Além do Hamas e Hezbollah: quais são os outros grupos terroristas pró-Irã que ameaçam Israel
Milícias extremistas treinadas e patrocinadas pelo governo iraniano atuam no Iêmen, Síria, Iraque, Líbano e na Palestina
Internacional|Fernando Mellis, do R7
Desde o início da guerra entre Israel e a organização terrorista Hamas, que controla a Faixa de Gaza, diversos grupos extremistas que atuam na região também lançaram ataques em direção ao território israelense e a alvos dos Estados Unidos, o principal aliado do Estado judeu, no Oriente Médio.
Todos eles têm algo em comum, segundo autoridades israelenses e americanas: são milícias armadas, treinadas e financiadas pelo Irã, país que desde 1984 é classificado pelo Departamento de Estado americano como um patrocinador do terrorismo.
A formação desses grupos começou após a Revolução Islâmica iraniana, em 1979, como parte de uma estratégia de disseminar os ideais revolucionários na região.
O Exército iraniano não se envolve diretamente nos conflitos regionais. Para isso, utiliza uma subdivisão, o Exército dos Guardiães da Revolução Islâmica, popularmente conhecido como Guarda Revolucionária Iraniana, fundado pelo aiatolá Ruhollah Khomeini.
Esse Exército paralelo, que também não suja as mãos, é o responsável por garantir treinamento, logística, armas e financiamento de milícias consideradas estratégicas para o Irã na região, visando disseminar suas ideologias, que incluem o antiamericanismo e a destruição do Estado de Israel.
Hezbollah
O primeiro grupo foi o Hezbollah. A ligação com o Irã aparece já no nome, que significa "Partido de Alá", ou "Partido de Deus", e foi dado pelo aiatolá Khomeini.
Foi fundado no início da década de 1980, no Líbano, e conta com a maior fatia de apoio militar e financeiro iraniano.
O Departamento de Estado dos EUA estimou, em 2018, que Teerã enviava mais de US$ 700 milhões (R$ 3,5 bilhões, na cotação atual) anualmente ao Hezbollah, cifra que caiu a partir de 2020 devido a sanções americanas, à queda da cotação do petróleo e à pandemia de Covid-19.
O secretário-geral da organização, Sayyid Hassan Nasrallah, afirmou, em 2016, que "o orçamento do Hezbollah, tudo o que ele consome, suas armas e mísseis, vem da República Islâmica do Irã".
Segundo o Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais, em 2020 o Hezbollah havia se tornado o ator não estatal mais fortemente armado do mundo, com pelo menos 130 mil foguetes e mísseis.
O poder financeiro fez com que o Hezbollah entrasse para a política libanesa ao concorrer a cargos públicos pela primeira vez em 1992, conquistando postos importantes no governo e no setor econômico do país desde então.
O Hezbollah tem algum apoio dentro do Líbano, principalmente da população xiita, mas a maioria da população não endossa suas ações.
Segundo o Wilson Center, durante a década de 1980 o Hezbollah realizou vários atentados suicidas contra pessoal e instalações dos EUA no Líbano, além de tomar dezenas de reféns estrangeiros, incluindo mais de uma dúzia de americanos.
Na Guerra do Líbano em 2006, o Hezbollah desempenhou um papel central como ator não estatal, ao entrar em confronto com as Forças de Defesa de Israel. O conflito começou quando o grupo capturou dois soldados israelenses na fronteira e lançou foguetes contra cidades e vilarejos no norte de Israel.
A organização demonstrou sua capacidade militar, disparando uma grande quantidade de foguetes em direção a Israel e causando danos materiais e baixas civis. A guerra resultou em uma intensa ofensiva israelense no sul do Líbano, mas o Hezbollah conseguiu resistir e infligir perdas significativas às forças israelenses.
O conflito encerrou-se com um cessar-fogo mediado pela ONU (Organização das Nações Unidas) e teve um impacto profundo na política e na segurança da região, consolidando ainda mais o status do Hezbollah no Líbano e no cenário internacional.
O Hezbollah iniciou uma série de ataques ao norte de Israel logo após a ação do Hamas em 7 de outubro. Mísseis são disparados diariamente em direção ao norte israelense, enquanto milicianos tentam incursões por terra — nenhuma bem-sucedida até o momento.
As ameaças fizeram com que diversas cidades fronteiriças fossem evacuadas nas últimas semanas. Alguns dos foguetes disparados chegaram a atingir residências nessas localidades.
Hamas
O Hamas (Movimento de Resistência Islâmica) não é um grupo alinhado completamente com o Irã. "O apoio do Irã ao Hamas não é garantido. Existe uma desconexão entre o Hamas sunita árabe e o Irã persa xiita, e o relacionamento oscila entre momentos de calor e momentos frios", diz um artigo do Centro Dado de Estudos Militares Interdisciplinares, ligado às FDI (Forças de Defesa de Israel).
A organização foi fundada em 1987, como um ramo da Irmandade Muçulmana. As divergências religiosas entre o Irã e o Hamas foram superadas porque sua proximidade com Israel fez dele um ativo interessante para o governo de Teerã.
Yahya Sinwar, um alto líder militar do Hamas, afirmou em 2017: "As relações com o Irã são excelentes, e o Irã é o maior apoiador das Brigadas Izz ad Din al-Qassam [braço armado do grupo] com dinheiro e armas".
Ainda de acordo com as FDI, o Irã envia aproximadamente US$ 200 milhões (R$ 1 bilhão, na cotação atual) anualmente ao Hamas.
"Apesar da responsabilidade do Hamas sobre a população civil da Faixa de Gaza, a maior parte do dinheiro fornecido pelo Irã vai para o financiamento de ataques terroristas e operações contra Israel, em vez de ajudar os civis palestinos. Além do apoio monetário, o Irã fornece ao Hamas armas e munições — incluindo foguetes, mísseis antitanque e antiaéreos e morteiros — para serem utilizados em ataques contra Israel", completa o órgão israelense.
O apoio iraniano ao Hamas aumentou significativamente após 2006, quando o grupo derrotou o Fatah, partido que governava até então, e o expulsou da Faixa de Gaza.
Embora controle a Faixa de Gaza na Cisjordânia, cujo governo é da Autoridade Palestina, o Hamas também tem ganhado simpatia nos últimos anos, e inclusive tem células terroristas naquela localidade.
A Força Quds iraniana passou a fornecer armas, munições de qualidade, mísseis antitanque e antiaéreos aos extremistas do Hamas. Além disso, enviou treinamento militar à Faixa de Gaza. Com esse conhecimento, o Hamas passou a produzir os próprios foguetes.
A experiência e o arsenal permitiram aos terroristas do enclave palestino travar três conflitos anteriores ao atual contra Israel (2008-2009, 2012 e 2014).
Também foi nas últimas décadas, com financiamento estrangeiro, que o Hamas conseguiu construir uma ampla rede de túneis sob Gaza, permitindo que suas operações continuem mesmo com intensos bombardeios israelenses.
O Centro de Inteligência e Informação sobre Terrorismo Meir Amit divulgou um relatório em que diz que altos funcionários iranianos e oficiais do Hamas se reuniram algumas vezes em 2023, em possíveis articulações sobre os ataques terroristas a Israel no dia 7 de outubro, em que cerca de 1.400 pessoas foram assassinadas em território israelense.
Jihad Islâmica Palestina
Considerada outro centro de poder na Palestina, a Jihad Islâmica tem atuado em conjunto com o Hamas nos ataques recentes a Israel. Trata-se também de um grupo sunita.
Organização terrorista fundada em 1981, a Jihad Islâmica tem laços mais longos e próximos com o Irã do que o próprio Hamas. Embora tenha sua base em Damasco, mantém um escritório em Teerã.
O Irã enviou mais de US$ 100 milhões (R$ 500 milhões, na cotação atual) anualmente à Jihad Islâmica, segundo um relatório do Departamento de Estado americano divulgado em 2020. Esse financiamento, porém, teve interrupções em 2015, devido à falta de apoio do grupo no Iêmen, mas foi retomado no ano seguinte.
Em 2002, o então secretário-geral da Jihad Islâmica, Ramadan Shallah, disse que eles eram "outro fruto da árvore frutífera do aiatolá Khomeini [líder espiritual do Irã]".
A estrutura da Jihad Islâmica é basicamente usada para atingir alvos civis israelenses. Esse foi o grupo acusado por Israel e por outros países do Ocidente de disparar o foguete que falhou e caiu no estacionamento do hospital Al Ahli, em Gaza, no último dia 17.
Houthi
Diversos drones disparados do Iêmen em direção a Israel foram interceptados nos últimos dias por navios dos EUA no mar Vermelho. O Exército israelense e o americano acusam a milícia rebelde xiita Houthi de ser a autora.
De acordo com o jornal The New York Times, os houthis lançaram pelo menos dez foguetes contra Israel durante a guerra, mas que não causaram danos significativos, apesar de terem sido um sinal de apoio ao Hamas.
Fundado no Iêmen na década de 1990, o Houthi gradualmente se transformou em um movimento rebelde organizado, com uma presença significativa no norte do país. O nome é uma homenagem a um dos fundadores, Hussein Badreddine al-Houthi, morto em uma operação do Exército local em 2004.
O Departamento de Estado americano acusa a Força Quds da Guarda Revolucionária Islâmica e o iraniano Sa'id al-Jamal de usarem uma rede que "gera dezenas de milhões de dólares em receitas provenientes da venda de mercadorias, como o petróleo iraniano", para apoiar financeiramente atos terroristas.
"Os ataques dos houthis dentro do Iêmen e contra os vizinhos do Iêmen, incluindo os recentes ataques terroristas visando explicitamente a locais civis na Arábia Saudita e nos Emirados Árabes Unidos, causaram numerosas vítimas civis", salienta o Departamento de Estado.
O grupo tem à disposição mísseis balísticos, veículos aéreos não tripulados (drones), explosivos e minas navais.
Resistência Islâmica no Iraque
Outra coadjuvante desde o início da guerra tem sido a Resistência Islâmica no Iraque (Al-Muqawama al-Islamiyah fi al-Iraq), descrita pelo The Washington Institute como "um termo guarda-chuva usado para descrever as operações de todas as milícias apoiadas pelo Irã no Iraque, incluindo ataques na Síria durante o conflito entre Israel e o Hamas em outubro de 2023".
Esse agrupamento de grupos extremistas compartilha de muitos objetivos do Irã, principalmente o antiamericanismo e o desejo do fim do Estado de Israel. O objetivo deles é estabelecer um governo islâmico no Iraque.
Desde o começo deste mês, essas milícias reivindicaram uma série de ataques, incluindo o uso de um drone para atingir a base aérea de Harir, no Curdistão iraquiano, que é operada pelos EUA.
As forças americanas e seus aliados no Iraque e na Síria foram atacados com drones e foguetes 23 vezes neste mês, disse um funcionário do alto escalão da Defesa dos Estados Unidos nesta segunda-feira (30), segundo a agência de notícias AFP.
O The Washington Institute lista quatro objetivos da Resistência Islâmica no Iraque:
• Permitir que várias milícias de Muqawama iraquianas lancem ataques contra as tropas dos EUA no Iraque e na Síria sob um único termo guarda-chuva;
• As milícias podem ver benefícios em obscurecer quais grupos específicos estão atacando as bases dos EUA;
• O uso de uma marca genérica e sem logotipo é talvez a extensão máxima da "estratégia de fachada" que o Irã e seus grupos têm usado desde 2019 para evitar responsabilização por ataques contra os americanos; e
• Mostrar unidade por trás dos ataques contra os interesses dos EUA durante o conflito Israel-Hamas, essencialmente "se apresentando para o serviço" como uma única força. Isso sugere fortemente que o Corpo de Guardiães da Revolução Islâmica do Irã-Força Quds está coordenando muitos dos grupos iraquianos da "resistência", que, de outra forma, tendem a discordar sobre a liderança local.
A Resistência Islâmica também coordenou ações contra forças americanas em resposta ao assassinato do comandante da Guarda Revolucionária do Irã, Qasem Soleimani, em Bagdá, em janeiro de 2020. O militar, que havia sido chefe das Forças Quds durante décadas, foi morto em um ataque de drone dos Estados Unidos.
Liwa Fatemiyoun
O Liwa Fatemiyoun, também conhecido como Brigada Fatemiyoun, é uma milícia de combatentes afegãos xiitas recrutados para lutar na Síria ao lado das forças do governo do ditador Bashar al-Assad.
Embora menor e sem um papel significativo até o momento na guerra de Israel contra o Hamas, essa milícia é associada a todas as outras mencionadas acima.
O grupo foi formado no início da Guerra Civil Síria e é composto de voluntários xiitas afegãos, que são treinados, equipados e financiados pelo Irã.
Em 2019, o Departamento do Tesouro dos EUA designou o Fatemiyoun na Síria como uma organização terrorista “por fornecer apoio material” à Guarda Revolucionária do Irã.
O Ministério das Relações Exteriores do Irã afirmou, nesta segunda-feira (30), que os ataques dos últimos dias a bases dos Estados Unidos no Iraque e na Síria são uma "reação" à ajuda prestada por Washington a Israel na guerra contra os terroristas do Hamas.
"Você colhe o que planta. Apoiar e provocar tensão desencadeia uma reação", afirmou o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores iraniano, Naser Kanani, em uma coletiva de imprensa.
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