Brasil busca ampliar parceria com a China em meio a tensões geopolíticas
Discussão ocorre semanas depois da vitória de Trump, que prometeu uma agenda protecionista nos EUA
Brasília|Giovana Cardoso, do R7, em Brasília
A presença do presidente chinês, Xi Jinping, no G20 fortalece a possibilidade de ampliação de acordos bilaterais do país asiático com o governo brasileiro. O chinês fará uma visita oficial ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Brasília, nesta quarta-feira (20), e a expectativa é de que os dois discutam políticas e programas de investimento e desenvolvimento em setores como economia digital, infraestrutura e agronegócio.
Para especialistas ouvidos pelo R7, a aproximação do Brasil com a China pode causar um “desconforto” para nações mais ricas, como Estados Unidos e países da União Europeia. Apesar de manter uma política externa diversificada e baseada no multilateralismo, é possível que o governo brasileiro precise equilibrar as relações para evitar futuras tensões.
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A discussão dos acordos com a China ocorre semanas depois da vitória de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos, que prometeu uma agenda protecionista.
Segundo o especialista em direito internacional Fernando Canutto, em um contexto de rivalidade geopolítica e disputas comerciais, a aproximação do Brasil com a China pode gerar preocupações para alguns países.
“É possível que o país precise equilibrar suas relações para evitar tensões, mas também pode servir como ponte entre diferentes blocos econômicos, promovendo diálogo e cooperação internacional”, diz Canutto.
Analistas acreditam que apesar de o setor do agronegócios ser o ponto-chave entre os países, existe um crescente interesse em tecnologias verdes e energias renováveis. Para o especialista em comércio internacional Leandro Barcelos, comércio, agricultura, investimentos e ciência e tecnologia devem ser os setores mais beneficiados com a ampliação de acordos.
“A China está investindo em projetos de energia solar e eólica no Brasil, alinhando-se aos esforços globais para a transição enérgica. É esperado que esses novos memorandos diversifiquem as exportações brasileiras, ampliem investimentos tecnológicos e aumentem a aproximação entre os dois países”, completou.
A especialista em relações internacionais Natali Hoff entende que o Brasil deve aproveitar essa aproximação com o governo chinês para atrair investimentos em infraestrutura.
“A gente acaba exportando majoritariamente produtos de um valor agregado menor, enquanto a gente importa industrializados, produtos com valores agregados muito superiores. Então, algo que deve entrar ali é justamente captar investimentos chineses para essas áreas estratégicas que hoje estão mais subdesenvolvidas dentro do contexto econômico brasileiro”, pontuou.
Brasil e China
Atualmente, a China é o principal parceiro comercial do Brasil. De janeiro a outubro de 2024, a parceria entre os países gerou US$ 136,3 bilhões. As exportações brasileiras alcançaram US$ 83,4 bilhões, e as importações, US$ 52,9 bilhões, um superávit de US$ 30,4 bilhões.
A pauta de importações brasileiras é baseada em válvulas e tubos termiônicos, veículos automotores e equipamentos de telecomunicações.
As exportações se concentram, principalmente, em soja, óleos brutos de petróleo e minério de ferro. Segundo o governo brasileiro, desde 2004, o comércio bilateral entre os países cresceu mais de 17 vezes. Em relação aos demais países, as exportações do Brasil para a China foram superiores à soma das vendas para os Estados Unidos e para a União Europeia.
“A China é extremamente relevante para nossa economia e também para o Brasil pensar sua posição no cenário internacional, onde cada vez mais a gente percebe o aumento nas tensões entre China e Estados Unidos”, diz Hoff.
Agro brasileiro
A vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais dos Estados Unidos e a promessa de uma agenda protecionista podem gerar uma série de reflexos no mercado brasileiro, principalmente no agronegócio. Atualmente, os Estados Unidos estão entre as principais parcerias do agro brasileiro, ficando atrás apenas da China e União Europeia. Para especialistas ouvidos pelo R7, um possível estímulo ao setor privado estadunidense pode aumentar a demanda por commodities agrícolas, o que pode favorecer o Brasil e contribuir para a diversificação comercial.
Não seria a primeira vez que os Estados Unidos imporiam taxas a outros países. No seu primeiro mandato, em 2018, Trump decidiu aplicar tarifas às importações de produtos chineses, e como retaliação a China também chegou a anunciar novos impostos aos americanos. Com a necessidade de novos mercados, os governos chinês e brasileiro estreitaram as parcerias comerciais.
Especialistas apontam que a intensificação da atividade econômica nos Estados Unidos pode beneficiar a produção nacional e contribuir para a aproximação entre China e Brasil. O especialista em comércio exterior Larry Carvalho explica que, apesar dos desafios, a política de Trump pode abrir oportunidades no mercado chinês.
“Durante sua presidência, a guerra comercial entre os EUA e a China fez o Brasil se tornar um fornecedor importante para a demanda chinesa por soja e milho. A reimposição de tarifas pode abrir mais oportunidades no mercado chinês, embora o Brasil também enfrente desafios em outros mercados. A visita de Xi Jinping ao Brasil e as negociações sobre a Iniciativa do Cinturão e Rota podem fortalecer ainda mais essa parceria”, disse Carvalho.