Em depoimento, fiscal diz que ajudou campanha de vereador Antonio Donato em troca de cargo melhor
Segundo Eduardo Barcellos, pagamentos eram feitos mensalmente dentro da Câmara Municipal
São Paulo|Fernando Mellis, do R7
O Ministério Público revelou novos detalhes do depoimento do auditor fiscal Eduardo Barcellos aos promotores do Gedec (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime de Formação de Cartel e à Lavagem de Dinheiro e de Recuperação de Ativos). Segundo o promotor Marcelo Milani, o servidor afirmou que deu dinheiro para a campanha de reeleição do vereador Antonio Donato — ex-secretário de Governo do prefeito Fernando Haddad — em troca de cargo melhor na administração municipal em caso de vitória do parlamentar.
Os pagamentos mensais de R$ 20 mil que ele relatou ter feito a Donato, entre dezembro de 2011 e setembro de 2012, foram realizados dentro da Câmara Municipal, de acordo com o depoimento. O auditor afirmou ainda que tinha como provar as idas ao gabinete do vereador. Ele se dispôs a fornecer, para eventuais cruzamentos de dados, os telefones que ligava no dia em que os pagamentos eram efetuados e os registros de entrada no palácio Anchieta. A quantia, conforme o investigado, era sempre entregue a Donato após os telefonemas.
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Indagado se o vereador sabia que o dinheiro era proveniente de propina, o promotor sorriu e deixou claro que seria improvável que o parlamentar não desconfiasse.
— Ele falou que ele nunca disse ao vereador que era dinheiro de propina. Ele ganhava R$ 17 mil e dava R$ 20. Não precisa dizer...
Nesta terça-feira (19), o Ministério Público instaurou inquérito civil para apurar a suspeita de enriquecimento ilícito de Antonio Donato. Na semana passada, ele pediu afastamento do cargo que ocupava na prefeitura e informou que retomaria o mandato de vereador na capital paulista. Em nota, divulgada na ocasião, ele alegou que, na Câmara Municipal, poderia se defender, “com ampla liberdade”, de 'denúncias infundadas atribuídas à quadrilha de servidores municipais que fraudava o ISS (Imposto Sobre Serviços)".
Entenda o caso
O cruzamento de dados envolvendo a declaração de bens de servidores da Prefeitura de São Paulo e os rendimentos de cada um deles passou a ser feito por meio de um sistema informatizado a partir do início deste ano, com a criação da CGM (Controladoria-Geral do Município). Foi esse sistema que permitiu que as suspeitas de enriquecimento ilícito por parte de quatro servidores públicos fossem detectadas e desencadeassem a investigação do Ministério Público — por meio do Gedec e do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) —, com o apoio da prefeitura e da Polícia Civil.
As investigações apontaram o envolvimento dos servidores — todos concursados — com o desvio de pelo menos R$ 200 milhões entre outubro de 2010 e janeiro de 2013, quando três deles foram exonerados dos cargos comissionados que possuíam, por indicação do ex-secretário de Finanças, Mauro Ricardo Costa. Se levado em conta o período em que o grupo detido atuava, desde 2007, o rombo pode alcançar os R$ 500 milhões, segundo o MP.
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O promotor do Gedec, Roberto Bodini, explicou detalhadamente como funcionava o esquema, de acordo com o que foi investigado até aqui.
— Ao final da obra, as incorporadoras submetem ao poder público as notas fiscais, para que sejam feitos os eventuais cálculos do resíduo do ISS [Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza]. Essas notas fiscais eram recolhidas pelo departamento da prefeitura, operado por esses investigados, e eles faziam um cálculo, chegando a um número real ou irreal. Em cima desse número, eles exigiam que a empresa, ao invés de pagar ou recolher 100% da guia para a prefeitura, fizesse o pagamento de parte desse valor para uma empresa que foi constituída em nome de um dos fiscais e sua esposa na época, e em nome da prefeitura era recolhida uma ínfima quantia, perto do valor depositado para essa empresa [do fiscal].
As investigações seguem em andamento e não está descartado o envolvimento de outros servidores públicos no esquema de corrupção.