Corte menor da taxa de juros evidencia racha entre membros do Copom, avaliam economistas
Quatro diretores indicados por Lula votaram por queda maior; voto final coube ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto
Economia|Clarissa Lemgruber, do R7, em Brasília
A redução de 0,25 ponto percentual na taxa básica de juros, chegando a 10,50% ao ano nessa quarta-feira (8), e não de 0,5 ponto percentual, como ocorreu nas sete últimas quedas, deixou um evidente racha entre os integrantes do Copom (Comitê de Política Monetária), segundo avaliam economistas ouvidos pelo R7. Quatro diretores indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva votaram pela redução de 0,5, e outros cinco membros recomendados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro decidiram por 0,25.
Veja abaixo como ficou a divisão:
Votaram por uma redução de 0,25 ponto percentual:
• Roberto de Oliveira Campos Neto (presidente);
• Carolina de Assis Barros;
• Diogo Abry Guillen;
• Otávio Ribeiro Damaso; e
• Renato Dias de Brito Gomes.
Votaram por uma redução de 0,50 ponto percentual:
• Ailton de Aquino Santos;
• Gabriel Muricca Galípolo;
• Paulo Picchetti; e
• Rodrigo Alves Teixeira.
Divergência entre atual e possível futuro presidente
O voto decisivo foi do presidente da instituição, Roberto Campos Neto, cujo mandato termina no fim de 2024. Um dos nomes mais cotados para assumir a presidência do BC (Banco Central) é o do diretor de Política Monetária e ex-número dois do ministro Fernando Haddad, Gabriel Galípolo, que votou por uma redução maior da taxa de juros.
Na avaliação do doutor em economia e professor da Universidade Mackenzie Hugo Garbe, a falta de entendimento no Copom sugere uma “clara divisão” entre os novos diretores e os que vieram da gestão passada.
“Isso pode refletir não apenas diferenças técnicas na avaliação da economia, mas também um embate político, tendo em vista que as indicações são influenciadas pelo contexto político”, afirmou.
Segundo ele, a disputa entre Campos Neto e Galípolo pode se intensificar à medida que se aproxima o fim do mandato do atual presidente do Banco Central. “A presença de votações divididas pode destacar as diferenças ideológicas e estratégicas dentro da instituição”, disse.
Garbe explica ainda que o “racha” dentro do Copom pode ser um sinal de que uma mudança de comando no BC está se aproximando, especialmente, se essa divisão persistir ou se acentuar nas próximas reuniões.
“Mudanças significativas na composição do comitê e nas direções de política monetária são frequentemente acompanhadas de mudanças na liderança. Se houver mais episódios de decisões fracionadas, isso pode acelerar discussões sobre a necessidade de uma nova liderança para alinhar a equipe.
O economista e professor de mercado financeiro da UnB (Universidade de Brasília) César Bergo afirmou que a divisão no Copom “ficou clara”. “O próprio mercado estava dividido. Cerca de 55% do mercado acreditava que seria um corte de 0,25, e 45% acreditavam no 0,50. Então, essa divisão também acabou repercutindo dentro do Banco Central”, disse.
No comunicado, o órgão informa que a decisão se dá porque “o ambiente externo mostra-se mais adverso, em função da incerteza elevada e persistente referente ao início da flexibilização de política monetária nos Estados Unidos e à velocidade com que se observará a queda da inflação de forma sustentada em diversos países”.
Para Newton Marques, economista e especialista em educação financeira, a decisão do Banco Central de diminuir o ritmo de queda da Selic se ancora nas expectativas não tão boas para a inflação em 2024 e 2025, como, por exemplo, os dados do Boletim Focus e do mercado futuro de juros, incluindo também “possíveis” pressões do mercado de trabalho.
“É somente um temor, mas acho também que as expectativas do IPCA para 2024 e 2025 podem muito se acomodar no intervalo de metas de inflação, para ajudar a política fiscal, custo da dívida mobiliária e a retomada da atividade econômica”, afirmou.
Impactos da queda do ritmo de cortes da Selic
Bergo destacou que a mudança de rumo do BC é ruim para o mercado. “O mercado não digeriu bem essa decisão, haja visto os indicadores, tanto o dólar quanto a Bolsa. Criou muita preocupação o fato de o Copom não ter emitido um comunicado que pudesse dar um esclarecimento melhor. Fica apenas a imagem da divisão e o do voto de Minerva do presidente Roberto Campos”, avaliou.
Para Garbe, a inclinação dos novos membros para um cenário de juros mais baixos, divergindo da abordagem mais cautelosa da gestão atual, sugere uma mudança potencial na política monetária que pode ter várias consequências.
“Por um lado, taxas de juros mais baixas podem estimular o crescimento econômico e o investimento, mas, por outro lado, podem também acarretar riscos de aumento da inflação se a economia aquecer rapidamente demais”, disse.
Além disso, segundo ele, uma política de juros baixos pode afetar a percepção de risco-país e a cotação do real, influenciando o fluxo de capital estrangeiro.