Entenda o que está em jogo na reforma da previdência de SP
Segundo a prefeitura, há um déficit previdenciário de R$ 4,7 bilhões. Servidores contestam e TCM diz que órgão não realizou estudo com cálculos
São Paulo|Fabíola Perez, do R7
A gestão do atual prefeito João Doria (PSDB) trabalha para encontrar soluções para o que considera o atual grande dilema das contas públicas da cidade de São Paulo: a falta de recursos para o pagamento de pensões e aposentadoria aos servidores municipais.
De acordo com a Prefeitura de São Paulo, o orçamento pode ser comprometido por gastos obrigatórios em cerca de sete anos. Segundo o órgão, o rombo nas contas da previdência em 2017 foi de R$ 4,7 bilhões. Para se ter ideia, segundo as contas do órgão, o valor do prejuízo é três vezes maior do que o valor utilizado para investimento de R$ 1,3 bilhão.
De acordo com as contas da prefeitura, o rombo pode chegar a R$ 8,4 bilhões até 2020. Para solucionar o problema, a gestão tenta fazer avançar nas votações da Câmara Municipal um projeto de lei que propõe o aumento da contribuição para servidores de 11% para 14%. Além disso, prevê a criação de uma nova previdência pública com contas individuais para cada novo funcionário e um sistema complementar para quem ganha acima do teto da aposentadoria, de R$ 5.645,80 do INSS.
Protesto na Câmara de SP tem confronto e deixa servidores feridos
Até hoje, o projeto de lei passou pela Comissão de Constituição, Justiça e Legislação Participativa (CCJ) da Câmara, entre os dias 14 e 15 de março. A previsão da Casa é de que passe ainda por mais três comissões, de Administração Pública, Saúde, Promoção Social, Trabalho e Mulher e de Finanças e Orçamento. Depois disso, precisa passar por duas votações no plenário para chegar à sanção ou não do prefeito.
O secretário de Gestão Paulo Uebel afirmou que se nada for feito existe a possibilidade de, em alguns anos, a prefeitura não conseguir pagar o salário ou a previdência do servidor municipal. “Essa é uma situação extrema, mas se nada for feito, a Prefeitura poderá enfrentar esse cenário e nós não queremos”, disse ao R7.
Para o professor de direito trabalhista da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Jorge Boucinhas, algum tipo de mudança previdenciária precisa ocorrer para reduzir o déficit. “As contas públicas caminham hoje em um ritmo difícil de se sustentar. Mas ao mesmo tempo, as mudanças propostas devem demorar para trazer o efeito esperado”, explica.
Cálculos da prefeitura, obtidos a partir de um levantamento com cada uma das secretarias responsáveis pelas áreas, apontam que o valor atual do déficit seria equivalente a manter 350 mil crianças em creches durante um ano, construir 2.350 unidades básicas de saúde, comprar e equipar 50.537 viaturas da Guarda Civil Metropolitana e construir 30.322 moradias para o Programa Minha Casa Minha Vida.
O que diz o TCM
O Tribunal de Contas do Município de São Paulo, no entanto, publicou no dia 22 de março um relatório elaborado pela Comissão de Avaliação e Estudos Previdenciários apontando falhas técnicas e jurídica no projeto de lei. “Ressalta-se que o PL 621/16 sofreu grandes mudanças na forma apresentada pelo executivo em dezembro de 2017 e, novamente, foi transfigurado pela CCJ, sem que os estudos correspondentes tenham sido apresentados.”
O órgão afirma que o aumento da contribuição previdenciária deve ser justificado em estudos que demonstrem a necessidade do aumento. Além disso, o TCM afirma que a proposta se baseia em um “cenário incerto”, uma vez que a reforma previdenciária federal teve a tramitação suspensa em razão da intervenção federal no Rio de Janeiro.
Para o TCM, a reforma da previdência federal impacta no cenário municipal. “As mudanças, se aprovadas, alteram significativamente o déficit da previdência municipal, o que fragiliza a argumentação do Executivo em favor do PL 621.” O órgão considera que o aumento da contribuição somado ao aumento suplementar representaria um aumento confiscatório, ou seja, inadequadamente exercido.
“Em momento nenhum a prefeitura apresentou um estudo sobre as causas do déficit previdenciário e, portanto, não é possível, neste momento, que se possa fazer qualquer repartição sem que se provoque injustiças.”
Servidores
O diretor do Sindicato de Servidores Públicos Municipais de São Paulo João Batista Gomes afirma que os servidores não reconhecem a necessidade da reforma previdenciária municipal. “A prefeitura parte de uma premissa falsa de que há um rombo e de que o prejuízo deve ser dos servidores.”
“Até 2005, quem pagava o custo da aposentadoria por força da lei era o poder municipal”, afirma. “Não entendemos que há um déficit.” O diretor diz ainda os servidores tiveram acesso ao projeto somente quando já estava na Câmara Municipal. “Não houve negociação, nem a discussão necessária com os servidores”, diz Gomes. “Não podemos arcar com um custo que não é nosso”, afirma.
Em função disso, uma série de manifestações contrárias ao avanço do projeto de lei, organizadas por servidores municipais, vem ocorrendo na cidade de São Paulo.