clara, pode ter atrapalhado ações práticas do poder público. Essa é a avaliação do cientista político Malco Camargos, da PUC Minas.
— Houve ganhos no transporte público, onde havia lideranças. Os demais temas, que foram colocados de maneira dispersa, sem pauta de negociação, não foram atendidos. Não tínhamos tradição de protestos e isso pegou a todos de surpresa.
Atos de vandalismo, para o pesquisador, surpreenderam até mesmo a polícia. A PM foi acusada por manifestantes de truculência durante os protestos, enquanto em outros casos havia a depredação de lojas sem reação policial.
— Houve a incapacidade das autoridades de lidar com a situação nova. Não acredito que a falta de ação da polícia, em alguns casos, e o excesso, em outros, tenha sido intencional. O custo para a PM e o Estado também foram altos.
Resposta da PM
Para o tenente-coronel Alberto Luiz, a Polícia Militar não foi surpreendida pelos protestos que tomaram as ruas da cidade.
— Como estratégia da corporação, é preciso sempre se preparar para o pior. Não posso dizer que fui surpreendido por isso [manifestações], tenho é que melhorar as estratégias para a atuação com eficácia.
A comandante de policiamento de BH, coronel Cláudia Romualdo, explica que os protestos durante a Copa das Confederações serviram como teste para a ação da polícia durante a Copa do Mundo.
— Cuidamos do planejamento para estarmos ainda mais qualificados no ano que vem. É preciso qualificar cada vez mais o policial, já que todos estarão envolvidos.
Ocupações por moradia
Famílias que não têm onde morar organizaram nos últimos meses uma série de protestos na luta por uma casa digna. As ocupações de terrenos públicos em curso na cidade [Rosa Leão, Esperança, Vitória, com 8.000 pessoas] ganharam visibilidade com os protestos de junho e forçam a entrada do tema na "agenda" da prefeitura.
Quem trabalha na tentativa do diálogo entre prefeitura e os sem-casa, no entanto, afirma que as negociações não avançam. O frei Gilvander Moreira, representante do movimento, critica a tentativa da prefeitura em criminalizar os sem-casa. Marcio Lacerda chegou a comparar protestos de rua com atos terroristas.
— É estupidez e covardia tratar um grave problema social como caso de polícia. Polícia é para criminoso. A saída para os sem-casa é ocupar, pois a mentirosa fila da habitação popular só cresce. A luta das ocupações contribui para a resolução do grave problema social que é a falta de moradia. Insistir em despejar piora mil vezes o problema, além de causar um caos social e de mobilidade em BH.