Em escutas captadas, suspeito diz que Amarildo foi morto pelo tráfico da Rocinha para "manchar" UPP
Traficante conhecido como Catatau teria conversado sobre pedreiro com policial infiltrado
Rio de Janeiro|Do R7
Escutas telefônicas feitas com autorização da polícia captaram uma conversa na qual um traficante conhecido como Catatau fala com um policial infiltrado no tráfico sobre o desaparecimento de Amarildo Dias. Segundo o criminoso, Boi, como seria chamado o pedreiro, foi morto para jogar a população contra o comandante da UPP da Rocinha. A conversa teria ocorrido quatro dias após o sumiço de Amarildo.
Em um dos trechos, Thiago da Silva Mendes, o Catatau, diz que "tombaram o Boi, esposo da Beth". A Beth citada seria Elizabete Gomes da Silva, mulher de Amarildo. O material faz parte do relatório concluído pelo delegado Ruchester Marreiros — já fora da investigação sobre o caso —, que aponta o pedreiro como colaborador do tráfico.
De acordo com depoimento de um homem torturado pelo tráfico e que também faz parte do material apresentado por Ruchester, Amarildo foi morto pelo bando do traficante Djalma, que controla parte do movimento de drogas na comunidade e disputa pontos com outro traficante, o Johnny.
— O comentário lá do pessoal é que Djalma ficou sabendo que o Amarildo era envolvido como pessoal do Catatu e do Johnny e pegaram ele.
Na sexta-feira (9), o comandante da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) da Rocinha, Major Edson, prestou depoimento durante cerca de oito horas na Divisão de Homicídios. O conteúdo não foi divulgado.
Relatório polêmico
O relatório feito pelo delegado Ruchester se baseia em depoimentos de moradores, policiais e também em vídeos de testemunhas que afirmam ter sido torturadas na casa de Amarildo. A casa da família seria alugada para que os criminosos realizassem sessões de tortura. O material coletado por Ruchester, que era delegado adjunto da Delegacia da Gávea (15ª DP), veio à tona após ele ser transferido para a Delegacia de Repressão a Crimes de Informática.
Uma das testemunhas que gravaram depoimento aparece com as duas mãos enfaixadas e diz ter sido torturada na casa onde Amarildo vivia com a família.
— Eles me botaram sentado na escada da porta da Bete. Ela é conhecida minha. Aí ela comentou: “você vai tomar um coro, né?”. Eu falei: “pô, acho que vou”. Então você vai ser o nono [disse ela]. Quebraram minhas duas mãos e me queimaram todo, no peito, na barriga, tudo.
A outra suposta testemunha afirmou que Amarildo era traficante e que sua mulher alugava o quintal a criminosos.
— [O Amarildo era pedreiro?] Não, era traficante. Ele era envolvido, guardava drogas para os caras. A Bete alugava o quintal para torturar pessoas.
O advogado da família de Amarildo, João Tancredo, disse que as acusações são falsas.
— É um absurdo. Tenta-se criminalizar a vítima para justificar medidas absurdas como essa que é o desaparecimento do Amarildo. [Se isso fosse verdade] A gente devia usar a casa da família do Amarildo para dizer aos garotos de comunidades para não irem para o tráfico, porque é uma casa miserável, com um único cômodo. É um fato negado pela família.
Tancredo, porém, admitiu que, como acaba sendo recorrente em favelas, a família do pedreiro pudesse conhecer traficantes.
— Existe tráfico e circula na comunidade inteira. É evidente que eles conheciam traficantes, moram lá há mais de 40 anos. Mas daí a associá-los ao tráfico é muito barra pesada. Há uma tentativa de vinculá-los à conduta criminosa.
Assista ao vídeo: