Sem ouvir setores e Congresso, Zanin vota para manter decisão que suspende desoneração
Magistrado deu sentença em resposta a pedido do governo; demais ministros têm até o dia 6 para decidir se acompanham ou não Zanin
Brasília|Emerson Fonseca Fraga e Gabriela Coelho, do R7, em Brasília
O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Cristiano Zanin votou nesta sexta-feira (26) para manter a suspensão de trechos da lei que prorroga até 2027 a desoneração da folha de pagamento para os 17 setores da economia que mais empregam no país. Agora, os demais ministro da Corte têm até o próximo dia 6 para se decidir se mantêm ou não a decisão de Zanin, que deu a sentença em resposta a um pedido protocolado pelo governo federal, sem ouvir as áreas econômicas envolvidas nem o Congresso Nacional.
No voto, Zanin argumenta que “a suspensão imediata de dispositivos legais que comprometem o equilíbrio fiscal e afrontam diretamente o texto constitucional é medida que evita danos financeiros de proporções bilionárias para as contas públicas, sem possibilidade de reparação no curto e médio prazo”
“A necessidade de equilíbrio fiscal relaciona-se diretamente com a capacidade de implementar e manter importantes políticas públicas, inclusive aquelas relacionadas à redução das desigualdades sociais. Sendo assim, para que se possa assegurar a concretude dos direitos sociais previstos na Constituição, é fundamental que se preserve o equilíbrio das contas públicas.”
Nessa quinta (25), Zanin afirmou que “não mais se admite base de cálculo substitutiva à folha de salários e demais rendimentos pagos”. Para Zanin, a lei que estendeu a desoneração da folha de pagamento até 2027 desrespeita a Constituição Federal. A determinação do magistrado foi criticada por parlamentares (leia mais abaixo).
O que prevê a lei
A lei da desoneração se aplica a 17 setores que, juntos, são responsáveis por 9 milhões de vagas. No regime, em vez de o empresário pagar 20% sobre a folha do funcionário, o tributo pode ser calculado com a aplicação de um percentual sobre a receita bruta da empresa, que varia, conforme o setor, de 1% a 4,5% (entenda mais no gráfico abaixo).
Histórico da medida provisória
A prorrogação da desoneração foi aprovada pelo Legislativo em outubro do ano passado, mas foi vetada integralmente pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva menos de um mês depois. Em dezembro, o Congresso derrubou o veto de Lula, com votos de 60 senadores (contra 13) e 378 deputados (versus 78).
O ato do presidente contrariou 84% dos deputados (430 dos 513 votaram a favor do texto) e a maioria dos senadores. No Senado, a proposta passou com facilidade, aprovada em votação simbólica, que acontece quando há consenso entre os parlamentares.
As entidades representantes dos 17 setores desonerados, dos trabalhadores e de organizações da sociedade civil fizeram coro pela derrubada do veto do presidente. Essas instituições estimam que ao menos 1 milhão de vagas sejam perdidas sem a desoneração.
No início deste mês, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tinha adiantado que a AGU judicializaria a questão. Dias antes, o presidente do Congresso Nacional, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), excluiu a reoneração da folha de pagamento dos municípios brasileiros, que foi instituída pela Medida Provisória 1.202/2023. A decisão foi tomada quando o parlamentar prorrogou por mais 60 dias os efeitos do texto.
Setor de eventos
Editada no fim do ano passado, a medida originalmente pretendia reonerar a folha de pagamento de 17 setores econômicos, dos municípios com até 156 mil habitantes e também acabar com os incentivos tributários do Perse (Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos). O governo defendeu que a medida era necessária para cumprir a meta de déficit fiscal zero prevista para 2024.
A edição dessa MP gerou atritos com o Legislativo, já que o Congresso Nacional havia derrubado o veto presidencial que barrou a desoneração desses impostos dos municípios e dos 17 setores econômicos poucos dias antes. Após negociações com os parlamentares, o governo recuou e editou uma nova MP, excluindo a reoneração às empresas, mas mantendo a dos municípios e as mudanças no Perse.
De acordo com Pacheco, pela regra da noventena — prazo de 90 dias para que uma lei de alteração de tributos passe a ter efeito —, as prefeituras passariam a sofrer os efeitos da reoneração de impostos em 2 de abril. Em vez dos atuais 8% de alíquota de contribuição previdenciária sobre as folhas de pagamentos, passariam a arcar com 20% de alíquota.
Críticas
O presidente do Senado e do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), defendeu a manutenção da desoneração da folha de pagamento. A medida, aprovada pelo Congresso Nacional — após derrubar os vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no fim do ano passado — foi suspensa pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Cristiano Zanin nesta quinta-feira (25).
Em um comunicado, Pacheco diz que respeita a decisão do magistrado, mas vai buscar “apontar os argumentos do Congresso Nacional ao STF pela via do devido processo legal”. “Mas também cuidarei das providências políticas que façam ser respeitada a opção do Parlamento pela manutenção de empregos e sobrevivência de pequenos e médios municípios”, acrescentou.
“O governo federal erra ao judicializar a política e impor suas próprias razões, num aparente terceiro turno de discussão sobre o tema da desoneração da folha de pagamento.”
O presidente da Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPE), Joaquim Passarinho, também se manifestou contra a suspensão da desoneração da folha. Para ele, “não há dúvidas de que o movimento do Poder Executivo contribuirá para prolongar o tensionamento nas relações com o Legislativo, que fez valer em cada um dos votos no Congresso Nacional o anseio da sociedade civil organizada, que procura segurança jurídica e redução do Custo Brasil para gerar empregos e renda”.
“Nesse sentido, a judicialização da política simboliza um retrocesso em termos sociais e econômicos”, acrescentou.
“A Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPE) acredita no cumprimento de decisões judiciais, mas reitera a confiança de que o pleno do Supremo Tribunal Federal (STF) irá corroborar a decisão soberana do Congresso Nacional, que legislou em favor da manutenção desta fundamental política pública.”