Entenda os principais pontos da fala dos irmãos Miranda à CPI
Servidor e deputado federal afirmam que Bolsonaro foi informado sobre irregularidades na compra da vacina indiana Covaxin
Brasil|Do R7, com Reuters
A CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Covid, que apura eventuais erros e omissões do governo federal no tratamento da pandemia do novo coronavírus, ouviu nesta sexta-feira (25) os irmãos Luís Ricardo Miranda e Luís Miranda.
No depoimento, eles confirmaram a afirmação de que teriam relatado ao presidente Jair Bolsonaro supostas irregularidades no processo de compra da vacina indiana contra Covaxin.
A presença do deputado Luís Miranda (DEM-DF) e do irmão dele, o servidor responsável por setor de importação do Ministério da Saúde, Luís Ricardo Miranda, foi marcada por interrupções, bate-bocas e clima bastante tenso entre os senadores.
Conversa com Bolsonaro
O deputado Luís Miranda chegou ao Senado Federal escoltado após os relatos de que teria levado a denúncia de irregularidade recebida pelo irmão ao presidente Jair Bolsonaro. "Eu levei para a pessoa certa, na minha opinião, que deveria dar o devido provimento ao assunto, que é o presidente da República", disse o deputado à CPI.
Entre os pontos considerados suspeitos na compra do imunizante aparecem a previsão de pagamento antecipado de 100% do valor, o repasse para uma empresa offshore (aberta em um local sem tributação), cujo nome que não constava do contrato, e ainda a estimativa de envio de uma quantidade menor de doses do que as contratadas, além dos custos da importação.
De acordo com Miranda, Bolsonaro disse que acionaria a Polícia Federal por reconhecer que a situação é “muito grave”. "O presidente entendeu a gravidade. Olhando os meus olhos, ele falou: 'Isso é grave!' Não me recordo do nome do parlamentar, mas ele até citou um nome pra mim, dizendo: 'Isso é coisa de fulano'”, contou o deputado.
Na conversa com Bolsonaro, os irmãos também dizem ter relatado que superiores hierárquicos estariam pressionando Luís Ricardo para dar andamento à compra da Covaxin. Um desses superiores seria o coronel Marcelo Bento Pires, então coordenador de logística do Ministério da Saúde, que teria se encontrado com representante da Precisa, empresa que negociava a compra da Covaxin, em um fim de semana. "Durante toda a execução desse contrato, diversas mensagens recebi, ligações, chamadas no gabinete sobre o status do processo desse contrato", disse o servidor.
Ricardo Barros
Mais tarde, após responder repetidas vezes que não se lembrava, Luís Miranda admitiu que o nome a que Bolsonaro se referia era o do líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR). Miranda chegou a se emocionar e manifestou sua preocupação com eventuais consequências por revelar o nome.
Barros, no entanto, usou uma rede social para negar a citação. “Não sou esse parlamentar citado. A investigação provará isso”, escreveu ele, que também negou ter nomeado a servidora que atua como fiscal do contrato envolvendo o imunizante indiano.
Propina
O print de uma troca de mensagens por aplicativo entre os dois irmãos também chamou a atenção dos parlamentares integrantes da CPI. Em uma das conversas, o servidor da Saúde contava ao irmão que um colega da pasta, de nome Rodrigo, mencionava "um rapaz" que estaria cobrando propina na venda de vacina.
"O ministério estava sem vacina e um colega de trabalho, Rodrigo, servidor, me disse que tinha um rapaz que vendia vacina e que esse rapaz disse que estavam cobrando propina", disse Luís Ricardo, na mensagem de WhatsApp com o irmão. Agora, a CPI pretende convocar o servidor mencionado para prestar depoimento.
Pressão
Luís Ricardo afirmou ainda, em outra mensagem, que a pressão que recebia de chefes no Ministério da Saúde para dar andamento ao processo de importação da Covaxin divergia do tratamento dispensado a outras importações relacionadas à covid-19.
"Milhões de seringas chegando, milhões de coisas, importações sobre covid e eu nunca recebi uma ligação de ninguém, de empresa, de diretor, de secretário-executivo, de assessor de secretário, ninguém. Já nesse, meu amigo, o que tem gente em cima pressionando e falando, aí você já fica com o pé atrás", disse o servidor em mensagem de áudio ao irmão, divulgada nesta sexta na CPI.
Ao prestar seu compromisso de dizer a verdade antes de começar seu depoimento, o deputado Luís Miranda afirmou que não iria apresentar "narrativas", mas fatos, com documentos. Seu irmão, por sua vez, que acabava de desembarcar de viagem aos Estados Unidos para acompanhar a entrega de doses da vacina da Janssen doadas ao Brasil, destacou que não é filiado a nenhum partido: "meu partido é o SUS".
Acusações rebatidas
O servidor do Ministério da Saúde também rebateu as acusações do ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Onyx Lorenzoni, de que ele e o irmão, o deputado Luis Miranda (DEM-DF), teriam fraudado as notas fiscais da compra da Covaxin ao apontarem superfaturamento e corrupção nas negociações entre o governo federal e a farmacêutica.
Na apresentação, Miranda mostrou a primeira nota fiscal que teria sido apresentada a seu setor no dia 18 de março sobre o imunizante. O documento teria os primeiros indícios de superfaturamento e de favorecimento à Covaxin, segundo o servidor, já que exigia pagamento adiantado de somente 300 mil doses.
Bate-boca
A sessão com a presença dos irmãos Miranda na CPI da Covid também foi marcada por tumultos e bate-bocas. Na primeira intervenção, o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), interrompeu a apresentação de Luís Ricardo Miranda e contestou as afirmações feitas pelo servidor. "A invoice foi corrigida duas vezes não pelo depoente, mas pelo fiscal do contrato", disse, exaltado.
Prontamente, o senador Humberto Costa (PT-PE) interveio e afirmou que a invoice foi corrigida porque Luís Ricardo Miranda não a assinou. "Porque ele não aceitou", afirmou. Randolfe Rodrigues (Rede-AP) também entrou na confusão e disse que o senador Fernando Bezerra precisava se acalmar. "Esse não é o senador Fernando Bezerra que eu conheço", afirmou.
Presença de Wassef
Quem também causou tumulto ao aparecer no Senado foi Frederick Wassef, advogado da família Bolsonaro, que tentar entrar na sala de reuniões da CPI da Covid sem máscara. O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente da CPI, disse que a presença de Wassef no local causava estranhamento, mas senadores governistas alegavam que qualquer pessoa podia assistir a uma sessão do Senado.
Retirado do corredor da CPI, Wassef disse que a CPI "está sendo usada com desvio nítido de finalidade e função". "Senhor Renan Calheiros, o senhor poderia pedir ajuda à organização criminosa que está infiltrada dentro do Coaf, e que agiu desta mesma forma quebrando meu sigilo bancário e fiscal, e vazando criminosamente à imprensa", esbravejou o advogado.