Logo R7.com
Logo do PlayPlus

Como região chamada ‘porta das lágrimas’ ameaça paz do Oriente Médio?

Estreito de Bab al-Mandeb é alvo dos terroristas Houthis e estratégico para Israel

Internacional|Felipe de Paula, do R7

Bab el-Mandab (27 de julho de 2013) – Um MH-53 Super Stallion decola do USS San Antonio (LPD 17), operando na área da 5ª Frota dos EUA para apoiar segurança marítima e cooperação regional.
Helicóptero dos EUA decola no estreito de Bab el-Mandeb para apoiar segurança marítima. Divulgação/Marinha dos EUA/Lacordrick Wilson)

Localizado entre a ponta sudoeste da Península Arábica e o Chifre da África, o estreito de Bab al-Mandeb é um ponto chave para o controle da navegação entre o Oceano Índico e o Mar Mediterrâneo. Estima-se que 1/4 das mercadorias do mundo são transportadas pelo estreito, incluindo suprimentos energéticos extraídos no Golfo Pérsico e vendidos à Europa.

Com 115 km de extensão, o estreito não abriga apenas grandes embarcações e navios cargueiros. Historicamente, Bab el-Mandeb é palco de muitos perigos, desde fortes correntes marítimas à pirataria e conflitos bélicos. Não é por acaso que o nome Bab el-Mandeb signifique “porta das lágrimas” em árabe.

O nome é uma referência clara às instabilidades da região, que hoje presencia ataques de terroristas Houthis do Iêmen contra navios de vários países. Em resposta, os EUA bombardeiam várias áreas controladas pelos Houthis, grupo que luta para vencer a guerra civil em curso no Iêmen.

O grupo, que adota o slogan “Deus é grande. Morte aos Estados Unidos. Morte a Israel. Maldição aos judeus e vitória para o Islã”, surgiu na década de 1990, quando seu líder, Hussein al-Houthi, lançou o “Believing Youth” (Juventude Crente), um movimento de reavivamento religioso de uma subseção secular do Islã xiita chamada Zaidismo.


Os zaidis governaram o Iêmen durante séculos, mas foram marginalizados pelo regime sunita que chegou ao poder após a guerra civil de 1962. O movimento de al-Houthi foi fundado para representar os zaidis e resistir ao sunismo radical. Os seguidores da corrente ficaram conhecidos como Houthis.

Quem são os Houthis

O grupo compõe o “eixo da resistência” liderado pelo Irã contra Israel, os Estados Unidos e o Ocidente em geral. O governo iraniano apoia os Houthis há anos, replicando seus esforços nas últimas três décadas para construir outras milícias, incluindo o Hamas em Gaza e o Hezbollah no Líbano.


O apoio à causa palestina e a hostilidade em relação a Israel há muito tempo são os pilares da narrativa Houthi. “Embora a ameaça do Hamas ainda persista, a principal ameaça para Israel atualmente é atribuída ao Iêmen, com os Houthis. No que diz respeito a mísseis e drones, trata-se de uma ameaça complexa, devido à distância”, analisa Monique Sochaczewski, professora da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e especialista em Oriente Médio.

Segundo Monique, o Irã, inicialmente, exercia grande influência sobre os Houthis, atuando como uma espécie de “pai” estratégico. Atualmente, a relação evoluiu para algo mais equilibrado, com os Houthis ganhando autonomia e se posicionando como um ator regional relevante. Além de ameaças a Israel, os Houthis têm impactado a navegação internacional e, ocasionalmente, colaborado com grupos como Al-Qaeda e Al-Shabaab para ampliar seu alcance e poder estratégico.


“O apoio do Irã desempenhou um papel fundamental no início da ascensão dos Houthis. No momento, é importante observar até que ponto eles já não se veem como suficientemente fortes por si próprios, talvez até mais do que o próprio Irã. Isso coloca em questão a continuidade e a força do chamado “eixo da resistência”, diz Monique.

Os Houthis afirmam que as suas ofensivas com drones e mísseis têm como alvo embarcações provenientes de Israel ou com destino ao país. No entanto, na prática, os ataques afetam todos os tipos de navios que, na maioria dos casos, não têm ligação com Israel e se dirigem para outros países.

Monique ressalta a existência do porto estratégico na cidade de Eilat, no extremo sul de Israel. “Durante duas guerras – a do Suez, em 1956, e a de 1967 – Israel desempenhou um papel direto na proteção do acesso ao Mar Vermelho e à navegação em direção a Eilat. Com o tempo, essa gestão do Mar Vermelho foi praticamente terceirizada, enfrentando poucas questões significativas. No entanto, recentemente, a situação mudou, especialmente devido à importância do porto de Eilat. Pesquisas recentes do Banco da Universidade Hebraica de Jerusalém indicam que o impacto no comércio israelense, relacionado ao porto, foi de apenas 5%”, comenta a especialista.

O que ainda pode acontecer

Desde outubro de 2023, quando houve a escalada do conflito entre Hamas e Israel, forças Houthis travam batalhas balísticas com o governo de Benjamin Netanyahu, premiê israelense. O último embate expressivo ocorreu na sexta-feira (10), quando aviões de guerra israelenses bombardearam uma estação de energia e dois portos no Iêmen controlado pelos Houthis.

Sobre os próximos desdobramentos da região, Monique Sochaczewski explica que o multilateralismo está enfraquecido, e a situação no Mar Vermelho reflete a crise da globalização e a contestação à liderança dos Estados Unidos no sistema internacional.

“A Rússia pode interpretar os acontecimentos no Bab el-Mandeb como evidência do colapso dessa ordem global. Já a China, que possui uma base estratégica em Djibouti, depende de uma navegação internacional segura para manter seu comércio fluindo e pode desempenhar um papel decisivo na estabilização ou deterioração da região. Quanto à política de Trump, os cenários são incertos. Ele pode optar por retirar os EUA do Oriente Médio para focar na rivalidade com a China, o que deixaria a região ainda mais instável, ou pode adotar uma postura pragmática de negócios, buscando acordos diretos e tentando conter a influência dos Houthis com medidas mais agressivas”, explica Monique.

A especialista ressalta que o estreito atravessa um momento de instabilidade e imprevisibilidade, com implicações profundas para o Oriente Médio e para o sistema internacional como um todo.

Últimas


Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com oAviso de Privacidade.