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Aposta no empreendedorismo depois dos 55 anos mais que dobra em uma década em MG

Longevidade e busca por realização pessoal levaram ex-secretária a se tornar marceneira e estimularam idosa a criar canal na web

Minas Gerais|João Gruppi, Ana Pedrosa e Nalu Saad, da Record Minas

Rozane relata preconceito por ser mulher na profissão
Rozane relata preconceito por ser mulher na profissão

Foram trinta anos em cima do salto trabalhando dentro de um escritório como secretária. Depois de se aposentar, aos 55 anos, Rozane Faioli, conseguiu se dedicar à profissão de seus sonhos: ser marceneira.

Ela fez um curso de capacitação, juntou as economias e montou uma oficina que transforma madeiras recuperadas em peças de decoração. "Sempre quis ser marceneira, mas, antes, não podia pensar nisso", lembra.

Entre máquinas, pregos, cola e muita madeira, a moradora de Belo Horizonte se encontrou como profissional e encontrou também um novo propósito de vida. "Empreender é complicado, a gente trabalha muito mais, mas eu faço meu trabalho com paixão. É o que eu realmente gosto de fazer. Quando eu vejo uma madeira que eu posso transformar em um objeto é muito gratificante. Aí eu entrego e o cliente fala 'você superou, é mais do que eu esperava'. Isso dá um orgulho, uma honra", diz.

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Rozane faz parte de uma estatística crescente: a das pessoas que decidem empreender depois dos 55 anos. De acordo com uma pesquisa do Sebrae (Serviço Brasileiro de Micro e Pequenas Empresas), em 10 anos, o número de empreendedores nessa faixa etária que estavam iniciando um negócio mais do que dobrou no Brasil.


Se em 2013, havia 1,6 milhão de empreendedores iniciais com mais de 55 anos, no ano passado foram 3,6 milhões. São considerados empreendimentos iniciais aqueles que têm até três anos e meio de existência. A partir daí, eles passam a ser considerados empreendimentos consolidados, de acordo com o Sebrae. Também entre os consolidados, os empreendedores mais maduros têm participação expressiva: são um em cada cinco.

Os motivos que levam as pessoas mais maduras a empreender são diversos, mas a principal causa da maior participação delas nesse mercado é a longevidade. “Os brasileiros estão vivendo mais e estão economicamente mais ativos. Então, é muito comum uma pessoa idosa, por exemplo, empreender para complementar a renda da aposentadoria ou realizar um sonho. O que antes parecia impossível, foi facilitado pelas novas tecnologias e a globalização. Isso gera mais oportunidades e, consequentemente, mais empreendedores.”, analisa Junio Enes, consultor do Sebrae Minas.

Para a marceneira Rozane, o empreendedorismo foi o caminho para realizar um sonho e fazer diferença na vida de outras pessoas. Hoje, aos 66 anos, quando muitos já se aposentaram ou se preparam para encerrar a carreira, Rozane está cheia de planos para elas e para a construção de um mundo melhor.

A marcenaria destina 10% do seu faturamento a ações de apoio às mulheres vítimas de violência doméstica. O próximo passo é tirar do papel o projeto “Transformando Madeiras e Vidas”, que pretende qualificar mulheres em situação de vulnerabilidade na marcenaria. A meta é oferecer cursos de marcenaria a partir do ano que vem. "Eu quero impactar vidas. A idade não limita. Eu vou ter esse negócio".

A mesma determinação ela usa para superar obstáculos. Se na juventude o preconceito a impediu de exercer a marcenaria, hoje ele aparece de uma forma mais sutil. "No começo foi muito difícil, eu já tinha cabelo branco e, por ser mulher, era um empecilho grande, talvez mais do que a própria idade", lembra. Ela enumera situações pelas quais passa com frequência. "Quando eu vou fazer compras, é comum ouvir ‘vê com seu marido se é isso mesmo que ele quer’. Aí eu falo que sou a marceneira e me olham torto. Levam um susto, mas quando as pessoas vêem o brilho nos meus olhos, a desconfiança desaparece", comemora. 

Influenciadora digital

Ideias para organizar a casa, aquele segredo da receita caseira e até a melhor forma de dobrar e guardar as sacolinhas de supermercado. Esse é o conteúdo de um canal que chama atenção no Youtube. Há dois anos, durante a pandemia, a mineira Therezinha Martins, hoje com 77 anos, criou com sua filha o canal Boas de Ideia e levou para a internet as dicas que as donas de casa costumam trocar em conversas na calçada ou em encontros de amigas.

Therezinha se juntou à filha na saga digital e já tem anunciantes
Therezinha se juntou à filha na saga digital e já tem anunciantes

Dona do bordão “passa pras amigas”, Therezinha conquistou até o momento 87 mil inscritos no canal e contratos com marcas. "Quem imaginaria uma youtuber na minha idade?”, brinca. O difícil não é só imaginar. Encontrar uma influencer como Therezinha também não é fácil. Uma pesquisa da Infuency.me, plataforma especializada em marketing de influência, mostrou que dos cerca de 324 mil produtores de conteúdo digital do país, apenas 218 têm mais de 65 anos. O número representa 0,06% do total. A profissão é concentrada em jovens: 62% dos influenciadores têm entre 25 e 34 anos.

Um fator que faz a diferença é o apoio familiar. “Hoje temos incentivo das famílias. É comum ouvir filhos ou netos dizendo: ‘você faz tal coisa muito bem. Deveria investir nisso.’”, destaca o consultor do Sebrae.

A prova viva é a Therezinha. Ela decidiu se juntar à comunidade depois de uma conversa com o filho. "Ele já tinha um canal famoso. Durante uma visita dele, comentávamos sobre a organização e ele deu a ideia de criar um perfil para falar de coisas de casa. Era pandemia, não podia visitar ninguém. Decidi me arriscar", relembrou.

Mas ela não está sozinha nessa. A filha Silvanne Martins, de 42 anos, virou parceira na aventura. A videomaker, além de co-apresentadora, é responsável por editar os vídeos e cuidar das redes sociais.

Os fãs da dupla, no entanto, não imaginam os desafios enfrentados para chegar no patamar atual. "A internet é muito nova e nem sempre é fácil achar informação. Tivemos que nos arriscar e entender o que funcionava ou não", comentou Silvanne.

Passados dois anos daquela conversa com o filho mais velho, o canal tem três contratos vigentes com marcas parceiras. Também há uma loja virtual para os artesanatos feitos pela Therezinha. Mas se engana quem pensa que esse é o maior lucro da empreendedora. “[O canal] me traz um ar mais jovem. As pessoas nos reconhecem e param na rua para conversar. O Boas de Ideias me traz vida! Enquanto tem gente na minha idade sem motivação.", exclamou.

A tendência é que exemplos como os de Rozane e Therezinha surjam ainda mais. Pelo menos é o que aponta Junio Enes, do Sebrae. "Com o aumento da população mais velha e as novas soluções de mercado para os 50 mais, a expectativa é de que o empreendedorismo nessa faixa etária siga crescendo, mas tudo vai depender do cenário econômico".

Quebrando barreiras

"Trabalhei em uma multinacional onde não era permitido contratar funcionários acima dos 40 anos", revela a empresária Heliane de Azevedo. Segundo dados mais recentes divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), dos 8,6 milhões de desempregados no país, cerca de 30% têm mais de 40 anos.

Sem emprego e com poucas oportunidades, a alternativa para enfrentar as barreiras foi empreender. “Diante de portas fechadas, os 50+ procuram abrir janelas. É aí que entra o empreendedorismo inclusivo”, diz Heliane.

À frente dessa realidade, Heliane fundou, em Belo Horizonte, o IPPE (Instituto de Pesquisas e Projetos Empreendedores) para capacitar empreendedores de maturidade. O espaço oferece aulas, feiras e debates gratuitos com o intuito de ajudar o público acima dos 50 anos. O serviço só é possível porque recebem um incentivo da Fundação Municipal do Idoso, além de verba de patrocinadores.

"Essas pessoas têm habilidades e competências, mas sem conhecimento não tem como [empreender]. Então, nós criamos a capacitação empreendedora com foco nos mais velhos." concluiu Heliane.

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