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Um mês sem Amarildo: desaparecimento continua sem solução e versões diferentes confundem polícia

Comoção criou imagem de vítima, mas delegado diz que Amarildo tinha relação com tráfico

Rio de Janeiro|Do R7

A noite do dia 14 de julho de 2013 será sempre lembrada pela família de Amarildo Dias, um ajudante de pedreiro, morador da Rocinha, casado e pai de seis filhos. Nesta data, enquanto limpava peixes na escada de casa, ele foi abordado por policiais da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora), que davam apoio à Operação Paz Armada, organizada para prender traficantes que resistem à pacificação e continuam vendendo drogas na favela da zona sul carioca. Amarildo nunca mais foi visto. Sem solução, o sumiço dele completa um mês nesta quarta-feira (13), com pistas confusas e caminhos incertos, que o levam de vítima da PM a colaborador do tráfico.

O caso envolvendo o ajudante de pedreiro começou a ganhar destaque no dia 17 de julho, quando moradores da Rocinha se reuniram na autoestrada Lagoa-Barra, em frente à passarela que dá acesso à comunidade, para protestar. Cerca de mil pessoas interditaram a via, deram um nó no trânsito da zona sul e fizeram ecoar pela primeira vez uma das perguntas mais feita hoje em dia: Cadê o Amarildo?

A revolta da favela se espalhou pelo Rio e, logo, ganhou o Brasil e o mundo. Os movimentos populares que lutam por reforma política, pedem a saída do governador Sérgio Cabral e exigem passe livre nos ônibus encamparam a luta. Pouco depois, manifestantes de outros Estados ergueram cartazes por Amarildo. Na internet, a campanha se tornou um “viral” e ganhou reforço na Espanha, Inglaterra, Estados Unidos e outros países pelo globo.

A medida que o desaparecimento de Amarildo se tornou notório, a polícia intensificou as investigações. Durante os primeiro quinze dias, coube à Delegacia da Gávea (15ª DP) cuidar do caso. O delegado Orlando Zaccone conversou com policiais da UPP e ouviu o testemunho de moradores, mas nenhuma pista concreta apareceu. Como medida cautelar, o comando da UPP Rocinha afastou quatro PMs suspeitos de terem abordado o pedreiro. Todos foram deslocados para o setor de serviços administrativos e lá ficarão até que alguma conclusão seja tomada.


Assim que o sumiço completou duas semanas, a Divisão de Homicídios assumiu o caso. Rivaldo Barbosa, titular da DH, também percorreu a comunidade, falou com policiais e conversou com uma série de moradores. Cerca de 14 PMs prestaram depoimento na sede da DH, na Barra da Tijuca, zona oeste. Um deles, o soldado Juliano da Silva Guimarães, disse que um tiro, motorista de um caminhão de lixo, foi obrigado por traficantes a retirar um corpo da Rocinha e levar para um depósito na zona portuária. De lá, o lixo seguiu para o Aterro Sanitário de Seropédica, na Baixada Fluminense. Buscas foram feitas, inclusive com acompanhamento do Ministério Público. Nenhum vestígio foi encontrado.

A versão de que Amarildo teria sido morto pelo tráfico de drogas foi levantada também pelo delegado Ruchester Marreiros, que acompanhou os primeiros passos da investigação na 15ª DP, antes de ser transferido. O relatório concluído por Marreiros aponta o ajudante de pedreiro e sua mulher, Elizabete Gomes da Silva, como colaboradores do tráfico de drogas. Perguntada sobre as suspeita levantadas, Elizabete negou e disse que “para falar tem que provar”.


Escutas telefônicas feitas com autorização da polícia captaram uma conversa na qual um traficante conhecido como Catatau fala com um policial infiltrado no tráfico sobre o desaparecimento de Amarildo. Segundo o criminoso, Boi, como seria chamado o pedreiro, foi morto para jogar a população contra o comandante da UPP da Rocinha. A conversa, que faz parte do material colhido pelo delegado Ruchester, teria ocorrido quatro dias após o sumiço de Amarildo. Em um dos trechos, Thiago da Silva Mendes, o Catatau, diz que "tombaram o Boi, esposo da Beth". A Beth citada seria a mulher de Amarildo.

De acordo com depoimento de um homem torturado pelo tráfico e que também faz parte do material apresentado por Ruchester, Amarildo foi morto pelo bando do traficante Djalma, que controla parte do movimento de drogas na comunidade e disputa pontos com outro traficante, o Johnny.


— O comentário lá do pessoal é que Djalma ficou sabendo que o Amarildo era envolvido como pessoal do Catatu e do Johnny e pegaram ele.

O relatório de Ruchester Marreiros se baseia em depoimentos de moradores, policiais e vídeos de testemunhas que afirmam ter sido torturadas na casa de Amarildo, que seria alugada pelos criminosos. Uma das testemunhas que gravaram depoimento aparece com as duas mãos enfaixadas e diz ter sido torturada no quintal da casa onde Amarildo vivia com a família.

— Eles me botaram sentado na escada da porta da Beth. Ela é conhecida minha. Aí ela comentou: “você vai tomar um coro, né?”. Eu falei: “pô, acho que vou”. Então você vai ser o nono [disse ela]. Quebraram minhas duas mãos e me queimaram todo, no peito, na barriga, tudo.

Sem solução e com versões desconexas, o caso Amarildo continua dividido entre as suspeitas de envolvimento com o crime organizado da Rocinha e a comoção geral em torno do desaparecimento. No domingo passado (11), Dia dos Pais, artistas, familiares do pedreiro e moradores da comunidade, se reuniram para mais uma vez perguntar sobre o paradeiro do personagem que fez saltar aos olhos do mundo questões levantadas em torno da relação instável entre UPPs e comunidades pacificadas.

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