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Incêndio no hospital: 'Alguns rostos não me saem da cabeça', diz médico

Cirurgião Eric Frederik ajudou a salvar 6 pacientes em tragédia no Rio e viu pessoas nos corredores que provavelmente não foram resgatadas

Rio de Janeiro|Marcos Rogério Lopes e Bruna Oliveira, do R7

Eric machucou apenas o polegar
Eric machucou apenas o polegar Eric machucou apenas o polegar

O cirurgião plástico Eric Frederik, de 43 anos, admite não ter parado para pensar ainda em tudo o que viveu no fim da tarde de quinta-feira (12), durante a tragédia ocorrida no Hospital Badim, zona norte do Rio de Janeiro. Ele estava no quarto andar do edifício quando foi avisado do fogo e deslocou-se até o térreo com outros funcionários do local levando uma paciente. Eram 17h45. Logo depois, voltou ao prédio em chamas, para o número 223, no segundo andar, onde estavam as outras cinco pessoas que ajudou a salvar do incêndio responsável por 11 vítimas fatais. "Nesse caminho, vi vários doentes que ficaram por li, que provavelmente não foram resgatados. Alguns rostos não me saem da cabeça", afirma. 

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Eric subiu e desceu as escadas externas do edifício mais cinco vezes, carregando pacientes com dificuldade de locomoção até as equipes de resgate lá embaixo. "Em situações assim a gente faz o máximo, vai no nosso limite. Eu percebi que até certo ponto eu estava seguro, mas é claro que havia risco, só não dava para pensar nisso naquela hora", contou o paulistano que mora há 12 anos no Rio de Janeiro. "Eu só queria pegar o maior número de pessoas possível."

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Fogo foi notado no fim da tarde de quinta-feira
Fogo foi notado no fim da tarde de quinta-feira Fogo foi notado no fim da tarde de quinta-feira

O médico conta que recebeu uma ligação de sua esposa durante os resgates e ele disse, às pressas, que estava no meio de um incêndio. "Ela achou que era modo de dizer, que eu estava com problemas no trabalho ou algo do tipo, e tive que explicar: 'Não, o prédio está pegando fogo de verdade'." 

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Quando voltou para casa, à noite, um dos dois filhos o alertou que ele estava com o nariz preto, por causa da fuligem, e o outro quis saber se o pai tinha sido um super-herói como os da televisão, salvando a vida das pessoas. "Eu já havia visto isso em filmes, mas nunca pude imaginar que algo parecido poderia ocorrer comigo", relatou Eric a amigos na sexta-feira (13), pelo WhatsApp. O texto foi publicado logo depois no site do Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro (leia no fim dessa reportagem).

"Eu já avisei minha mulher para me acompanhar com cuidado e não sair de perto de mim por um tempo", comentou o cirurgião. O médico diz que teve poucas chances de pensar no assunto, mas, até por causa de sua profissão, sabe que após eventos assim os envolvidos direta ou indiretamente em tragédias ficam traumatizados e isso pode se refletir em falta de ânimo e tristeza em excesso. "Tive o aconselhamento de amigos e não parei de trabalhar. Tenho uma rotina pesada e talvez isso ajude de alguma forma."

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Eric machucou apenas um dedo, o polegar, dolorido por tanto levantar macas e pacientes, fez exames logo após o incêndio e constatou não ter fumaça nos pulmões. Deu sorte, mas já começa a fazer reflexões que vão além daquela tarde. "Não tem como a gente não repensar a vida inteira. Talvez seja hora de desacelerar um pouco, pensar mais na família, ficar mais com os filhos..."

Leia o relato de Eric Frederik, publicado um dia após a tragédia:

Bom dia amigos, gostaria de dar aqui o meu testemunho, entrei no centro cirúrgico do Badim ontem às 14h, em torno de 17:45, no decorrer da cirurgia que auxiliava, fomos informados de fogo no prédio antigo e por isso, deveríamos evacuar imediatamente o centro cirúrgico. Eu já havia visto isso em filmes, mas nunca pude imaginar que algo parecido poderia ocorrer comigo. Eu, 3 funcionários do hospital e a anestesista colocamos a paciente ainda intubada numa preencha, só deu tempo de pegar uma bala de O2, um ambu e descer os 4 andares pela escada ventilando na mão. Na rua, conseguimos entubar a paciente que foi transferida para o Rios D’Or. No caminho dos andares me impressionou a capacidade de mobilização dos funcionários para o resgate de todos os pacientes. Se não fosse por eles, imagino uma tragédia maior. Havia um direcionamento muito eficaz agrupando os pacientes no quarto 223 que dava acesso às escadas laterais do prédio anexo. Isso gerou um fluxo ordenado de saída. Por conta dessa sinalização, não vi ninguém perdido pelos corredores, o que deve ter salvado muitas vidas. Utilizando essa escada externa, consegui subir outras 5 vezes descendo com pacientes que estavam sem possibilidade de caminhar, um deles da rpa ainda sob efeito de raquianestesia. Não foi fácil, pois devido ao peso, eram necessárias no mínimo 6 pessoas para descer cada paciente com segurança. Felizmente, com o grupo de funcionários ali presente fomos capazes de descer o máximo de pacientes possível, até que os bombeiros chegassem. Não havia fogo, mas a fumaça quente se formou muito rápido e em minutos não era possível enxergar. Eu particularmente fico sentido por não conseguir ter feito mais, eu vi ao menos 7 leitos com pacientes em ventilação mecânica que não conseguimos retirar a tempo até que os bombeiros impedissem nossa subida devido ao risco inalatório. A partir daí somente eles com máscaras de oxigênio eram capazes de acessar o prédio. Não sou funcionário da rede, apenas um cirurgião que estava operando no momento do incidente. A meu ver, se não fossem a garra e organização dos funcionários para salvar o máximo de pacientes possível nos 45minutos cruciais (até a chegada dos bombeiros) imagino um tragédia muito pior. Na hora havia cerca de 200 funcionários e 100 pacientes, a capacidade de resgate desses 200 heróis foi algo sobre humano. Merecem o meu máximo respeito e admiração pelo comprometimento em não apenas cuidar, mas salvar vidas. Aos colegas da rede, diretoria do hospital e familiares de pacientes fica aqui meu sincero sentimento pelo ocorrido.

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