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'Desenrola', programa do governo Lula para renegociação de dívidas, 'não resolve', apontam especialistas

O programa deve ser lançado neste mês, mas não está pronto; a iniciativa beneficiará quem ganha até dois salários mínimos

Brasília|Ana Isabel Mansur e Plínio Aguiar, do R7, em Brasília

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, durante entrevista em Brasília
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, durante entrevista em Brasília

O programa Desenrola, voltado para a renegociação de pequenas dívidas, não deve solucionar o problema do endividamento da população brasileira, que atinge 78,9% das famílias do país. O diagnóstico é de especialistas consultados pelo R7, que apontaram a baixa cobertura do programa, cujo lançamento deve ocorrer ainda neste mês.

Até esta terça-feira (14), porém, às vésperas da segunda quinzena de fevereiro, o Desenrola não tinha sido lançado. Procurado pela reportagem, o Ministério da Fazenda informou apenas que "ainda não há previsão nem detalhes, faremos uma ampla divulgação quando a data for definida".

A iniciativa foi anunciada no início de janeiro pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e está sendo feita em parceria com a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), que, até a última atualização deste texto, não deu retorno aos questionamentos feitos pelo R7.

Segundo fontes do governo, o público-alvo do programa são as pessoas que recebem até dois salários mínimos, cerca de R$ 2.600. O cálculo do Executivo federal é de que há 50 milhões de brasileiros endividados nessa faixa de renda.


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"Cinquenta milhões de negativados. Essa é a população de zero a dois salários mínimos que, em geral, está em outros programas sociais. Se não desatar o nó do alto endividamento no período pós-pandemia, não vai reestruturar as famílias", afirmou Haddad, na semana passada.

Desenhado pelo ministro e pela equipe da Fazenda, o Desenrola deve oferecer um desconto mínimo obrigatório a ser ofertado aos endividados. Ainda não há uma taxa definida. O programa deve ter um prazo mínimo e um máximo para o pagamento parcelado.


Ainda pelo esboço, cada credor teria liberdade para determinar o percentual do desconto que vai ofertar, além desse mínimo. Falta definir, porém, se o desconto vai incidir sobre juros de mora, valor de face da dívida ou condições do pagamento.

Críticas

Alessandro Azzoni, advogado e economista, observa que os atuais endividados contraíram débitos para não ficar inadimplentes durante a pandemia de Covid-19, por causa da perda de emprego, com a ideia de que se recolocariam no mercado de trabalho com a reabertura da economia. Nem sempre, porém, essa recolocação foi alcançada, e alguns devedores acabaram se tornando inadimplentes.


"Essa iniciativa não atende a todos. O importante é que esse programa atinja uma camada maior do que só essa faixa salarial [de até dois salários mínimos] para se tornar realmente eficiente", afirma Azzoni, que também é conselheiro deliberativo da Associação Comercial de São Paulo (ACSP).

César Bergo, economista e professor da Universidade de Brasília (UnB), concorda com o colega. "Normalmente, programas dessa espécie não são suficientes para contemplar a todos. Auxilia, mas não resolve", diz. Para ele, o ponto de corte de dois salários mínimos mira os cidadãos com menos recursos.

O professor explica que, para o Desenrola, serão concedidos benefícios fiscais às instituições financeiras que receberão os valores dos endividados.

"A participação do governo funciona como uma garantia para os credores. Para eles, é uma oportunidade de trocar um recebimento incerto por uma possibilidade real de receber parte do valor", observa Bergo. "Os credores que aderirem ao programa devem renunciar ao recebimento de direitos e, em contrapartida, vão receber benfícios fiscais do governo, como algum tipo de desoneração", explica. 

Bergo pondera, no entanto, sobre a atual situação fiscal do país. "Sabemos que, hoje, o governo tem sérios problemas na condução das contas públicas. Parte dos recursos [para o Desenrola] podem ser conseguidos com transferências internas de outros programas e com ganhos de arrecadação obtidos com a melhoria do ambiente econômico, em função da provável queda da inamimplência", completa o economista.

Alternativas

Para deixar o Desenrola mais robusto, Azzoni sugere parcerias com outras instituições financeiras além dos bancos. "A maioria das pessoas endividadas está em débito com cartão de crédito, crédito consignado ou crédito direto ao consumidor. Essas modalidades têm taxas de juros muito altas, então a quitação fica impraticável. Esse programa tem de ter convênio diretamente com o Serasa e a Boa Vista, por exemplo, que são birôs de crédito, e com o sistema financeiro, justamente para habilitar a isenção de juros e o programa aplicar juros subsidiados, que são mais baixos que a Selic", explica Azzoni.

Ele aconselha, ainda, que as condições do Desenrola sejam claras para o devedor. "As famílias, muitas vezes, não sabem mais o valor principal que foi acordado nem a origem da dívida, porque vêm pagando juros sobre juros. O valor principal, nesses casos, até já pode ter sido pago", observa o economista.

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