A 2ª Câmara do TCE-SP (Tribunal de Contas do Estado de São Paulo) considerou "legais" e "regulares" três contratos do projeto do Centro Cultural Luz, que jamais saiu do papel. O acórdão foi publicado no Diário Oficial no último dia 4.
O governo pagou mais de R$ 37,3 milhões (R$ 64,5 milhões em valores corrigidos pela inflação) a uma consultoria inglesa e a um escritório de arquitetura suíço pelas plantas e estudos.
A proposta de ocupar um terreno na região central de São Paulo com o Complexo Cultural Luz - Teatro de Dança, com 85 mil m², foi apresentada há mais de dez anos, durante o governo de José Serra (PSDB). Os contratos foram assinados em 2010 e 2011.
A ideia era construir "um teatro para dança e ópera de 1.750 lugares, outro para 600 ocupantes, destinado a recitais e teatro; uma sala experimental para novos formatos com capacidade para 400 expectadores; uma escola de música; uma escola de dança; e salas de ensaio para companhias residentes".
A consultoria inglesa (Theatre Projects Consultants) foi, com dispensa de processo licitatório, contratada por R$ 3,42 milhões (mais de R$ 5,9 milhões em valores atualizados) para "prestação de serviços de consultoria consistente no planejamento e no desenvolvimento" do complexo.
Em seguida, vieram dois contratos, também sem licitação, com renomado escritório de arquitetura suíço Herzog & De Meuron: um de R$ 3,17 milhões e outro de R$ 30,7 milhões, sendo um para estudos preliminares e o segundo para o projeto básico.
Em 2014, o R7 noticiou que o governo paulista já havia gasto R$ 49 milhões com o projeto, devido à variação cambial, já que se tratou de contratação internacional.
Ao longo do processo no TCE-SP, auditores da Unidade Especializada de Engenharia emitiram parecer contrário à contratação do Herzog & De Meuron para a elaboração do projeto básico, "por entender que há escritórios nacionais com capacidade e reconhecimento internacional para execução do objeto, sugerindo que a solução mais adequada seria o concurso", destacou o relator, auditor-substituto de conselheiro Antonio Carlos dos Santos — que ocupa a função do titular, Robson Marinho.
Em seu voto, Santos concordou com os argumentos do governo de que as características do projeto "demonstram o ineditismo e complexidade do objeto, conferindo-lhe a natureza singular exigida pela lei", o que justifica não ter havido concorrência pública nas contratações.
"Vê-se, assim, que ambas as empresas contratadas gozam de expertise comprovada, premiações e reconhecimento internacional, atributos suficientes para qualificá-las como altamente especializadas, preenchendo, de modo inquestionável, o requisito da notória especialização."
Passados mais de nove anos, o terreno onde seria construído o Complexo Cultural Luz já ganhou outra destinação: moradias populares e um hospital da mulher — este último ainda será construído.
Por este motivo, o conselheiro do TCE fez um alerta para que a Secretaria Estadual da Cultura "reavalie todas as questões que possam interferir direta ou indiretamente na implementação da obra do Complexo Cultural Luz - Teatro da Dança, cujos estudos preliminares e projeto básico, objeto dos contratos nºs 275/2008 e 14/2010, já foram concluídos e pagos pela Administração".
"A não utilização de tais projetos, reprise-se, concluídos e pagos, certamente resultará em efetivo dano ao erário, à vista do alto custo despendido com sua elaboração."
O então secretário estadual da Cultura, João Sayad, e a secretaria negaram ao longo do processo qualquer irregularidade na contratação.
Procurada, a Secretaria de Cultura e Economia Criativa de São Paulo informou "que ainda não foi notificada da decisão do TCE".
"Assim que acontecer, tomará imediatamente as medidas cabíveis. A atual gestão reitera seu compromisso com a transparência, a ética e o uso adequado e responsável de recursos dos contribuintes."