Especialistas apontam que método em Brumadinho é barato e inseguro
Vale emprega alteamento por montante em mina do Córrego do Feijão. Barragem se rompeu na sexta-feira (25) e deixou pelo menos 60 mortos
São Paulo|Plínio Aguiar, do R7
O rompimento da barragem na mina Córrego do Feijão, na cidade mineira de Brumadinho, na sexta-feira (25), que deixou pelo menos 60 mortos e 292 desaparecidos, traz à tona uma discussão sobre o método utilizado nas barragens brasileiras. Especialistas ouvidos pela reportagem do R7 apontam que o uso do alteamento por montante é mais barato para as empresas, no entanto, é mais inseguro.
Geração de energia elétrica, abastecimento de água, regularização de cheias de rios e armazenamento de rejeitos são as quatro finalidades das barragens brasileiras. Esta última, por sua vez, possui três métodos: a montante, linha de centro e jusante — a barragem 1, em Brumadinho, usava o primeiro tipo. Seu funcionamento se dá da seguinte forma: deposita-se os rejeitos em camadas, produzindo o alteamento da barragem conforme aumenta o volume do material.
Durante o processo de construção da barragem, utiliza-se, então, rejeitos para construir uma nova. “O que é perigoso, porque está alicerçada em uma barragem de rejeito, que é de resistência baixa”, avalia Paulo Afonso Luz, professor de engenharia de geotécnica da Universidade Presbiteriana Mackenzie e da Fundação Armando Álvares Penteado . “Logo facilita a ruptura dessa barragem por liquefação, como se fosse uma avalanche.”
“O sistema que é usado no Córrego do Feijão, por exemplo, é mais barato e também mais inseguro, apesar de estar desativada”, aponta o professor. “Antes de romper, a estrutura mostra sinais de que pode estar danificada”, aponta. O especialista exemplifica: “manchas, trincas, fissuras, afundamentos, entre outros”. No final do segundo semestre do ano passado, a mineradora contratou uma empresa para realizar a vistoria do lugar, que foi, posteriormente, aprovada e consta situação regular.
O presidente do PROAM (Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental), Carlos Bocuhy, concorda com o professor. “É totalmente desaconselhável o uso de montante em uma barragem”, avalia. “É um modo de tecnologia antigo, que não é muito usado porque justamente pode desencadear em desastres naturais como este”.
O local da barragem, para o presidente do PROAM também é alvo de questionamento. “Não se pode permitir a construção de uma barragem em um local inadequado. A visão do processo é tão inadequada que até o refeitório da empresa, localizado embaixo da barragem, foi destruído”, diz.
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Soluções
A mineração representa quase 10% do PIB de Minas Gerais, que é o Estado responsável por mais da metade da produção de minerais do país. De acordo com a FEAM (Fundação Estadual do Meio Ambiente), existem cadastradas 661 estruturas, entre barragens de contenção de rejeitos, resíduos e reservatórios de água. Desse total, 373 pertencem a minerações e 233, a indústrias. O órgão aponta que 31%, ou 187 estruturas, apresentam alto potencial de dano ambiental, enquanto que 41% (251) de nível médio e 28% (168), de baixo potencial.
O certo e ético, segundo Luz, é o modo por jusante. “O ideal é fazer a construção de uma nova barragem pelo lado de fora, porque aí tem-se uma nova estrutura e que não fique apoiada e danifique outra”, relata. Este modo gasta mais volume de terra em sua estrutura, portanto, é muito mais caro que a por montante. “De quatro a cinco vezes mais”, diz o professor. “Mas não compensa esse modo, porque no final é uma economia bastante perigosa”.
Nesta segunda-feira (28), o PROAM representou na Procuradoria-Geral da República um documento que requer a eficácia e participativa do licenciamento ambiental, bem como uma criteriosa avaliação de riscos e contínuo monitoramento das barragens de rejeitos pré-existentes, desocupação das áreas de risco e descomissionamento das barragens inseguras. O instituto também recomendou a criação de um super fundo, por meio de iniciativa do Governo Federal, com recursos advindos das atividades minerárias, setor cujos empreendimentos e atividades têm apresentado alto risco às vidas humanas e ao ambiente.
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Comissão das Barragens
Logo após a tragédia em Mariana, onde 19 pessoas morreram, em 2015, foi criada a Comissão Extraordinária das Barragens na Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Um dos projetos apresentados se tornou a lei 22.796, de 2017, que alterou a destinação dos recursos gerados pela TFRM (Taxa de Controle, Monitoramento e Fiscalização das Atividades de Pesquisa, Lavra, Exploração e Aproveitamento de Recursos Minerários).
Agora, 100% dos recursos reforçam as atividades de fiscalização ambiental. No entanto, diversos artigos ainda não foram aprovados, como a proibição de instalação de barragem destinada à acumulação ou à disposição final ou temporária de rejeitos pelo método de alteamento a montante.