Após manobra para esvaziar CCJ, votação da reforma tributária é adiada novamente no Senado
Senadores não registraram presença e sessão foi cancelada por falta de quórum; texto não tem acordo para votação
Brasília|Sarah Teófilo, do R7, em Brasília
A votação da reforma tributária na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado foi adiada novamente após uma manobra de obstrução de parlamentares contrários à proposta. O grupo não registrou presença para evitar que a sessão tivesse o quórum mínimo para ser aberta. No caso da CCJ, são necessários 14 registros de presença, que chegaram a ser realizados na manhã desta terça-feira (31). O senador Jorge Kajuru (Podemos-GO), no entanto, retirou a presença e a sessão foi cancelada pelo presidente, Davi Alcolumbre (União-AP).
Senadores contrários à reforma, como Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), afirmaram antes do início da sessão que tentariam obstruir a votação, como ocorreu em abril, última tentativa de votação da matéria. Esta foi a quarta vez que o assunto foi levado à pauta da comissão, mas sem sucesso.
Agora, a possibilidade de aprovação do texto neste ano eleitoral se torna ainda mais remota, com a aproximação do recesso que antecede as eleições gerais. Não há previsão de nova votação do projeto, tampouco se será pautado novamente neste ano. O senador Omar Aziz (PSD-AM), por exemplo, integrante da CCJ e contrário ao texto, diz que a matéria não será analisada neste ano. "Nessa altura do campeonato?", questiona.
Após o cancelamento da sessão, o relator, Roberto Rocha (PTB-MA), criticou de forma dura a postura dos colegas, dizendo que há um boicote ao projeto causado pelo "lobby de poderosos". "Se há um dia nesses oito anos de mandato que eu estou decepcionado com o meu Parlamento é hoje, porque o presidente Rodrigo Pacheco tem demonstrado interesse de votar, mas percebe-se que é uma luta em vão, porque há movimentos de um lobby poderossísimo, que não é de pobre. Qual o pobre que vai sair prejudicado?", questionou.
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Rocha pontuou que a obstrução é um instrumento da minoria que é legítimo quando não se tem maioria para deliberar, mas que foi usada por partidos que compõem a maioria no Senado, como o MDB e o Podemos. "Onde já se viu obstrução de maioria? Há uma clara tentativa de não decidir", ressaltou.
A matéria é polêmica e não tem consenso. O principal ponto da reforma é a junção de tributos, com o estabelecimento do IVA (Imposto sobre Valor Agregado) dual com sistema eletrônico de cobrança, para trazer uma "unificação da base tributária do consumo".
O IVA é dual porque cria um tributo federal, chamado de CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), que envolve PIS, Cofins e IPI; e outro IVA para estados e municípios, intitulado IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), que envolve a unificação do ICMS e do ISS. Como impacta a tributação em diversos serviços, desagrada a diferentes segmentos.
Ao criticar o texto, Oriovisto diz que trata-se do "remédio errado" para o problema. "A PEC 110 não resolve os probelmas tributários e cria outros. Arrasa com o setor de serviços. Não tem sentido essa PEC. E vem numa época em que tudo vai parar daqui a pouco por causa das eleições. Não faz sentido", disse.
Omar Aziz afirma que não há ambiente favorável para apreciar o assunto no Congresso neste ano, e critica que o texto joga as definições de novas regras para leis complementares. "Quando remete uma PEC a leis complementares não tem garantia que no ano que vem, com novos membros, você vai votar alguma coisa", pontuou. O relator rebate o argumento dizendo que o texto trata-se de uma emenda constitucional, e que não é possível, por exemplo, prever alíquotas na Constituição, deixando isso para leis complementares.
A reportagem apurou que não houve acordo para levar a matéria para análise da comissão nesta semana. A ação foi uma tentativa do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que quis aproveitar a semana do esforço concentrado, com análise de indicação de autoridades, com a expectativa de ter um quórum alto para conseguir aprovar o assunto no plenário.
Desde o início do ano o senador diz que a reforma é prioridade no Senado. Nos bastidores, comenta-se que Pacheco tem sido pressionado para aprovar a matéria ainda neste ano. A medida é um dos desafios em ano de eleições majoritárias, já que o Congresso começa a ficar mais esvaziado após o recesso de julho, devido às campanhas eleitorais.
Imbróglio na CCJ
A última vez que a matéria entrou na pauta da comissão foi no dia 6 de abril, justamente em uma semana de esforço concentrado, junto com o projeto de lei que flexibiliza as regras e o acesso a armas para colecionadores, atiradores desportivos e caçadores (CACs). A sessão foi cancelada por falta de quórum, apesar de os senadores estarem em peso no Senado.
O esvaziamento na reunião foi uma manobra de obstrução de boa parte dos senadores para evitar a análise da reforma e do projeto dos CACs. A ocasião era uma aposta de Pacheco para conseguir levar a reforma ao plenário do Senado, mas a proposta não teve andamento na CCJ.
A reforma chegou à comissão em outubro, mas é alvo de resistência por parte de municípios e de alguns setores. No fim do ano, na sessão do dia 8 de dezembro, houve intensa discussão quando o relator Roberto Rocha tentou fazer a leitura do relatório. "Custo a acreditar qual a razão para negar a leitura de um relatório feito há três anos", afirmou na época. Alcolumbre manteve para este ano a análise e a leitura.
A última vez que o assunto foi debatido na comissão foi no dia 16 de março, quando Rocha apresentou o novo parecer com acolhimento de emendas. A matéria ainda é alvo de resistência. De maneira geral, os senadores afirmam que o texto poderia gerar insegurança, aumento de tributação e redução de investimento.