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Durante "Copa das Manifestações", baianos colocam bloco da insatisfação nas ruas

Houve mudanças significativas que resultaram na alteração das pautas no Congresso

Retrospectiva 2013|Do R7

Cada um achou um motivo para se reunir no Campo Grande, local da concentração dos manifestantes, e de lá partir pelas ruas de Salvador
Cada um achou um motivo para se reunir no Campo Grande, local da concentração dos manifestantes, e de lá partir pelas ruas de Salvador

Os baianos mostraram que sabem fazer mais que carnaval e, durante o mês de junho, colocaram o bloco da insatisfação nas ruas para protestar contra a corrupção, a falta de educação, saúde e transporte coletivo de qualidade, e os gastos com as Copas das Confederações, em 2013, e a do Mundo, que vai ocorrer em 2014.

Com os investimentos para realização dos eventos esportivos, muitos cidadãos começaram a questionar o empenho dos governantes na construção de estádios para sediar os jogos das Copas, em detrimento da prestação de serviços básicos assegurados pela Constituição. Para o professor Joviniano Neto, sociólogo, doutor em Comunicação e Cultura contemporâneas e professor de Ciência Política da UFBA (Universidade Federal da Bahia), a atitude acabou sendo o estopim para a demonstração do desgosto do povo brasileiro.

— Há um conjunto de causas que foram catalisadas pela Copa das Confederações, que eu prefiro chamar de "Copa das Manifestações".

Cada um achou um motivo para se reunir no Campo Grande, local da concentração dos manifestantes, e de lá partir pelas ruas de Salvador carregando suas expectativas e a esperança de um futuro melhor para o Brasil.


Após várias provas de descontentamento, vale destacar os protestos que ocorreram na capital baiana antes dos jogos da Copa das Confederações entre Nigéria x Uruguai e Brasil x Itália, os soteropolitanos demonstraram que o manifesto pacífico estava disposto a enfrentar a cavalaria, o gás de pimenta e a intolerância da polícia, para mostrar para que veio e ser lembrado na história das manifestações soteropolitanas. A primeira capital do Brasil já havia dado provas de que não fugiria da luta e que já ensinou os brasileiros a se manifestar, há 10 anos, quando estudantes secundaristas se reuniram para protestar contra o aumento da tarifa de ônibus, em 2003, e deram origem a “Revolta do Buzú”.

Mas qual foi o saldo dos protestos após quase seis meses? Quantas reivindicações da pauta do (MPL) Movimento Passe Livre de Salvador foram atendidas? Os mais pessimistas podem achar que não houve nenhum ganho real, pois soteropolitanos não conquistaram o Passe Livre e nem a redução da tarifa. Mas, para um dos integrantes do MPL, Walter Altino, houve mudanças significativas que resultaram na alteração das pautas no Congresso Nacional. Questões mais conservadoras perderam espaço e deram vez a assuntos como reforma política, mobilidade urbana e saúde.


— A mudança se dá na conjuntura política, que alterou. Agente conseguiu alterar a pauta nacional.

Outra conquista ressaltada por Altino foi a inclusão de dois representes do MPL no Concidades (Conselho Estadual das Cidades da Bahia), espaço criado para representantes do governo e da sociedade propor, negociar, e fiscalizar a realização de pautas de interesse público. Durante uma plenária realizada no dia 6 de dezembro foi aprovado uma recomendação para que Jaques Wagner, governador da Bahia, reduza em 7% o valor da tarifa dos ônibus intermunicipais da (RMS) região metropolitana de Salvador . O político, segundo o militante, assumiu o compromisso de reduzir a tarifa, caso ficasse comprovado a viabilidade da proposta durante a reunião no Conselho.


O professor Joviniano Neto também concorda que houve muitas conquistas e a população encontrou um jeito de ser ouvida. De acordo com o sociólogo, depois da onda de protestos será possível tratar o “transporte como um direito de todos e obrigação do estado”.

O Brasil tem um histórico de explosões quando há a possibilidade de aumento do transporte coletivo no país. Isso ocorre porque quem depende do transporte público, em sua maioria, é de baixa renda, ainda segundo o sociólogo.

— Na Bahia e no Brasil há uma tradição de mobilização, principalmente a partir de estudantes, em relação ao aumento de tarifa de ônibus, que é uma coisa que atinge eles e as famílias.

Contudo, o movimento em Salvador pecou pelo excesso de liberdade em não querer nomear uma comissão para falar em nome do movimento. A decisão também foi encarada pelo cientista político de maneira negativa.

— Ele [o movimento] rejeitou a existência de lideranças formais, que dificultou a conversa com interlocutores. Diferente, por exemplo, da “Revolta do Buzú” de 2013, que tinha direção. Era dirigido pelas organizações estudantis, que tinham presidentes, as pessoas que se podiam conversar.

Um reflexo dessa atitude foi o cancelamento da reunião marcada com o prefeito da capital baiana, ACM Neto (DEM). Segundo a assessoria de comunicação do prefeito, os integrantes se recusaram a nomear um grupo para o encontro e queriam que os manifestantes participassem da reunião.

A recusa do governo municipal em receber os militantes foi encarada por Altino como falta de flexibilidade do prefeito para dialogar com os manifestantes.

— O ACM Neto simplesmente se negou a dialogar com o movimento. Todas as falas que ele fazia ou era no sentido de negar que pudesse fazer qualquer tipo de concessão ou era fala de dizer que já estava fazendo.

Ainda segundo a assessoria de comunicação da prefeitura, a possibilidade de redução da tarifa na capital baiana está completamente descartada.

— É economicamente inviável isso aí.

Bom ou ruim, o movimento atraiu a atenção e os holofotes para problemas conhecidos da população brasileira, que conseguiu, ainda que discretamente, pautar direitos básicos que são negligenciados pelos governantes. As manifestações que ocorreram no meado do ano mostram que os brasileiros não vão ficar eternamente “deitados em berço esplendido”, como muitos pensavam.

Seja contra a construção de estádios, corrupção, descaso com a saúde, educação e transporte coletivo, capitalismo, os baianos mostram que têm consciência do poder que as manifestações podem exercer. O sociólogo afirma que os protestos foram tão relevantes que estão e vão influenciar no cenário político em 2014.

— O conteúdo dos programas partidários na televisão muda, incorporando, citando, mostrando imagens da manifestação de junho. Não só partidos de oposição ao governo Dilma, como [também] partidos da base. O quanto eles se apropriam para manipular e manter as coisas como estão e quanto aprenderam para mudar a realidade, para permitir o avanço à democratização da sociedade, são outros quinhentos.

Fora da Capital

Os protestos também ganharam destaque fora da capital baiana. Segundo o militante do MPL de Salvador, as manifestações foram bem expressivas nas cidades de Camaçari, na RMS, onde houve redução de até R$ 0,20 na tarifa de ônibus; em Teixeira de Freitas, local onde os estudantes matriculados na rede pública e privada de ensino ganharão o Passe Livra a partir do início do ano levito de 2014; em Feira de Santana, cidade que os manifestantes conseguiram a redução de R$ 0, 15 na tarifa; e em Barreiras, onde o valor do transporte coletivo não foi reajustado por causa do levante popular.

O valor pode parecer pouco representativo, mas os manifestantes não ganharam as ruas e a simpatia da opinião pública, segundo o sociólogo, por R$ 0,20, frase constantemente citada para justificar tanta indignação.

O professor Joviniano Neto enfatiza que as mobilizações sociais são válidas, mas “desde que encontre canais para que sejam processadas e transformadas em leis”.

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