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Evento internacional em SP discute racismo e desafios do povo negro

1º Encontro Internacional da Coalizão Negra por Direitos ocorre nesta sexta-feira e sábado, com convidados de todo Brasil e outros quatro países

São Paulo|Guilherme Padin, do R7

Evento acontece nos dias 29 (sexta-feira) e 30 (sábado)
Evento acontece nos dias 29 (sexta-feira) e 30 (sábado)

O mês da consciência negra se encerrará, em São Paulo, com um evento de dois dias para discutir o racismo e desafios da população negra no Brasil e no mundo. O 1º Encontro Internacional da Coalizão Negra por Diretos ocorre nesta sexta-feira (29) e sábado (30), com mesas e rodas de discussões e convidados de Equador, Colômbia, África do Sul e Estados Unidos.

O objetivo dos encontros, que, segundo a organização, devem receber mais de 1.000 pessoas, é reunir lideranças das organizações do movimento negro brasileiro que têm promovido ações conjuntas para influenciar o legislativo e assegurar os direitos humanos da população negra no Brasil.

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De acordo com Douglas Belchior, professor de História, militante do movimento negro há mais de 20 anos e representante da Coalizão Negra por Direitos, este encontro será “uma reunião de diversos grupos, coletivos, entidades, organizações do movimento negro brasileiro, em diversos estados do Brasil, em todas as regiões do país”.

A Coalizão, de acordo com ele, “não é uma nova organização ou novo coletivo. É uma articulação, uma grande aliança nacional, que visa tornar mais forte a incidência e força política do movimento negro, no sentido de fazer nossas demandas, nossas denúncias, nossas propostas e nossa elaboração política serem ouvidas. Somos um espaço de potencialização de movimento [negro]”.


Coordenador da Uneafro Brasil, organização de combate ao racismo através da educação, com núcleos de educação popular nas periferias de São Paulo, Douglas defende que nunca a questão racial foi pauta prioritária na sociedade brasileira.

“Nunca discutimos isso. Temos um acerto de contas histórico a ser feito com a sociedade e a população negra que é a maior parte da população brasileira. É preciso lembrar que o Brasil é um país fruto de quase 400 anos de uma escravidão perversa, cruel... de séculos de estupro das mulheres negras, de violação, da tortura, de assassinato, e que toda riqueza e construção nacional se deve a esse período tão trágico da nossa história”, afirma ele, que será mediador em uma das mesas de debate que ocorrerão no sábado (30).


Encontros acontecem no centro de São Paulo
Encontros acontecem no centro de São Paulo

Belchior enxerga na intervenção de maneira unificada uma forma mais efetiva de combate ao racismo: “Justamente para demonstrar a força que temos e exercer o papel da representação da maioria, que é isso que nós somos: um movimento político negro organizado no campo progressista, no campo da defesa de direitos humanos. É o setor porta-voz da maioria do povo brasileiro, que é negro.”

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Embora entenda que o racismo seja debatido mais vezes recentemente, o professor avalia que não é correto dizer que a sociedade brasileira está mais receptiva em relação às pautas do movimento negro.

“Há um debate maior porque há um levante das organizações negras no sentido de se rebelar, resistir, denunciar o racismo e exigir direitos em relação a oportunidades, trabalho, renda, usufruir de espaços que eram ilhas de privilégio branco. Ainda há uma insensibilidade profunda da sociedade em relação a como o racismo opera no cotidiano da vida do povo brasileiro”, argumenta ele, que completa: “O que há, na verdade, é uma retomada do orgulho do povo negro, da sua identidade racial. É muito poderoso, muito bonito, muito importante.”

Na semana da nomeação do jornalista Sérgio Camargo como presidente da Fundação Cultural Palmares, que tem como um de seus preceitos “promover a preservação dos valores culturais, sociais e econômicos decorrentes da influência negra na formação da sociedade brasileira”, o ativista faz uma crítica à escolha.

“Ele (Sérgio) nega a existência do racismo no Brasil, fala isso com a boca cheia e todas as letras, e diz que é preciso acabar com o movimento negro. É muitíssimo grave ter nesse espaço alguém que nega algo que é inegável. É um debate ultrapassado. O Brasil é um país que sofre com o racismo. As teses que contestam isso não são sérias. Há racismo no Brasil, há violência racial, há diferenças estruturais entre as populações negras e não negras”, diz Douglas, que completa:

“É fundamental a organização do movimento negro no Brasil. Querem que a gente acredite que o racismo não existe.”

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Douglas estende críticas às políticas de segurança pública estaduais e nacional. “São trágicas pro povo negro brasileiro. Porque reafirma a lógica de militarização de suas ações e de papel violento e repressivo das polícias, e regulador do sistema judiciário, penal e carcerário, como um espaço de aprisionamento de pobres e sobretudo de negros”, argumenta ele, que ressalta os números da mortalidade da população negra brasileira:

“Tem índices de mortalidade absurdos, comparados a guerras mundo afora. Morrem negros no Brasil numa proporção única no planeta. O Brasil é o país onde mais negros são assassinados. A cada 23 minutos um jovem negro é morto violentamente no país. O papel dos estados nisso é fundamental. Porque se por um lado há um caos de segurança pública que gera inúmeros índices de violência, por outro lado os estados são responsáveis diretos pelas mortes que suas polícias promovem. A polícia brasileira é das mais violentas e que mais mata negros no mundo. Numa proporção muito maior que a média mundial.”

“O racismo é determinante, sobretudo, para a morte de pessoas negras no Brasil”, completa Douglas, que acredita que “o movimento negro vai cumprir seu papel histórico, pressionando, avançando na organização e exigindo que o Estado seja utilizado enquanto espaço de poder como um instrumento de elaboração de direitos, de leis e regulações que garantam direitos sociais que tentem regular essa desigualdade tão absurda e tão drástica para o povo negro”.

O evento

Os debates na sexta-feira (29) começam com as mesas “Desafios do enfrentamento ao racismo hoje”, às 9h, e “Conjuntura Nacional, Internacional e Resistência Diaspórica”, às 10h.

Durante a tarde, às 14h, ocorrem as rodas de conversa com os temas “Terras, território e moradia – segregação espacial e cidadania nega”, “Encarceramento e política de drogas” e “Saúde da população negra”. O dia é fechado às 16h, com mais três rodas de conversa: “Racismo religioso”, “Feminicídio, LGBTfobia e a luta por garantia do direito à vida” e “Educação e a população negra”.

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O segundo e último dia do encontro terá as mesas “Resistências à violência do Estado e ao genocídio negro: extermínio, encarceramento, pacote Moro”, às 9h, e “Disputa de poder institucional e incidência política”.

Os dois dias de evento ocorrem na Rua Álvaro de Carvalho, 427 - Bela Vista, em São Paulo (SP). Para mais informações, basta acessar o site da Coalizão.

A Coalizão

Em outubro, Coalizão levou carta do movimento negro ao Congresso Nacional
Em outubro, Coalizão levou carta do movimento negro ao Congresso Nacional

Criada em março de 2019, a Coalizão Negra por Direitos é uma reunião de entidades do movimento negro por todo o Brasil para a dar força política às suas pautas no Congresso Nacional e em fóruns internacionais.

Dezenas de entidades participam e promovem ações em conjunto na Coalizão, como o Geledés – Instituto da Mulher Negra, MNU (Movimento Negro Unificado), Ceert (Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades) e Frente Favela Brasil.

“São organizações no campo da educação, do enfrentamento ao racismo na juventude, há grupos de mulheres negras, acadêmicos, intelectuais, coletivos que se organizam a partir de religiões de matriz africana; na defesa da saúde da população negra, da população quilombola, comunidades ribeirinhas, pesqueiras... é uma diversidade de entidades do movimento negro que se organizam para lutar por direitos humanos para nossa população e para enfrentar o racismo”, relata Douglas.

O professor de História afirma que o racismo “não é hegemônico na sociedade brasileira. Pode até parecer, mas não é. Convivemos em comunidades, em bairros pobres, e sabemos que lá os valores fundamentais são de solidariedade, comunhão, partilha, afeto, cuidado. Valores intrínsecos aos direitos humanos, ao respeito”.

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