Mapa da Fome: o que ainda falta para o Brasil acabar com a insegurança alimentar
Quase 7 milhões de brasileiros ainda lidam com a insegurança alimentar grave, apesar de o país ter saído do Mapa da Fome
Brasília|Yumi Kuwano, do R7, em Brasília
RESUMO DA NOTÍCIA
Produzido pela Ri7a - a Inteligência Artificial do R7

Não saber o que haverá na mesa na próxima refeição é a realidade de milhões de brasileiros. Embora o país tenha deixado o Mapa da Fome da ONU, mais de 13% da população enfrenta insegurança alimentar moderada ou grave, convivendo com severas restrições no acesso e na qualidade dos alimentos.
Na última semana, a Organização das Nações Unidas anunciou que o Brasil deixou oficialmente o Mapa da Fome em 2025, ao registrar menos de 2,5% da população em risco de subnutrição ou com acesso insuficiente à alimentação. Essa condição havia sido alcançada em 2014, mas o país retornou ao indicador negativo no período de 2019 a 2021.
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Segundo Elisabetta Recine, professora da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília (UnB) e única brasileira no Painel de Especialistas de Alto Nível do Comitê de Segurança Alimentar Mundial da ONU, o resultado é fruto de articulação entre políticas públicas, programas multissetoriais e participação social.
“O Brasil conta, desde 2006, com o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan), responsável por integrar diferentes áreas do governo em ações que vão da produção ao abastecimento de alimentos, além de ampliar o acesso da população à comida de qualidade”, explica Elisabetta.
A pesquisadora destaca iniciativas decisivas para a melhoria do cenário: o Programa de Aquisição de Alimentos, o Plano Nacional de Abastecimento Alimentar, o Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica, o Alimenta Cidades, a atualização do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), além da reestruturação do Bolsa Família, valorização do salário mínimo e apoio à agricultura familiar.
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Avanço simbólico, mas fome persiste
“Estar fora do Mapa da Fome representa um marco técnico e simbólico, porém não significa que o problema tenha sido resolvido”, alerta Kiko Afonso, diretor-executivo da ONG Ação da Cidadania.
Para ele, as ações do governo federal foram fundamentais para esse avanço, mas é preciso ir além da manutenção de programas.
“É hora de expandir o entendimento e integrar alimentação com saúde, educação, agroecologia, clima e território. Políticas de abastecimento urbano precisam avançar com urgência”, comenta.
O momento exige orçamento contínuo, mecanismos eficazes de controle social, fortalecimento dos territórios e maior abrangência das iniciativas. “Saímos do Mapa da Fome. Agora, precisamos sair do ciclo da fome”, reforça Kiko.
A professora Elisabetta também ressalta a importância da participação popular e do compromisso dos três Poderes.
“A sustentabilidade desses resultados depende de esforços conjuntos. O Legislativo precisa proteger o orçamento público para políticas sociais, enquanto o Judiciário deve garantir o cumprimento da Constituição e a defesa dos direitos sociais nela previstos.”
Segundo ela, a retirada do Brasil do Mapa decorre de uma combinação entre decisão política, ação pública articulada e mobilização da sociedade — uma fórmula conhecida e que precisa ser mantida de forma contínua.
O Sisan, desde sua criação, conta com conselhos em nível nacional, estadual e municipal. A composição, formada por dois terços da sociedade civil e um terço de representantes governamentais, permite que as políticas públicas reflitam as realidades locais.
Insegurança alimentar em números
Dados da Ação da Cidadania revelam que cerca de 6,9 milhões de brasileiros vivenciaram insegurança alimentar grave entre 2022 e 2024, ou seja, passaram fome.
Entre 2023 e 2024, a prevalência global de insegurança alimentar moderada ou grave caiu de 28,4% para 28%, afetando 2,3 bilhões de pessoas.
No Brasil, a medição é feita com base na Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (Ebia), que classifica a situação em quatro níveis: segurança alimentar, insegurança leve, moderada e grave.
O primeiro nível indica acesso regular e suficiente a alimentos de qualidade. A insegurança leve compromete a qualidade da alimentação para preservar a quantidade.
A moderada traz alterações nos padrões alimentares e redução na quantidade, especialmente entre adultos. No grau mais severo, há escassez tanto na qualidade quanto na quantidade para todos os membros da família, inclusive crianças.
Segundo os dados, as regiões Norte e Nordeste lideram os piores indicadores. No Norte, 7,7% da população enfrenta insegurança alimentar grave, enquanto no Nordeste esse percentual é de 6,2%. O Centro-Oeste aparece com 3,6%, seguido pelo Sudeste (2,9%) e pelo Sul (2%).
A região Sul apresenta o maior índice de segurança alimentar (83,4%), enquanto o Norte registra o mais baixo (60,3%).
Fome e obesidade
A escassez de alimentos não é o único desafio.
O Brasil enfrenta também um fenômeno conhecido como “dupla carga da má nutrição”, caracterizado pela redução da fome extrema, acompanhada pelo crescimento da obesidade e de doenças crônicas causadas pela má alimentação.
O relatório “Estado da Segurança Alimentar e Nutricional no Mundo” (SOFI) 2025 aponta que 28,1% dos adultos brasileiros convivem com obesidade e 10,9% das crianças com menos de cinco anos estão acima do peso.
Esse cenário está relacionado ao consumo de alimentos ultraprocessados, que são baratos e pobres em nutrientes.
Kiko Afonso atribui o problema ao acesso restrito a alimentos frescos, à publicidade agressiva e à falta de tempo para cozinhar. Para ele, educação alimentar é fundamental, mas precisa caminhar junto com políticas públicas estruturais.
“O enfrentamento deve ser sistêmico. Isso inclui regulação da indústria, rotulagem clara, restrições à publicidade infantil e uma reforma tributária que reduza impostos sobre alimentos saudáveis e aumente a taxação sobre ultraprocessados”, conclui.
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