Polícia Federal aponta que organização criminosa atuava em três núcleos dentro da Abin
Segundo a PF, grupos formados por policiais federais e outros servidores produziam informações para uso político e midiático
Brasília|Gabriela Coelho e Carlos Eduardo Bafutto, do R7, em Brasília
A Polícia Federal (PF) apontou a atuação de três núcleos de espionagem ilegal na Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Segundo a PF, os investigados criaram uma estrutura paralela dentro da agência. De acordo com a corporação, o grupo utilizou ferramentas e serviços da agência de inteligência do Estado para ações ilícitas, produzindo informações para uso político e midiático, para a obtenção de proveitos pessoais e até mesmo para interferir em investigações da PF.
Foram identificados os seguintes núcleos de atuação:
1. Cúpula: formado por delegados federais cedidos para Abin exercendo funções de direção e utilizaram o sistema First Mile "para monitoramento de alvos e autoridades públicas, bem como serviço de contrainteligência e criação de relatórios apócrifos que seriam divulgados com o fim de criar narrativas falsas". Neste grupo são apontados como integrantes pela PF: o deputado Alexandre Ramagem, que à época era diretor-geral da Abin, e o delegado da PF Carlos Afonso Gonçalves, ex-diretor do Departamento de Inteligência Estratégica.
1.2 Subordinados: policiais federais cedidos à Abin que serviam de “staff” para a alta gestão, cumprindo as determinações, monitorando alvos e produzindo relatórios. Neste núcleo foram apontados policiais federais e outros servidores públicos.
2. Evento-Portaria 157: responsáveis pelas diligências que resultaram na tentativa de vinculação de parlamentares e ministros do Supremo Tribunal Federal a organizações criminosas. Segundo a PF, foram identificadas anotações cujo conteúdo remete à tentativa de associação de deputados federais e ministros do STF, à organização criminosa conhecida como PCC (Primeiro Comando da Capital).
3. Tratamento-Log: responsável pelo tratamento dos logs disponíveis desde do início da investigação.
Buscas nesta quinta-feira
A operação da Polícia Federal desta quinta-feira fez buscas em endereços no Distrito Federal, Minas Gerais e Rio de Janeiro, entre eles o gabinete do deputado federal Alexandre Ramagem. A RECORD e o R7 procuraram a assessoria de Ramagem, que disse que não se posicionaria no momento.
A PF também suspendeu sete policiais federais do exercício das funções públicas. As ações desta quinta-feira (25) fazem parte das investigações da Operação Última Milha, deflagrada em outubro de 2023.
Os mandados de busca e apreensão são cumpridos nas seguintes cidades:
- Brasília (DF) – 18 mandados;
- Juiz de Fora (MG) – 1 mandado;
- São João Del Rei (MG) – 1 mandado;
- Rio de Janeiro (RJ) - 1 mandado.
Caso os crimes sejam comprovados, os suspeitos podem responder por invasão de dispositivo informático alheio, organização criminosa e interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei.
Operação Última Milha
Em 2023, a PF descobriu indícios do uso de mais ferramentas de espionagem ilegal por servidores da Abin — entre elas um programa de invasão de computadores que permitia acesso a todo o conteúdo privado dos alvos. Os softwares foram encontrados nos equipamentos apreendidos durante as buscas. As informações foram repassadas à RECORD por uma fonte da corporação.
A suspeita é que os investigados usavam “técnicas que só são permitidas mediante prévia autorização judicial”.
Em 20 de outubro do ano passado, a PF revelou que um sistema de geolocalização da Abin para dispositivos móveis, como celulares e tablets, teria sido usado em monitoramentos ilegais por servidores mais de 30 mil vezes em dois anos e meio. Entre os alvos da espionagem irregular estariam ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), jornalistas, políticos e adversários do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
A PF também cumpriu 25 mandados de busca e apreensão no Distrito Federal, em São Paulo, em Santa Catarina, no Paraná e em Goiás. Os agentes encontraram mais de US$ 171 mil em espécie na casa de um dos suspeitos, em Brasília. Além disso, o ministro do STF Alexandre de Moraes determinou o afastamento de outros cinco funcionários da Abin.