Brasil pode reduzir 80% de emissões por energia em meio a crescimento econômico
Relatório divulgado nesta terça-feira aponta potencial do Brasil para descarbonizar setores produtivos
Brasília|Hellen Leite, do R7, em Brasília
Até 2050, o Brasil pode reduzir as emissões de carbono do setor de energia em aproximadamente 80% em relação aos níveis atuais. Esse dado é destacado no estudo “Futuro da Energia: Visão do Observatório do Clima para uma Transição Justa no Brasil”, divulgado nesta terça-feira (22). Essa redução seria viável sem a adoção de soluções como a captura e armazenamento de carbono, além de não exigir a expansão da produção de combustíveis fósseis.
Veja mais
“O relatório demonstra que é possível reduzir o uso de combustíveis fósseis, mesmo em um cenário de crescimento econômico. Através de análises técnicas, mostramos que podemos corrigir rotas equivocadas e contribuir para que o Brasil se torne um país carbono negativo até 2045 “, afirma Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima.
Leia também
Na matriz elétrica brasileira, as hidrelétricas continuam a ser a principal fonte de energia, respondendo por 58,9% da produção total em 2023. A geração eólica segue em segundo lugar, com 13,2%, seguida pela biomassa (conjunto de resíduos de origem animal ou vegetal usado na produção de energia), que contribuiu com 8%, e pela geração solar, com 7%. O gás fóssil representou 5,3% da produção elétrica, enquanto a energia nuclear ficou com 2%. O carvão e seus derivados somaram 1,9%, e os derivados de petróleo corresponderam a 1,5%. A eletricidade importada teve uma participação de 2,1%.
O trabalho considerou um crescimento médio do PIB de 2,1% ao ano até 2050, usado como base para calcular a demanda energética e as emissões de gases de efeito estufa de cada atividade no setor de energia. Com essa projeção de crescimento, a previsão é que o setor de energia emita 102 milhões de toneladas de CO2 até 2050.
O relatório também analisou cenários de crescimento inferior (1,3% ao ano) e superior (2,8% ao ano), mostrando como isso afetaria a demanda energética e as emissões de gases de efeito estufa no país.
Transporte de cargas é principal emissor de gases
O estudo mostra que o setor de transporte de cargas, ainda predominantemente rodoviário, será a principal fonte de emissões de gases de efeito estufa no setor de energia em 2050, respondendo por 38% do total. A redução das emissões desse setor será lenta até 2040, mas a partir daí, a utilização do diesel verde deve acelerar a diminuição. As emissões do transporte de cargas devem cair de 115 milhões de toneladas (MtCO2e - megatoneladas de dióxido de carbono equivalente) em 2022 para 38 MtCO2e em 2050.
Por outro lado, o transporte de passageiros, que representará 16% das emissões em 2050, terá um potencial maior de redução.
“O conjunto de possibilidades para reduzir as emissões são promissoras, com investimento na oferta de transporte público coletivo por ônibus, metrô, VLT e na infraestrutura para o uso das bicicletas em detrimento dos automóveis individuais. Além disso, este cenário projeta uma completa substituição da gasolina por etanol nos veículos flex até 2035, dado o potencial que o país tem de produzir mais do biocombustível acompanhado da gradual eletrificação da frota”, diz o estudo.
A produção de combustíveis, que será o terceiro maior emissor, verá uma diminuição das emissões de 42 MtCO2e em 2022 para 14 MtCO2e em 2050, acompanhando a redução da demanda.
A indústria metalúrgica também passará por mudanças, substituindo o carvão por eletrificação e hidrogênio, reduzindo suas emissões de 56 MtCO2e para 5,4 MtCO2e até 2050.
Setores como a indústria química e de cimento deverão adotar eletricidade e biomassa, reduzindo suas emissões de 52 MtCO2e para 9,3 MtCO2e no mesmo período. Na agropecuária, a eletrificação e o uso de biocombustíveis devem levar as emissões a 9,1 MtCO2e, enquanto as edificações devem reduzir para 6,6 MtCO2e.
A demanda por eletricidade aumentará com a eletrificação de setores e a ampliação das fontes renováveis, como solar e eólica. Em 2050, espera-se que as emissões da geração elétrica cheguem a 2,7 MtCO2e, representando 3% do total de emissões do setor de energia.
“Se investir na transição energética é útil para qualquer país, isso é especialmente válido para países em desenvolvimento, uma vez que precisam expandir sua infraestrutura numa proporção maior que os países desenvolvidos. Alocar recursos nas energias renováveis garante que o país diminua a necessidade de subsidiar os combustíveis fósseis, de custear seus impactos à saúde pública e de refazer investimentos para concluir sua transição energética. Também possibilita a alocação de recursos do bônus da transição para ações que visem combater as desigualdades historicamente perpetuadas no Brasil. Ademais, avançar na descarbonização da matriz energética eleva a influência do Brasil nas negociações internacionais — não apenas climáticas, mas também comerciais”, afirma o estudo.