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Moradores da Cracolândia relatam esperança de nova vida ao sair das ruas

Ação da prefeitura está alojando usuários de drogas em hotéis da região

São Paulo|Fernando Mellis, do R7

Segundo a prefeitura, 300 usuários de drogas já foram cadastrados no programa que oferece hospedagem e trabalho
Segundo a prefeitura, 300 usuários de drogas já foram cadastrados no programa que oferece hospedagem e trabalho

A vida em barracos na Cracolândia, região central de São Paulo, já faz parte do passado de mais de cem dependentes químicos, hospedados pela prefeitura em hotéis da região, como parte de um programa de recuperação desses usuários de drogas. A vontade de tentar um recomeço foi o que boa parte deles levou para o novo alojamento.

Uma mulher, que quis ser identificada somente como Taís, de 29 anos, viu na oportunidade uma forma de se fortalecer para deixar o vício.

— O que estão conseguindo para a gente hoje é um tratamento, querendo ou não, mesmo sem ir ao médico, você ter um trabalho é uma terapia ocupacional, você ter uma moradia, você ter um pouco mais de dignidade acaba sendo um tratamento para essa nossa doença também.

Thaís conta que há sete anos, antes de ir morar na Cracolândia, trabalhava como cantora profissional. Ela admite que sem uma ação do poder público ficaria ainda mais difícil tentar mudar de vida.


— Tem muita gente aqui que você nem acredita, tem advogado, tem médico, tem gente bastante capacitada aqui dentro e o crack, infelizmente, acaba tratando todo mundo que nem lixo. O que esse projeto está dando para nós é um pouco de dignidade para essa reinserção social. A gente está sendo visto novamente como ser humano e não como marginal.

Há cerca de seis meses, agentes municipais que atuam na tenda Braços Abertos, da Secretaria Municipal de Saúde, começaram a perguntar aos dependentes químicos sobre as necessidades imediatas deles. O resultado dessa consulta foi usado para estabelecer o que seria feito no programa da prefeitura, segundo o secretário de Saúde, José de Filippe Júnior.


— Elas esperavam ajuda na alimentação, higiene pessoal, pequenos cuidados médicos e a questão do trabalho. [...] Nós vamos acreditar que uma boa parte dessas pessoas vai, através do trabalho, se reerguer, se reestruturar.

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João Carlos Gomes Aguiar, de 32 anos, já se mudou para um hotel com a companheira, após cerca de um ano vivendo em um barraco. Ele é voluntário na tenda Braços Abertos e garante que está disposto a trabalhar.


— A gente aceitou fazer parte do programa, participar da frente de trabalho e daqui para a frente a intenção é progredir. [...] Dessa vez, pelo menos, estamos sendo tratados como cidadãos, independente de sermos dependentes químicos, estamos sendo tratados como pessoas.

Carlos Eduardo do Nascimento, de 25 anos, espera que a próxima madrugada, no hotel, seja tranquila. Na última noite, a água da chuva entrou no barraco dele. 

— Agora tudo depende de mim. Estou empolgado em poder trabalhar, ter outra vida. Sair daqui é só o começo.

Há cerca de oito meses na Cracolândia, um homem que quis ser identificado apenas como Thiago, de 33 anos, conta que virou dependente de drogas após uma decepção amorosa. Ele disse ter estudado em uma renomada escola de arte da capital, foi morar na Europa, onde trabalhava, e ao se divorciar, recorreu ao crack.

— Esse tempo foi suficiente para destruir uma vida, deixar minha família muito triste, decepcionar muita gente.

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No entanto, Thiago vê com ressalvas a iniciativa da prefeitura.

— A Cracolândia já existe há anos e nunca houve tal benefício, tal atitude ou ação com os usuários e moradores daqui. Foi preciso uma Copa do Mundo, algo importante que tem uma projeção muito forte fora do País. Como querem passar uma imagem de que aqui tudo está nos conformes, estão fazendo isso.

Ele conta que já planejava sair da região e que o programa vai facilitar que essa vontade se concretize.

— A questão de eu sair daqui já era para ter acontecido. Mas agora, eu vejo como uma forma melhor, de não sair com as mãos abanando, depois de ter passado por esse “mini-inferninho” que é a Cracolândia. 

Programa

O programa Braços Abertos prevê remunerar dependentes químicos que concordarem em trabalhar quatro horas por dia. Além de R$ 15 por dia trabalhado, os inscritos vão receber o alojamento nos hotéis da região e alimentação. Cada dependente químico vai ganhar R$ 1.086 por mês. Desse valor serão descontadas as despesas de moradia e comida. Os pagamentos em dinheiro serão feitos semanalmente.

Todo inscrito será monitorado 24 horas, segundo a secretária de Desenvolvimento e Assistência Social, Luciana Temer. Agentes de saúde e assistentes sociais ficarão responsáveis pela avaliação individual dos dependentes químicos. O programa prevê que aqueles que não estiverem de acordo com o que é proposto podem ser desligados.

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