Polícia prende homem que ameaçava indígenas durante busca por ativista e jornalista
Corporação ainda não tem pistas do paradeiro ou do que pode ter ocorrido com os desaparecidos no Amazonas
Brasília|Plínio Aguiar e Renato Souza, do R7, em Brasília, e Alex Costa, da Record TV
A Polícia Civil do Amazonas prendeu em flagrante um homem por ameaçar indígenas que participam das buscas pelo jornalista britânico Dom Phillips e pelo indigenista brasileiro Bruno Araújo, desaparecidos desde domingo no Vale do Javari, no Amazonas. De acordo com o secretário de Segurança Pública do Estado, Carlos Mansur, o suspeito estava com munição de uso restrito, específica para fuzis.
A princípio, as forças de segurança não suspeitam de ligação do homem com os desaparecimentos. "Ele foi achado com munição 762 suspeita de uso restrito e reagiu com agressividade com indígenas que participam das buscas. Por isso, ele está detido", declarou Mansur.
O superintendente da Polícia Federal (PF) no Amazonas, Eduardo Alexandre Fontes, afirmou que existe uma investigação em andamento sobre o narcotráfico na região em que ambos os profissionais sumiram. Contudo, disse que ainda não existem pistas sobre eventuais motivações, e que nenhuma hipótese é descartada.
"Nós da PF temos um inquérito policial instaurado para apurar organizações criminosas que atuam nessa região. Paralelamente a isso, claro, vamos apurar eventual homicídio, caso tenha ocorrido. Existe uma investigação também da Polícia Civil em Atalaia do Norte. Isso é comum e podemos compartilhar provas", disse.
As declarações foram feitas em coletiva de imprensa nesta quarta-feira (8). Mansur afirmou que a força-tarefa criada para apurar o caso envolve 250 agentes, duas aeronaves, três drones e 20 viaturas. A partir de agora, as atualizações sobre o caso devem ocorrer diariamente.
Phillips e Araújo, que também é servidor da Funai, estão desaparecidos desde o último domingo no Vale do Javari, no oeste do Amazonas. Como o R7 noticiou, a região, a segunda maior terra indígena do país, é pressionada por pesca ilegal, garimpo, tráfico e extração de madeira e é palco de conflitos constantes.
Araújo era alvo de ameaças por parte de garimpeiros e madeireiros na região. De acordo com a União das Organizações Indígenas do Vale do Javari (Univaja), o indigenista foi intimidado dias antes da viagem na companhia do jornalista freelancer do jornal britânico The Guardian.
O Vale do Javari fica próximo à fronteira com o Peru e abriga ao menos 14 grupos isolados — a maior população indígena não contatada do mundo.
Na terça-feira (7), o presidente Jair Bolsonaro (PL) disse que o indigenista e o jornalista estavam em uma "aventura não recomendável". O chefe do Executivo também levantou a suspeita de que eles possam ter sido mortos.
"Realmente, duas pessoas apenas num barco numa região daquela, completamente selvagem, é uma aventura que não é recomendável que se faça. Tudo pode acontecer. Pode ser um acidente, pode ser que tenham sido executados. A gente espera e pede a Deus que sejam encontrados brevemente", afirmou Bolsonaro.
Já nesta quarta-feira, a Justiça Federal do Amazonas determinou que o governo utilize helicópteros, embarcações e equipes para auxiliar nas buscas de ambos. De acordo com a decisão, o Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU) estão autorizados a requisitar diretamente das instituições (Polícia Federal, Comando Militar da Amazônia e Força Nacional de Segurança) as providências urgentes e necessárias ao cumprimento da ação.
Na decisão, a juíza afirma que, caso não houvesse omissão, seria provável que os cidadãos já tivessem sido localizados, ainda que mortos. "O cerne da questão é a omissão do dever de fiscalizar as terras indígenas e proteger os povos indígenas isolados e de recente contato", diz a magistrada Jaiza Maria Pinto Fraxe.
Desaparecidos na Amazônia
Bruno Araújo e Dom Phillips saíram de Atalaia do Norte para visitar a equipe de vigilância indígena do lago do Jaburu na última sexta-feira (3). Eles deveriam ter voltado para o município na manhã do domingo. Segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai), Araújo não estava em "missão institucional". Embora ainda integre o quadro da fundação, ele estava de "licença para tratar de interesses particulares", diz a entidade.
Os dois viajavam em uma embarcação nova, com 70 litros de gasolina — o suficiente para o percurso — e sete tambores vazios de combustível. Por volta das 6h do domingo, chegaram à comunidade São Rafael, onde encontrariam uma liderança local. Sem conseguirem falar com o morador, decidiram voltar para Atalaia do Norte, viagem com duração de cerca de duas horas. Eles, entretanto, não chegaram à cidade.
"Às 14h, saiu de Atalaia do Norte uma primeira equipe de busca da Univaja, formada por indígenas extremamente conhecedores da região. A equipe cobriu o mesmo trecho que Bruno Araújo e o jornalista Dom Phillips supostamente teriam percorrido, mas nenhum vestígio foi encontrado", informa o comunicado da Univaja.
Araújo é indigenista especializado em povos indígenas isolados e conhecedor da região, onde foi coordenador regional por cinco anos. Phillips mora em Salvador, na Bahia, e faz reportagens sobre o Brasil há 15 anos para o New York Times e o Washington Post, bem como para o The Guardian.
O jornal afirmou que a embaixada britânica no Brasil também acompanha o caso. "O Guardian está muito preocupado e busca urgentemente informações sobre o paradeiro e as condições de Phillips. Estamos em contato com a embaixada britânica no Brasil e autoridades locais e nacionais para tentar apurar os fatos o mais rápido possível", diz a nota.