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Rombo causado pela máfia do ISS em SP pode ser muito maior do que R$ 500 milhões

Promotoria admite filtros na tentativa de desmascarar grupo de fiscais corruptos

São Paulo|Thiago de Araújo, do R7

Promotor Roberto Bodini teve dificuldades durante investigações
Promotor Roberto Bodini teve dificuldades durante investigações Promotor Roberto Bodini teve dificuldades durante investigações (HELVIO ROMERO/ESTADÃO CONTEÚDO)

A estimativa de um prejuízo aos cofres públicos de até R$ 500 milhões, causado pela máfia do ISS (Imposto sobre Serviços) na Prefeitura de São Paulo entre outubro de 2010 e 2012, pode ser pequena diante do recorte feito pela investigação do MPE (Ministério Público Estadual). O fato foi admitido pelo promotor Roberto Bodini, que explicou ainda que a falta de informações precisas e outras limitações devem impedir uma descoberta de 100% das ações do grupo.

A lista de 652 prédios entregues na cidade durante esse período, com a qual a investigação trabalha, é apenas um filtro do total de empreendimentos construídos e fiscalizados na capital paulista durante os anos em que o grupo formado pelos auditores Ronilson Bezerra Rodrigues, Eduardo Horle Barcellos, Carlos di Lallo Leite do Amaral (os três libertados na semana passada) e Luis Alexandre Cardoso Magalhães (que colaborou com as investigações em troca da delação premiada e também está solto) atuava na Secretaria Municipal de Finanças.

Com base em dois recortes — imóveis com imposto devido superior a R$ 2 milhões e desconto concedido superior a 60% do ISS —, a investigação chegou a 652 prédios. Entretanto, o próprio promotor admite que o número pode ser muito maior. Bodini comentou, em conversa na qual o R7 estava presente, parte das dificuldades de levantamento dos dados.

— O arquivo [dos imóveis enviados pela prefeitura] não abria. Não sei quantos imóveis eram. Devolvi a mídia para a prefeitura (...). Cheguei na época da parceria com a CGM (Controladoria Geral do Município), com o [controlador-geral] Mário Spinelli, e disse a ele que seria impossível analisar tudo isso. O cara [Magalhães] só fazia isso, das 6h às 18h, então passava 30, 40 imóveis por dia. Eles [grupo] analisavam o ISS de toda a cidade de São Paulo, imagina o tamanho. Fizemos um corte, no qual conseguíssemos uma lista dos empreendimentos.

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Bodini completa:

— Então pedi na prefeitura e imagina, durante 2010, 2011 e 2012, são três anos, o arquivo não abria pelo tamanho, era um negócio gigantesco. Evidentemente a gente não tinha a pretensão [de analisar tudo]. Pedi para prefeitura me mandar com um valor de corte. Não me recordo qual foi o valor na época, se foi PGV (Planta Genérica de Valores) de R$ 30 milhões, R$ 40 milhões, não me lembro. Não sei se só alto padrão, mas estipulamos um valor e foi de onde tivemos essa lista.

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Além de Luis Alexandre Cardoso Magalhães, Carlos di Lallo Leite do Amaral realizava diariamente as análises dos impostos devidos pelos imóveis de toda a capital. O fato de todos os registros funcionais de cada avaliação predial saírem com o nome de Lallo também dificultou o levantamento completo de quantos imóveis, mais precisamente o número de SPEs (Sociedades de Propósitos Específicos) — empresas constituídas apenas para a realização de um único empreendimento e que ficam vinculadas ao CNPJ das grandes incorporadoras — que poderiam estar envolvidos no esquema de corrupção.

— Nessa lista, apesar de trabalharem o Luis Alexandre e outros auditores, [todos] eles eram chefiados pelo Lallo, e ele propositadamente ou não, colocava o registro funcional dele nas análises feitas por todos do setor. Por isso, esse número [de imóveis] tão absurdo. Então, em relação a determinado imóvel, eu tenho o documento da prefeitura, e nele existe o registro funcional do Luis Alexandre. Aí pego esse mesmo imóvel, e quando peço a lista ele sai com o nome do Lallo. Existe uma incongruência aqui, então me foi dito que, como ele era chefe do setor, ele colocava o registro dele ali. De propósito? Não sei. É igual uma empresa que precisa de certificação digital. Tudo que passa pela empresa vai entrar a certificação digital de determinado funcionário, por uma questão legal.

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Tanto o MPE quanto a CGM admite um prejuízo de "pelo menos R$ 200 milhões" até o momento, mas acreditam que o rombo pode chegar a R$ 500 milhões, levando em conta o período em que os auditores atuavam na fiscalização de obras na capital, que data na maioria dos casos de 2006 e 2007. A dificuldade de mensurar o rombo total não passa apenas pelo recorte dos imóveis que podem estar envolvidos, mas também com o sistema anterior a outubro de 2010, no qual o auditor responsável não está identificado.

— Tem um depósito bancário da ALP [empresa que Magalhães usaria para receber propina] em data anterior e eu não consigo ligar a emissão do certificado [de quitação do ISS] com o depósito porque eu não sei se tem a ver. Hoje eu posso chegar lá e falar o seguinte: "Me dá a documentação desse empreendimento, tudo mais". Antes não podia, ia levantar a lebre da investigação. Antes de outubro de 2010, eu não sei sequer quem é o responsável pela fiscalização. Dali para frente tem essa obrigatoriedade.

A probabilidade de o prejuízo aos cofres públicos ser ainda mais estarrecedor vem com os fortes indícios, já admitidos pela Prefeitura de São Paulo e pelo MPE, de que o grupo também fraudava o IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano). Todos os quatro servidores estão afastados de suas funções no governo municipal, assim como pelo menos outros dois citados durante as investigações — Amilcar José Cançado Lemos e Leonardo Leal Dias da Silva — foram afastados, enquanto Fábio Camargo Remesso e Paula Sayuri Nagamati foram exonerados.

Réus foram "avisados" de que esquema não seria esgotado

Durante entrevista coletiva na última sexta-feira (8), o promotor Roberto Bodini afirmou que os três dos quatro auditores que ficaram presos preventivamente até a semana passada foram avisados de que seria "impossível" esgotar o tamanho total do esquema de corrupção ao qual eles são ligados pela Promotoria. Nem mesmo assim o promotor obteve maiores colaborações por parte dos servidores.

— Quando fui ouvir o Ronilson e o Barcellos, eu disse aos advogados que não daria para esgotar todas as situações envolvidas no caso. É muita coisa, muito complexo. Fizemos um apanhado para ver a postura deles, [então] não deu para perguntar tudo.

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A possibilidade de que o ex-prefeito Gilberto Kassab e o seu secretário de Finanças, Mauro Ricardo Costa, sejam ouvidos segue muito alta, embora não exista uma data para que isso aconteça. Bodini deve cobrar explicações de ambos, por conta de uma gravação na qual Ronilson diz que a dupla "sabia de tudo". Antes disso ocorrer, a investigação precisa avançar, segundo o promotor.

— Concordo com a necessidade de explicação. Mas aí, vamos voltar, preciso saber o que é o tudo. Quando apurar isso, vamos chamar [Kassab e Costa], para pelo menos no âmbito administrativo, no ramo da improbidade, dizer que houve omissão. Agora a nossa investigação é de natureza criminal. Não temos nenhum interesse de caráter político.

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