Eleições de 2017 na França, Reino Unido e Alemanha definem o futuro de uma nova Europa
Ao contrário do que se previa, especialista vê em andamento abertura para era multicultural
Internacional|Eugenio Goussinsky, do R7
O chamado núcleo da Europa, baseado na tradição de França, Alemanha e Reino Unido, se depara neste momento com sua história e seu futuro. Três importantes eleições marcam neste ano o destino destes países, em meio à dúvida se o continente se manterá enraizado em tradições nacionalistas ou abrirá suas fronteiras para uma nova Europa.
A tendência agora, segundo o francês Yann Duzert, especialista em negociações e professor da FGV, entre outras, é a população tomar para si a responsabilidade de reinventar o estilo europeu, tornando-se mais aberta para um multiculturalismo que já é uma realidade. Se não for assim será o caos, diz ele.
— Agora a construção de uma identidade europeia está acima do jeito tradicional de viver francês, inglês e alemão, para a formação de uma mentalidade multicultural. A Europa não pode ser um vasto aeroporto onde as pessoas se sintam perdidas, o desafio atual é encontrar uma cultura comum, um jeito de civilização em comum, uma cooperação de trabalho e não ficar só preso tanto ao neoliberalismo, às velhas tradições ou conceitos.
Um exemplo, segundo ele, já pode ser constatado na eleição de Emmanuel Macron, do partido Em Marcha!, no início de maio último. Foi a primeira, desta tríade eleitoral que movimentará o ano europeu, e significativa, na opinião do professor.
— Tínhamos, de um lado a esquerda extremista e do outro a direita que radicalizou, ultraliberal e nacionalista. Macron, fora dos partidos tradicionais, achou a moderação suficiente para atrair centro-direita e a esquerda moderada. Macron quis mostrar que existe uma novia identidade europeia.
Eleições na França: cinco razões para entender a vitória de Macron
Neste sentido, a ameaça nacionalista e xenófoba, tão presente a partir do início da crise dos refugiados que vinham pelo Mediterrâneo, em meados de 2015, pode estar sendo dissipada. "Nada de Le Pen, que pena que houve o Brexit, vamos evitar que o extrema-direita AfD vença Angela Merkel na Alemanha"...são os pensamentos que parecem começar a trazer novos ventos mediterrâneos para o velho continente, conforme frisa Duzert.
— Nos tempos em que entramos, a mobilidade é necessária para lidar com as novas tecnologias, os novos problemas. Não podemos só preservar o passado, empregos do passado, regiões mineiras do passado. A realidade é que hoje, na França, por exemplo, já há cerca de 10 milhões de muçulmanos, árabes e africanos.
Europa urbana
As eleições parlamentares na Alemanha estão marcadas para o dia 24 de setembro. A chanceler Merkel busca o quarto mandato à frente do governo. Na França, Macron superou a disputa com a radical de direita Marine Le Pen.
E no Reino Unido, a primeira-ministra Theresa May antecipou as eleições, que deveriam ocorrer em 2020, para o próximo dia 8, tentando se fortalecer para implementar o Brexit. No entanto, seguindo a tese de Duzert, boa parte da população local é contrária à saída do país da União Europeia. Ele considera que, no referendo de 2016, os eleitores dos centros urbanos, que formam a maioria, não participaram como deveriam.
— Foi um dia de chuva pesada, a população urbana não foi votar, e a rural, que não se reconhece na vida urbana e no mundo globalizado, rejeitou esse valores. Acontece que a Europa hoje é regida pelos grandes centros urbanos cosmopolitas. Por isso May não tem a garantia de que vencerá.
Custos do Brexit podem ultrapassar os 340 bilhões de reais
Velhos sentimentos ainda prevalecem nos países europeus. Mas, antes, as revoltas de um se espalhavam para outros, em forma de revoluções sangrentas, como as que compuseram a Revolução Francesa entre 1789 e 1799. Depois vieram conflitos como as revoluções liberais, também disseminadas pelo continente, que causaram, por exemplo, a separação da Bélgica dos Países Baixos.
Novamente, a Europa está diante de um novo ciclo. Mas, agora, a insensatez de alguns que detêm o poder, ainda presente, é revelada muito mais nos votos, na postura, do que no sangue. O continente, berço das transformações mundiais, vive, neste momento, uma nova etapa de uma revolução permanente. Por isso, Duzert completa:
— A transformação da sociedade, de forma criativa, sempre foi importante na história do continente.