Saúde Poliomielite: cidades sorteiam até bicicletas para incentivar crianças a tomar vacina

Poliomielite: cidades sorteiam até bicicletas para incentivar crianças a tomar vacina

Prefeituras estão usando estratégias para aumentar a cobertura vacinal contra a doença; a meta de imunização é de 95% do público-alvo, mas está em 70%

Agência Estado

Resumindo a Notícia

  • Cidades sorteiam bicicletas e ingressos de circo para crianças que tomaram a vacina da pólio
  • As estratégias pretendem aumentar a cobertura vacinal contra a doença
  • A meta de imunização é de 95% do público-alvo, mas está em 70%
  • Na capital paulista, a vacinação contra a pólio foi prorrogada por prazo indeterminado
Campanha Dose Premiada, de Diamantino (MT), sorteou bicicletas para as crianças vacinadas

Campanha Dose Premiada, de Diamantino (MT), sorteou bicicletas para as crianças vacinadas

Reprodução / Prefeitura Municipal de Diamantino do Estado de Mato Grosso

Busca de não vacinados pelo aplicativo WhatsApp, distribuição de ingressos para circo e até sorteio de bicicletas estão entre as estratégias de prefeituras de vários estados do Brasil para ampliar a cobertura vacinal contra a poliomielite.

Até a última terça-feira (25), o índice de vacinação estava em 70%, quando o ideal é imunizar 95% das crianças com menos de 5 anos. Falta vacinar 3,4 milhões nessa faixa etária em todo o país, segundo o Ministério da Saúde.

O esforço na procura pelos não vacinados se justifica. Em 2020, a Opas (Organização Pan-Americana de Saúde) classificou o Brasil como local de risco de reintrodução da doença — também chamada de paralisia infantil —, que havia sido erradicada no início da década de 1990. A partir de 2021, a classificação subiu para "de alto risco", o que pôs o país em alerta máximo.

De acordo com o Ministério da Saúde, foram vacinadas até ontem 8,1 milhões de crianças, de um total de 11,5 milhões que compõem o público-alvo. O imunizante, informou a pasta, continua disponível nos postos de saúde de todo o país, mesmo com o fim da campanha nacional, em setembro. Algumas cidades mantêm a mobilização.

Os estados que mais vacinaram até agora foram Amapá (95,88% do público-alvo), Pernambuco (86,15%) e Alagoas (83,53%). Os que tiveram menor cobertura são Acre (38,65%), Roraima (41,15%) e Rio de Janeiro (45,24%).

Na capital fluminense, a aplicação de doses mais que dobrou depois que a prefeitura deu início à busca ativa de crianças não vacinadas, em que são usados inclusive os grupos de WhatsApp dos profissionais de saúde.

Conforme o secretário de Saúde, Daniel Soranz, a média diária subiu de 750 para 1.600 doses aplicadas. "Ainda temos 130 mil crianças desprotegidas. Além das doses previstas no esquema regular, estamos aplicando mais uma dose de reforço em crianças de 1 a 4 anos. Pedimos aos pais que levem essas crianças ao posto", disse.

Enquanto o estado do Rio tinha menos da metade do público-alvo vacinado até terça, a capital estava com 55,20% das crianças imunizadas, segundo a prefeitura. Foram aplicadas 174 mil doses, mas a meta é atingir 300 mil crianças (95% do público-alvo).

Além de usarem as redes sociais, equipes das clínicas da família e centros municipais de saúde estão indo à casa dos moradores. As unidades de atenção básica estão funcionando também aos sábados, das 8h às 12h.

Na capital paulista, a campanha foi prorrogada por prazo indeterminado, informou nesta terça-feira (25) a Secretaria Municipal de Saúde. Além da vacina da pólio, para crianças de 1 a 4 anos e 11 meses, serão aplicadas doses contra outras doenças que fazem parte da campanha de multivacinação de crianças e adolescentes de até 15 anos.

Desde o início da campanha, em 8 de agosto, foram aplicadas 1,4 milhão de doses, sendo 352 mil contra a poliomielite e 1,1 milhão de outros 15 imunizantes.

No caso da pólio, a cobertura está em 79,2%, abaixo da meta, de 95%. "A prorrogação é mais uma oportunidade àqueles que ainda não receberam a dose de reforço contra a poliomielite. Vamos prosseguir também com os esforços para a atualização das carteirinhas com os demais imunizantes do calendário nacional", disse o coordenador de Vigilância em Saúde da capital, Luiz Artur Caldeira.

No Estado de São Paulo, com cobertura de 64,70%, as prefeituras vêm intensificando as ações para atrair os não vacinados. A Secretaria Estadual de Saúde informou que, independentemente de campanhas, a vacina contra a pólio está disponível nos postos de forma permanente, conforme o calendário nacional de vacinação definido pelo ministério.

Sorteios

Em Araçatuba, no interior de São Paulo, foi usado um carro volante para a busca ativa de não vacinados nos bairros mais distantes. Além disso, a prefeitura fez parceria com um circo para distribuir ingressos aos menores de 5 anos que tomaram a vacina. Na cidade, 7.752 crianças foram imunizadas, índice de 88%.

Em Presidente Prudente (SP), as crianças levadas para tomar a vacina ganharam cupons para concorrer a sorteios de bicicleta. "Estamos todos preocupados, pois temos mais de 10 mil crianças no público-alvo, e ainda faltam muitas para serem vacinadas", disse a supervisora da Vigilância Epidemiológica, Elaine Bertacco.

O sorteio de bicicletas também foi o recurso adotado em Paranavaí, no interior do Paraná, em Aparecida do Taboado (MS) e em Diamantino (MT).

"A campanha Dose Premiada é uma forma de estimular os pais a procurar a unidade de saúde, onde são alertados sobre os riscos da pólio e de outras doenças que podem ser evitadas com a vacinação", disse a secretária de Saúde da cidade mato-grossense, Marineze Meira.

Em Goiânia, Hellena Rebeka Santos Barbosa, de 5 anos, ganhou uma "recompensa" após ter tomado as gotinhas no dia 8 de outubro. A prefeitura da capital goiana, em parceria com o Sesi (Serviço Social da Indústria), distribuiu entradas para o parque mantido pela instituição no Dia da Crianças.

"Ela aproveitou o dia de sol na piscina e pôde participar de jogos e brincadeiras, além de receber alimentação. Foi a primeira vez que ela foi a um clube, e ela amou", disse a mãe de Hellena, Kenya Rodrigues Barbosa.

Para tentarem atrair as famílias, algumas cidades adotaram horários alternativos. Em Chapecó (SC), no Corujão da Vacinação, as doses são aplicadas no período das 18h às 21h30. Conforme o secretário de Saúde, Jader Danielli, o objetivo é atender os pais que trabalham e não conseguem levar os filhos para se vacinar durante o dia.

Em Santa Catarina, que tem 82,26% de cobertura vacinal, uma lei estadual obriga a apresentação do certificado de vacinação completa para a matrícula de crianças em escolas das redes pública e privada.

"Ofertamos [vacina] aos fins de semana e período noturno, e a ação foi bem divulgada, então não há justificativa para a falta de procura", disse a coordenadora do programa de imunização do Acre, Renata Quiles.

Força-tarefa monitora esgoto

Em Campinas (SP), onde só pouco mais da metade do público-alvo recebeu as doses, agentes comunitários de saúde da prefeitura estão indo às casas para saber por que as crianças não foram se vacinar, na ação chamada de Adote uma Carteirinha. Famílias em situação de rua também estão sendo abordadas. Na cidade, a cobertura considerada ideal, de 95%, foi atingida pela última vez em 2018.

De acordo com a diretora do Devisa (Departamento de Vigilância em Saúde), Andrea von Zuben, existe uma preocupação com a reintrodução do vírus da poliomielite, porque Campinas tem um fluxo de pessoas de diversas regiões do mundo, por meio do Aeroporto Internacional de Viracopos.

Além disso, a região metropolitana de Campinas é considerada polo comercial, industrial, universitário e de pesquisa.

Esses fatores, aliados à queda da cobertura nos últimos anos, aumentam o risco de reintrodução da paralisia infantil, segundo a diretora do Devisa. Em 2015, o índice era de 101,7%, tendo caído para 82,8% em 2021.

"A cada ano aumenta o número de crianças sem a vacina. Nossos números, que já não vinham bem, pioraram muito na pandemia", afirmou.

O município intensificou a vigilância no aeroporto, incluindo a busca por refugiados não vacinados, o reforço no esquema de notificação de suspeitas e até o monitoramento ambiental do esgoto, para identificar a eventual presença do vírus.

A paralisia infantil é uma doença contagiosa causada por um vírus que vive no intestino, o poliovírus, que pode infectar crianças e adultos por contato direto com as fezes ou pelas secreções bucais de pessoas contaminadas.

Nos casos graves, acontecem paralisias musculares em que os membros inferiores são os mais atingidos. O último caso no Brasil foi registrado em 1989. Em 1994, foi certificada a erradicação da doença nas Américas.

Conforme o pesquisador Akira Homma, da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), a queda drástica na imunização, sobretudo nos dois últimos anos, deixa o país com baixa proteção contra uma eventual volta da doença.

"Há quase 30 anos o Brasil não tem um único caso de poliomielite. Na década de 1980, com a participação de toda a sociedade, conseguimos alta cobertura vacinal. Em dois dias nacionais de vacinação, em que chegamos a vacinar 18 milhões de crianças em um só dia, eliminamos essa terrível virose do país. Essa queda na cobertura vem deixando um número enorme de crianças desprotegidas", disse.

O que diz o Ministério da Saúde

O Ministério da Saúde informou que o Brasil é uma das referências mundiais em imunização e possui um dos maiores programas de vacinação do mundo, que aplica em média 100 milhões de doses por ano.

"A atualização da situação vacinal aumenta a proteção contra as doenças imunopreveníveis, evitando a ocorrência de surtos e hospitalizações, sequelas, tratamentos de reabilitação e óbitos", disse, em nota.

Conforme a pasta, o Brasil já eliminou cinco doenças com a imunização — paralisia infantil, síndrome da rubéola congênita, rubéola, tétano materno e neonatal e varíola —, mas a ocorrência de baixas coberturas vacinais pode causar a reintrodução dessas doenças no país, que voltariam a ser um problema de saúde pública. 

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