Sem previsão em apólice, seguro não cobre danos por inundações, como as do Rio Grande do Sul
Advogados especializados no assunto explicam que contratos mais caros costumam oferecer a cobertura, ao contrário dos básicos
Se não houver previsão na apólice contratada, seguros de carros e de imóveis não são obrigados a cobrir danos por inundações, como as que ocorrem no Rio Grande do Sul desde a última semana de abril. É o que explicam especialistas no assunto ouvidos pelo R7. “Não dá para fazer a seguradora pagar por uma situação para a qual ela não deu cobertura e por qual ela não recebeu antes”, afirma o advogado Paulo Piza, doutor em direito pela USP (Universidade de São Paulo) e vice-presidente do IBDS (Instituto Brasileiro de Direito do Seguro).
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Os segurados devem procurar o corretor responsável ou a própria seguradora para ter acesso à íntegra da apólice e verificar as coberturas adquiridas.
“Os produtos das seguradoras mais tradicionais, como as vinculadas aos bancos, costumam ter esse tipo de cobertura [para inundações]. Agora, seguros básicos, mais econômicos, não cobrem. Nesse caso, infelizmente o barato vai sair caro.”
“Cada seguradora dá um nome diferente para o tipo de cobertura para danos por água, mas geralmente ele inclui enchentes, chuvas ou inundações”, explica Piza. “Por isso é importante verificar com calma o contrato”, completa.
Acionamento do seguro
A dica para quem está nessa situação é acionar o seguro o quanto antes e registrar o sinistro. “A seguradora deve pedir documentos, se tiver, e ir ao local para avaliar as perdas para pagar a indenização. Segundo a lei, esse prazo é de até 30 dias, em geral”, diz o advogado.
Com a falta de acessibilidade dos peritos das seguradoras a quase todos os locais da tragédia no Rio Grande do Sul, esse prazo pode ser ampliado. “A seguradora precisa ter condições de avaliar os prejuízos para fazer a apuração do sinistro. Se ela faz só uma avaliação parcial, pode até pagar uma indenização provisória”, avalia.
Para os que não foram afetados, o melhor é ficar atento à apólice e contratar seguros somente com corretores autorizados. O conselho é do advogado Voltaire Marensi, autor do livro O seguro no direito brasileiro e membro da ANSP (Academia Nacional de Seguros e Previdência).
“O corretor de seguros é essencial. Essas pessoas devem procurar um corretor habilitado perante a Susep [Superintendência de Seguros Privados] para prestar esse tipo de informação, se for possível, e para contratarem os seguros conscientemente.”
Possibilidade de quitação total do imóvel
“Quando se trata de bens imóveis, aumenta, em média, 70% do custo da apólice se o comprador quiser adquirir esse tipo de cobertura que abarque eventos como inundações”, diz Marensi. Por isso, é preciso verificar o tipo de seguro residencial contratado.
Caso o imóvel seja financiado pelo Banco do Brasil ou pela Caixa Econômica Federal — como os ofertados pelo programa Minha Casa Minha Vida —, o seguro habitacional é obrigatório e pode ser acionado para o financiamento ser, inclusive, quitado em caso de comprometimento total do imóvel. “A Caixa informa ainda que adotou, entre as medidas de apoio às famílias afetadas pelas fortes chuvas no Rio Grande do Sul, reforço das equipes das Centrais de Atendimento do Seguro Residencial e Habitacional, além do fluxo facilitado para acionamento de sinistro, com documentação simplificada, proporcionando celeridade no atendimento”, comunicou o banco.
Pausa de até seis meses no financiamento
Quem foi afetado pelas enchentes pode ainda pedir a suspensão as parcelas do financiamento, segundo a Caixa. “Em decorrência do decreto de calamidade pública no estado do Rio Grande do Sul, o cliente poderá solicitar a pausa de seis meses nos contratos de crédito mobiliário através do Alô Caixa, pelos números 4004 - 0104 (capitais e regiões metropolitanas) e 0800 104 0 104 (demais regiões) ou procurar uma agência do banco”, informa a estatal.
“As prestações vencidas ou pausadas são incorporadas ao saldo devedor e diluídas no prazo remanescente dos contratos habitacionais, respeitando-se a taxa de juros e o prazo contratados originalmente”, explica a instituição financeira.
Os clientes que fecharam o contrato com o Banco do Brasil poderão prorrogar as parcelas por até quatro meses. “As operações de financiamento imobiliário e empréstimo com garantia de imóvel poderão ter até quatro parcelas de capital e encargos básicos repactuadas e transferidas para o final do cronograma”, diz o banco, em nota.
Seguradoras sobrecarregadas
Segundo a CNseg (Confederação Nacional das Seguradoras), as enchentes no Rio Grande do Sul “ativaram uma das maiores operações já registradas pela indústria nacional do seguro”. “Desde o dia 29 de abril, as 140 empresas associadas vêm atuando de forma consistente para dar suporte aos seus clientes de Seguros Gerais, Saúde Suplementar, Previdência e Capitalização”, afirma a entidade, em nota.
“Historicamente, o Estado do Rio Grande do Sul possui uma cultura de seguro acima da média do Brasil e a Confederação tem certeza que as empresas do setor não estão medindo esforços no apoio necessário para seus clientes nesse momento”, diz o texto.
A instituição diz que ainda é cedo para calcular o prejuízo da tragédia para o setor. “A divulgação de valores de indenização neste momento seria prematura, uma vez que somente agora os cidadãos atingidos estão contatando as seguradoras para relatar os sinistros.”
Números da tragédia
Até as 18h desse domingo (19), 463 dos 497 municípios do estado já haviam sido afetados pelas enchentes. A Defesa Civil confirmou 157 mortes. Há ainda 806 feridos e 88 desaparecidos. Pelo menos 2.336.136 de pessoas foram afetadas. Entre elas, 76.955 estão em abrigos, e 581.633, desalojadas.
As inundações ocorrem desde a última semana de abril e atingem, principalmente, Porto Alegre e municípios da região metropolitana, como Eldorado do Sul e Canoas. Equipes de resgate e voluntários trabalham para resgatar moradores e animais domésticos.