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Entenda as suspeitas de corrupção que envolvem vacinas contra covid

Acusações de propina, pressão para acelerar processo, sobrepreço e tráfico de influência são investigadas pela CPI

Brasil|Do R7, com Agência Estado

Além da Covaxin, representante da AstraZeneca está em investigação
Além da Covaxin, representante da AstraZeneca está em investigação

A CPI da Covid no Senadoinvestiga supostas irregularidades na negociação para compra de diversas vacinas que foram oferecidas ao governo nos últimos meses. Há acusações de cobrança de propina, pressão para acelerar a aquisição sem respeitar as normas do Ministério da Saúde, suspeitas de sobrepreço e tráfico de influência.

Leia também: Acusado de tentar comprar vacina, Miranda vai à CPI e gera tumulto

Até o momento, surgiram suspeitas em relação às negociações de quatro vacinas, com ofertas de doses mais caras, e compradas de laboratórios internacionais por meio de intermediários no Brasil. Em três dos quatro casos, há também suspeita de elos com o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (Progressistas-PR).

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Covaxin


O Ministério da Saúde assinou em fevereiro um contrato para a compra de 20 milhões de doses da vacina Covaxin, produzida pelo laboratório indiano Bharat Biotech. Foi o mais caro entre os imunizantes comprados pelo governo até agora (CoronaVac, AstraZeneca, Pfizer, Janssen).

No contrato fechado em fevereiro com a Precisa Medicamentos, o Ministério da Saúde aceitou pagar US$ 15 (R$ 80,70, na cotação da época). O imunizante da AstraZeneca, por exemplo, custou ao governo US$ 3,16 (R$ 15,61 - na cotação desta quinta) e a da Pfizer, que tem uma tecnologia mais avançada, US$ 10 (R$ 49,40). Além disso, documentos do Ministério das Relações Exteriores mostram que o valor acertado no contrato foi maior do que o foi estimado pela própria fabricante.


Em depoimento ao Ministério Público em março, o chefe de importação do Departamento de Logística do Ministério da Saúde, Luís Ricardo Fernandes Miranda, apontou “pressões anormais” para a aquisição da Covaxin. O funcionário relatou ter recebido “mensagens de texto, e-mails, telefonemas, pedidos de reuniões” fora de seu horário de expediente, em sábados e domingos. Ele assegurou que esse tipo de postura não ocorreu em relação a outras vacinas.

Já o deputado Luís Miranda (DEM-DF), irmão do servidor, relatou ter recebido uma oferta de propina para que não atrapalhasse as negociações para compra da Covaxin. A oferta teria ocorrido na casa de um lobista, Silvio Assis, conhecido em Brasília por sua atividade de lobby e próximo do líder de governo na Câmara, Ricardo Barros (Progressistas-PR).


Onze dias antes, os irmãos Miranda tiveram uma reunião com o presidente Jair Bolsonaro na qual dizem ter relatado as suspeitas de corrupção. Segundo Luís Miranda, o presidente teria atribuído as suspeitas a “mais um rolo” de Barros, que é ex-ministro da Saúde. Ainda segundo Miranda, Bolsonaro disse que acionaria a Polícia Federal para investigar o caso, mas nenhuma investigação foi aberta na época.

Uma investigação criminal foi aberta apenas nesta quarta-feira (3)0, após a Procuradoria da República no Distrito Federal apontar “indícios de crime” no contrato de compra da Covaxin. O Ministério da Saúde cancelou o contrato de R$ 1,6 milhão após o caso ser explorado na CPI.

AstraZeneca

Uma negociação entre a empresa Davati Medical Supply e o Ministério da Saúde entrou na mira da CPI após acusações de outra oferta de propina. O policial militar Luiz Paulo Dominguetti, que se apresenta como representante da Davati, disse ao jornal Folha de S. Paulo ter recebido uma proposta para aumentar em US$ 1 o preço para cada dose da vacina AstraZeneca vendida ao governo Bolsonaro para, assim, pagar o pedido de propina.

A AstraZeneca nega, porém, que a Davati a represente – a empresa já foi desautorizada pela AstraZeneca no Canadá. Reportagens publicadas na imprensa mineira indicam que a Davati pode estar fraudando o processo de compra de vacinas no estado. A empresa foi citada em negociações com prefeituras, com o objetivo de conseguir uma carta de intenção demonstrando interesse na aquisição de imunizantes da AstraZeneca. Depois de conseguir a carta, porém, as conversas emperraram.

Segundo o relato de Luiz Paulo Dominguetti à Folha de S. Paulo, o pedido de propina teria partido do diretor do Departamento de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Ferreira Dias. O diretor foi demitido pelo Ministério da Saúde nesta quinta (29).

Antes disso, Ferreira Dias também havia sido citado durante o depoimento dos irmãos Miranda. Os dois disseram haver um esquema de corrupção envolvendo a compra da Covaxin e citaram o diretor. A negociação da Davati com o ministério foi intermediada pelo coronel Roberto Criscuoli, que integra o grupo de informantes que o presidente Jair Bolsonaro afirma manter para não depender dos órgãos oficiais de informação.

Convidencia

O governo brasileiro se dispôs a comprar 60 milhões de doses, ao preço de US$ 17 por dose, da vacina Convidecia, produzida pelo laboratório chinês CanSino. A vacina é representada no Brasil pela empresa Belcher Farmacêutica.

Uma intenção de compra foi assinada pelo secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, Arnaldo Correia de Medeiros, no dia 4 de junho deste ano. O preço da dose equivale a R$ 83,94, considerando o dólar comercial da última sexta-feira (25). O valor total da compra, se efetivada, será de US$ 1,020 bilhão, equivalente a cerca de R$ 5,036 bilhões na moeda nacional.

O custo da Convidecia, usada em dose única, ultrapassa o valor de outras vacinas negociadas pelo Brasil – inclusive o da Janssen, orçada a US$ 10 por unidade e também administrada por meio de dose única.

Intermediária da compra, a Belcher Farmacêutica é sediada em Maringá, reduto eleitoral de Ricardo Barros.

Em 18 de maio, a Anvisa recebeu pedido de autorização temporária para uso emergencial da Convidecia. Atualmente, o pedido está em análise e a agência aguarda informações complementares sobre a vacina.

A Belcher Farmacêutica já esteve envolvida em outras polêmicas durante a pandemia. No ano passado, a empresa foi citada pelo Ministério Público como uma das participantes de esquema de superfaturamento alvo da operação Falso Negativo. A operação investigava a compra de testes de covid-19 no Distrito Federal, que teria gerado prejuízos estimados de R$ 18 milhões aos cofres públicos.

Sputinik V

Outro contrato no foco da CPI é o da compra de 10 milhões de doses da vacina russa Sputnik V, a US$ 12,60 por dose. O contrato foi assinado com a União Química, empresa brasileira. O dono da firma, Fernando de Castro Marques, é próximo a Ricardo Barros e aparece em fotos com o parlamentar nas redes sociais. Marques tentou uma vaga no Senado pelo Distrito Federal em 2018 e doou recursos para a campanha de 137 candidatos naquela eleição.

O Consórcio do Nordeste, que reúne governadores da região e iniciou a negociação no ano passado, informou ter comprado a Sputnik V a um preço mais baixo, de US$ 9,95 dólares a unidade. Além disso, a aquisição pelos governadores do Nordeste foi assinada diretamente com o Fundo Soberano Russo, sem intermediários.

Em discursos e entrevistas, o líder do governo na Câmara já cobrou publicamente a aprovação do uso emergencial da Covaxin e da Sputnik V. Em fevereiro, Ricardo Barros disse que iria pressionar politicamente e ameaçou "enquadrar" a diretoria da Anvisa, para eliminar exigências e agilizar a aprovação de vacinas contra a covid-19.

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