A luta de uma mulher para tentar provar a inocência do filho preso
"Lágrimas correm só de lembrar o que meu filho passou e ainda está passando", diz mãe de jovem negro condenado a mais de 15 anos
São Paulo|Kaique Dalapola, do R7
A vida da dona de casa Elisabeth Barcelos, 37 anos, mudou de rumo em outubro de 2016, quando seu filho mais velho foi preso. A mulher negra, moradora da periferia da zona norte de São Paulo, mãe de quatro filhos, passou a viver uma luta para tentar provar a inocência do jovem de 21 anos.
O filho de Elisabeth, o ajudante geral Igor Barcelos Ortega, foi baleado e preso acusado de ter participado de um roubo e uma suposta tentativa de latrocínio em Guarulhos (Grande SP), em 2 de outubro de 2016.
Oito meses depois, o jovem foi condenado a 15 anos e seis meses de prisão pelo roubo do carro e o celular de um vendedor, e supostamente tentar roubar e matar um soldado da Polícia Militar. De acordo com Elisabeth, Igor estava a 16 km do local no horário em que aconteceu o crime contra o PM.
Imagens de câmera de segurança, a quantidade de tiros disparados pelo policial e o não reconhecimento do jovem pelo militar são os argumentos da defesa do rapaz. Contra Igor pesa o reconhecimento feito pela vítima do roubo.
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"Antes da prisão, éramos uma família feliz. Hoje, dentro de mim só tem tristeza e mágoas. Todo sofrimento que vi ele passando no hospital, na delegacia e na prisão, está na minha lembrança. E não tem como evitar, as lágrimas correm só de lembrar o que meu filho passou e ainda está passando sem ter feito nada."
Ao longo deste um ano e cinco meses que Igor está preso, a mãe se recorda de todos contatos que tiveram. A saga para ver o rapaz começou ainda no Hospital São Luiz Gonzaga, no Jaçanã (zona norte de São Paulo), mas não teve sucesso. Conseguiu ver, pela primeira vez depois do ocorrido, no 7º DP de Guarulhos e, depois, no 1º DP da cidade.
Elisabeth ainda visitou o filho, por oito meses, no CDP 1 (Centro de Detenção Provisória) de Guarulhos e três meses no CDP de Osasco (Grande SP), antes da transferência para a Penitenciária de Irapuru (interior paulista), em outubro de 2017.
A mãe destaca que as dificuldades para ver o filho têm causado grandes problemas. "Essa prisão acabou com a minha vida. Já não tenho mais saúde, estou com começo de depressão. Os meus sonhos e os sonhos dele foram destruídos. Enquanto ele não sair, a minha vida vai se acabando a cada dia."
No presídio que fica aproximadamente 630 km da capital paulista, os desafios para Elisabeth ver o filho se tornaram ainda maiores. "Por eu estar sem trabalho, tenho que pedir ajuda para comprar o jumbo [kit de alimentos], pagar as passagens e pousada para visitar", explica.
Antes de entrar no presídio%2C me sinto agoniada por saber que ele está ali e não vai voltar comigo
Quando consegue ajuda financeira suficiente para ir à Irapuru (o que aconteceu quatro vezes), passa em torno de 12 horas da saída de casa até chegar na cidade do presídio.
Nos finais de semana de visita, a rotina é sempre parecida. Pela manhã da sexta-feira, ela prepara a comida para levar ao filho e sai de casa em torno das 15h, tendo como primeiro destino a Estação Carandiru (Linha 1-Azul do Metrô), de onde sai um ônibus às 19h30.
Por volta das 4h30 do sábado está na cidade do interior paulista. Começa, então, a arrumar o jumbo, toma banho e vai para a porta da cadeia. Precisa pegar senha com funcionários do presídio às 6h, para entrar entre 10h e 11h30.
"Antes de entrar no presídio, me sinto agoniada por saber que ele está ali e não vai voltar comigo. Quando entro, é uma alegria imensa: ele me beija, abraça, pega a comida."
No domingo, visita novamente e fica com o filho até às 14h. Logo quando sai do presídio, o ônibus pega todos famíliares visitantes na porta da penitenciária rumo à São Paulo.
Por volta da meia-noite o ônibus está na Estação Carandiru e, 1h de segunda-feira, Elisabeth está em casa. "Quando chego, choro e bate um desespero por lembrar que fui ver meu filho e o deixei mais uma vez naquele lugar."
Durante o período de privação de liberdade do filho, Elisabeth conseguiu imagens de câmera de segurança que mostram possivelmente o filho sendo baleado e contratou um perito criminal que destacou diversos pontos que podem indicar a inocência do ajudante geral. Esses pontos foram noticiados à época pelo R7.
Elisabeth ainda tem organizado, com apoio de familiares, amigos e movimentos negros, manifestações pedindo a liberdade do rapaz. O último protesto aconteceu na segunda-feira (5), e outro deve acontecer nesta quinta-feira (8), Dia Internacional da Mulher, na Praça da Sé (centro de São Paulo), enquanto apelação que pode colocar o rapaz em liberdade é julgada.
Deste julgamento, a mulher espera ganhar o presente: "Só quero a liberdade do meu filho para, junto com todos aqueles que batalharam e estiveram comigo nessa luta, irmos à rua e dizer que a justiça foi feita".