Especialistas veem liderança de Lula no Mercosul como teste decisivo para o futuro do bloco
Posse aconteceu na 66ª Cúpula do bloco, na Argentina. Analistas ouvidos pela reportagem apontam prioridades e riscos
Brasília|Luiza Marinho*, do R7, em Brasília

Com um mandato simbólico de seis meses na presidência do Mercosul, o Brasil terá a responsabilidade de conduzir temas sensíveis — como a inclusão dos setores automotivo e sucroenergético no pacto regional — e retomar negociações paralisadas, incluindo o acordo com a União Europeia, que se arrasta há décadas.
A posse aconteceu durante a 66ª Cúpula de Chefes de Estado do Mercosul, realizada na quinta-feira (3) em Buenos Aires, quando presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assumiu a presidência rotativa do bloco sul-americano.
O segundo semestre de 2025 parece ser pouco para o trabalho, mas, segundo especialistas ouvidos pelo R7, é necessário se o Brasil quiser retomar a liderança política e econômica da região.
Segundo o especialista em direito internacional Daniel Ângelo Luiz da Silva, a condução brasileira ocorre num cenário instável, que exige protagonismo diplomático.
“A presença ativa do Brasil será fundamental para revitalizar a integração regional e destravar pautas históricas”, analisa.
Para o analista, o primeiro passo da liderança brasileira deve ser a recuperação do diálogo entre os países integrantes — Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e Bolívia — e a superação de desentendimentos que fragilizam o bloco.
Um dos exemplos citados é a postura do Uruguai, que vem negociando acordos comerciais por conta própria, em desacordo com as normas coletivas da aliança.
Obstáculos econômicos e propostas
No campo econômico, o Mercosul enfrenta entraves persistentes. Dados do Itamaraty indicam que, enquanto no passado o comércio intrabloco representava mais de 15% das exportações brasileiras, em 2024 esse percentual caiu para cerca de 6%.
Para o macroeconomista Luciano Bravo, a lentidão nos processos aduaneiros, o número elevado de exceções à Tarifa Externa Comum e os gargalos logísticos tornam o bloco menos atrativo para parcerias comerciais de grande porte.
“O Brasil pode liderar iniciativas para simplificar normas, unificar procedimentos e utilizar o FOCEM (Fundo para a Convergência Estrutural do Mercosul) na modernização da infraestrutura regional”, propõe.
Bravo também chama atenção para os riscos de um eventual acordo com a União Europeia.
Embora setores do agronegócio devam ser favorecidos com cotas preferenciais para produtos como carne, açúcar e etanol, a indústria automotiva e a de bens de capital podem sofrer impactos negativos.
“É necessário equilíbrio para não comprometer a produção nacional”, alerta.
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Vitrine diplomática
Apesar dos desafios internos, especialistas enxergam no comando brasileiro uma oportunidade estratégica. Em sua fala na cúpula, Lula defendeu o multilateralismo e reafirmou a intenção de concluir o tratado com a União Europeia.
“Tenho convicção de que, até o fim do nosso mandato à frente do Mercosul, conseguiremos assinar esse acordo com todos satisfeitos”, disse em declaração anterior.
Para Daniel Ângelo, o papel do Brasil pode ser decisivo para reforçar a influência geopolítica do bloco em outras regiões, como África, Ásia e Europa.
“Mais do que prestígio simbólico, é uma chance de entregar resultados concretos, fortalecer alianças e reposicionar o Mercosul nos debates globais”, pontua.
O Mercosul (Mercado Comum do Sul), bloco criado em 26 de março de 1991, está completando 30 anos de existência nesta sexta-feira (26) e ao longo do tempo ele acumulou alguns fatos que valem ser destacados
O Mercosul (Mercado Comum do Sul), bloco criado em 26 de março de 1991, está completando 30 anos de existência nesta sexta-feira (26) e ao longo do tempo ele acumulou alguns fatos que valem ser destacados
Integração ou colapso funcional
Além dos impactos econômicos e diplomáticos, a presidência brasileira pode acelerar a convergência legal entre os países, promovendo ajustes nas legislações nacionais e fortalecendo mecanismos como o Tribunal Permanente de Revisão do Mercosul, que trata de disputas jurídicas internas ao bloco.
O risco, segundo os analistas, é o Mercosul seguir perdendo relevância e se transformar num espaço esvaziado, sem peso decisório.
Para evitar esse cenário, será preciso restabelecer a confiança entre os parceiros, implementar reformas estruturais e articular consensos que impulsionem o desenvolvimento inclusivo da região.
“A condução brasileira tem a missão de evitar o colapso funcional do bloco e reavivar seu papel integrador”, conclui Daniel Ângelo.
* Estagiária sob supervisão de Leonardo Meireles
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