O papel da primeira-dama e as consequências do xingamento de Janja
Como fala da esposa de Lula pode influenciar a imagem e as relações internacionais do país
O fato de grande parte da população ter elegido Lula como novo presidente não implica – ou não deveria implicar – dar aval para ele e sua primeira-dama fazerem o que bem entenderem. Os eleitores e a imprensa podem e devem cobrar atitudes dignas de um representante de nosso país.
No sábado, Rosângela Lula da Silva, conhecida como Janja, protagonizou uma situação polêmica durante um evento paralelo ao G20, no Rio de Janeiro, ao fazer uma declaração inesperada.
Quando estava discursando, Janja, ao ouvir um som que a incomodou, comentou: “Acho que é o Elon Musk. Eu não tenho medo de você, inclusive, f***, Elon Musk.”
Essa fala rapidamente se espalhou e gerou uma reação imediata do empresário, que, em resposta na plataforma X (anteriormente conhecida como Twitter), disse: “Eles vão perder a próxima eleição.”
Devido à polêmica, as hashtags #Janja e #PrimeiraDama se tornaram alguns dos tópicos mais discutidos no X no Brasil. Curiosamente, ela discursava sobre a regulação das redes sociais. Ou seja, agiu de forma diferente do que pregava porque, em nome da liberdade de expressão, comprometeu a responsabilidade pública.
O uso da expressão vulgar direcionada a um empresário de grande influência, recém-nomeado chefe de um importante departamento no governo Trump, gerou repercussões que ultrapassam o âmbito pessoal. E não parou por aí.
Durante o mesmo discurso, Janja fez outra declaração controversa ao mencionar que o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), não estaria presente no G20 devido ao ataque que ocorreu em Brasília.
“A gente convidou o ministro Alexandre de Moraes - mas ele não veio - por conta do que inacreditavelmente aconteceu em Brasília essa semana, e o bestão lá acabou se matando com fogo de artifício, mas, enfim... Incrível. A gente ri, mas é sério, gente, é sério. Olha só o que fazem as redes sociais na mente da pessoa.”
Diplomatas brasileiros reagiram negativamente ao episódio, avaliando que a atitude dela foi imprudente. Segundo análises internas, as declarações foram vistas como um obstáculo desnecessário em um momento em que o Brasil busca fortalecer sua posição diplomática e manter boas relações com a nova administração dos Estados Unidos. Afinal, nosso país, como uma potência emergente, precisa se posicionar como um interlocutor sério no cenário global.
A importância do papel da primeira-dama
Uma distração desnecessária que afeta a credibilidade e coloca em risco estratégias de cooperação importantes. Apesar de não ter sido Lula quem falou, a postura da primeira-dama conta muito, pois sua função não é um papel decorativo, representa uma extensão da imagem e dos valores do governo.
A expressão “primeira-dama” teve origem nos Estados Unidos e começou a ser usada oficialmente durante o governo de Grover Cleveland, entre 1885 e 1889, quando a esposa do presidente era referida como a “primeira-dama da nação”. Com a proclamação da República no Brasil, o país adotou essa denominação, seguindo o modelo norte-americano.
Há quem questione a relevância desse cargo, mas a verdade é que ele impacta, sim, a percepção pública. No contexto atual, vejo esse papel como o de uma embaixadora não oficial do país, influenciando tanto a imagem interna quanto a externa.
Nesse contexto, é inevitável comparar Janja com outras primeiras-damas, como Ruth Cardoso, que, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, se destacou por sua postura diplomática e pelo trabalho discreto, porém fundamental, em programas sociais e causas humanitárias.
A última primeira-dama, Michelle Bolsonaro, teve um papel importante na promoção de políticas públicas direcionadas a melhorias no atendimento a pessoas com deficiência. Entre suas iniciativas, destaca-se a ampliação do acesso a materiais educativos em Libras e o apoio a diversas instituições de caridade.
Seu crescimento político tem sido tão expressivo que, segundo uma pesquisa do instituto MDA para a Confederação Nacional do Transporte (CNT), divulgada recentemente, Michelle Bolsonaro apresenta um desempenho superior ao do influenciador Pablo Marçal. A pesquisa aponta que, em um cenário onde Jair Bolsonaro não se candidate, Michelle alcançaria 20,5% das intenções de voto, superando Marçal, com 14,1%.
Esse contraste evidencia a importância de uma abordagem equilibrada e cuidadosa por parte de quem ocupa essa posição. A postura deve, portanto, refletir o compromisso com o respeito, a diplomacia e a responsabilidade que o cargo demanda.
Isso não tem a ver com machismo ou feminismo. A falta de contenção nas palavras de qualquer representante do país, seja homem ou mulher, levanta preocupações sobre a percepção internacional do Brasil e se ele pode ser visto como um parceiro confiável e profissional. Criticamos tanto o ex-presidente Bolsonaro por atitudes semelhantes, lembra? Ou seja, não basta ser inteligente; é necessário ter sabedoria.
Relação do Brasil com EUA
A situação é ainda mais delicada pelo fato de Musk ter sido nomeado para chefiar o novo Departamento de Eficiência Governamental por Donald Trump, o que reforça a importância de manter uma comunicação cuidadosa com figuras de influência política e econômica internacional.
Esse acontecimento não pode simplesmente passar batido, afinal, precisamos de pessoas que tenham uma postura que reflita a seriedade e o compromisso com a diplomacia, especialmente em situações de alta visibilidade.
E também não se trata de “ser de esquerda ou de direita”, mas sim de ter responsabilidade, comprometimento e amor ao povo brasileiro. Afinal, quem quer o melhor para o país deve se preocupar, sim, com nossas relações diplomáticas. O Brasil merece líderes que saibam que as palavras têm peso e consequências no palco internacional.
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